Mais de 24 horas depois de o democrata Joe Biden ter sido declarado vencedor das eleições americanas, e de ter sido felicitado pelos líderes de todo o mundo, Donald Trump continuava a recusar enfrentar a realidade. Viajou para o seu campo de golfe na Virgínia, e pelo meio, twittou contra tudo e contra todos, sempre a insistir em conspirações e resultados deturpados – mesmo sem quaisquer provas e depois de ser reconhecidamente unânime que a fraude eleitoral é inexistente.
Foi de tal maneira que o próprio Twitter assinalou vários dos tweets do ainda presidente em funções como potencial desinformação – tudo porque Trump apontou o alvo à comunicação social e não desarmou. “Desde quando é que são os media a anunciar quem será o próximo presidente?”, questionou, insidioso.
Mas não foi o único. Uma outra publicação do seu porta voz de campanha, Tim Murtaugh, foi igualmente assinalada pela plataforma, porque se socorreu de uma foto alterada para defender que não se pode confiar nos media – quanto mais aceitar que declarem o vencedor, tal como fizera Rudy Giuliani, o advogado de Trump, na mediática conferência de imprensa que decorreu no local errado.
Murtaugh chegou inclusive a colocar uma imagem da sede da campanha de Trump naquilo que parecia uma cópia de uma primeira página de novembro de 2000 do Washington Times (diário americano criado em 1982 pelo coreano Sun Myung Moo, o fundador da Igreja da Unificação, e subsidiado pelos fiéis daquela comunidade até 2009), em cuja manchete se lia “President Gore”. Isto sabendo-se que o democrata Al Gore perdeu para George W. Bush naquele ano – e ainda que aquela capa nunca foi para as bancas. Murtaugh chamou-lhe “lembrete de que os meios de comunicação social não escolhem o Presidente”, mas o próprio Washington Times não demorou a refutar a veracidade da imagem e a lembrar que aquela manchete nunca fora impressa.
Mais tarde, Murtaugh apagaria esse tweet – mas logo depois foi a vez de Rudy Giuliani voltar a insistir nas alegações, solicitando aos seus seguidores que o ajudassem a explicar “as irregularidades da votação na Pensilvânia”, o estado que deu a vitória ao candidato democrata. “Enviem-me as vossas apostas, que eu provarei tudo em tribunal”, twittou, mas a plataforma foi igualmente rápida a assinalar a publicação como duvidosa.
Várias fontes – que pediram anonimato – adiantaram aos diários americanos que tanto Giuliani como os filhos de Trump não baixaram a guarda e têm insistido com ele na tese da fraude. Com isso também em vista, vários dos seus assistentes reuniram na sede, em Arlington, Virgínia, para discutir opções. O genro de Trump, Jared Kushner, que tem sido uma presença constante na sede nos últimos dias, encorajou-o mesmo a procurar todas as vias de recurso legais de que dispõe para contestar os resultados – questionando como é que desta vez ninguém suspeita de interferências do exterior.
Já outros conselheiros, como Ronna McDaniel, que lidera o Comité Nacional Republicano, estão a lutar em nome de Trump publicamente – mas em privado há muito que reconhecem que a batalha não pode continuar por muito mais tempo.
Trump terá já dito a outros do seu círculo próximo que nunca admitirá que perdeu a corrida – aliás, no seu Twitter também escreveu: “I won the elections by a lot”, ou “eu ganhei as eleições e por muitos votos”.
Já Chris Ruddy, um amigo de longa data de Trump e chefe da Newsmax Media, concedeu que o ainda presidente deveria aguentar a pressão até os resultados serem certificados. Mas tudo se complicou, entretanto. É que, enquanto a maioria dos republicanos continua em silênciosobre os resultados eleitorais, há quem comece a reconhecer, alto e bom som, a vitória de Biden. É o caso de Francis Rooney, membro da câmara dos representantes: “Parabéns por uma campanha bem-sucedida”. Uma declaração revista e aumentada pouco depois no comunicado de George W. Bush, o único ex presidente do Partido Republicano que ainda está vivo. “Apesar de termos diferenças políticas, sei que Joe Biden é um homem bom que ganhou sua oportunidade de liderar e unificar nosso país”.