Esta seria, possivelmente, a mais importante peça em falta, num puzzle que começa a compor-se e a ajudar a que o caminho de Kamala Harris fique um nadinha menos sinuoso na corrida à Casa Branca. Barack Obama anunciou esta sexta-feira que apoia a candidatura presidencial da atual vice-presidente de Joe Biden, num movimento que era esperado desde que o domingo passado.
Obama tem-se mantido um líder imparcial durante as primárias democratas, mas todos os olhos estavam postos em si desde que Biden decidiu abandonar a tentativa de recandidatura. Numa América profundamente dividida, as figuras mais proeminents da Democracia não têm podido, porém, manter a sua imparcialidade durante muito tempo, sob pena de verem os Republicanos ganhar um terreno que, segundo as últimas sondagens, têm perdido. A desistência de Joe Biden trouxe alguma confusão às contas do partido de Donald Trump, que tinha toda a campanha preparada para atacar o atual presidente. Com Kamala Harris a ser a provável candidata democrata, o jogo muda significativamente, e a desorientação dos Republicanos já se fez sentir.
Durante uma das suas últimas interevenções, Donald Trump subiu o tom dos ataques, afirmando que Kamala é uma perigosa radical de esquerda enquanto o candidato à vice-presidência republicana, J.D. Vance, se atirou inexplicavelmente ao facto de Harris não ter filhos biológicos, o que seria um sinal de falta de preparação para liderar o país.
O apoio do casal Obama – tanto Barack como Michelle, que sempre foi apontada pela sociedade civil como uma das preferidas para concorrer à Casa Branca – é particularmente significativo para uma candidata que é uma epíteto da diversidade que muitos querem ver no futuro dos EUA: Kamala seria a primeira mulher a assumir presidência, sendo que seria também a primeira americana com ascendência africana e asiática a ocupar o mais alto cargo do País.
Esta semana, o reverendo Al Sharpton, um importante defensor dos direitos civis, escrevia no The New York Times que Kamala pode ter na sociedade americana o mesmo impacto que Obama teve durante a sua campanha: chamar a si os eleitores que estão feridos pelos anos de presidência de Trump – como Obama fez após a era George W. Bush – unindo-os em torno de um objetivo comum: recuperar a energia do país, garantindo que as mulheres não vêm os seus direitos ainda mais erodidos e que o trabalho que Joe Biden começou não é atirado para o lixo.
Mas para que tudo isto seja possível, têm lembrado os media e especialistas norte-americanos, é preciso que o partido Democrata apareça coeso e comprometido com o apoio a um candidato apenas, e que o ajude a garantir uma vitória sobre Donald Trump. O apoio de Barack Obama pode ser o incentivo que faltava a alguns dos democratas que se têm mostrado reticentes em apoiar Kamala.
Esta semana parece ter sarado algumas feridas dentro do partido, muito graças à sabedoria do presidente Biden no processo de afastamento: todas as suas declarações públicas foram de apelo à união, de elevação do cargo que ocupa e de lembrete de que interesse pessoal algum pode sobrepor-se ao interesse do país que lidera. Foi uma espécie de arranque de campanha para a sua vice-presidente, Kamala, que muitos dizem não ter a garra ou o carisma suficiente, mas que entre os eleitores mais jovens, as minorias étnicas e as mulheres está a garantir um apoio cada vez mais significativo.
Ainda há muita estrada para andar até à convenção Democrata de agosto onde será oficialmente escolhido o candidato do partido à Casa Branca. Mas, para já, os apoios conseguidos por Kamala parecen ser um bom prenúncio de que Trump não terá a vida tão facilitada quanto parecia há duas semanas.