Uma das regras sagradas na diplomacia é a reciprocidade. Não por uma simples questão de protocolo e pelos salamaleques da praxe, mas porque os rituais, em política externa, traduzem equilíbrios e relações de força. Ora, a 29 de março, o Presidente da Rússia, Vladimir Putin, aceitou receber no Kremlin, para um frente a frente na famosa mesa de oito metros, pela qual já passaram Emmanuel Macron e outros Chefes de Estado, uma personalidade pouco consentânea com o seu estatuto.
Para se perceber o quanto a situação era anómala e nada usual, o encontro durou aproximadamente uma hora. O privilegiado a quem coube a sorte e o mérito de falar com o governante, que mandou invadir a Ucrânia a 24 de fevereiro de 2022, é o brasileiro Celso Amorim. Ex-ministro da Defesa e dos Negócios Estrangeiros, ex-embaixador no Reino Unido e nas Nações Unidas, ex-cineasta e académico, Amorim é um género de alter-ego diplomático de Luís Inácio da Lula e ocupa, há três meses e meio, o cargo de assessor principal da Presidência do Brasil.
Quinteto da nova ordem
Os dirigentes dos BRICS, os cinco países que já formam uma parceria contra a hegemonia do Ocidente
Lula da Silva
Presidente do Brasil
Após presidir ao maior país da América do Sul, entre 2003 e 2010, o antigo sindicalista iniciou, em janeiro, um terceiro mandato, com o propósito de anular o legado do antecessor Jair Bolsonaro, o “Trump dos Trópicos”. Lula quer que o Brasil volte a uma postura multilateral e de neutralidade.
Narendra Modi
Primeiro-ministro da Índia
Já pode gabar-se de liderar o país com maior número de habitantes do planeta (1 400 milhões) e a maior democracia do mundo. Só que Narendra Modi, primeiro-ministro desde 2014, é o responsável pela deriva autoritária de um gigante, cuja economia cresce acima de 6% e que o Ocidente quer seduzir para contrabalançar a emergência global da China.
Xi Jinping
Presidente da R. Popular da China
No poder há uma década, enterrou a velha máxima atribuída a Deng Xiaoping, o líder comunista que abriu a China ao exterior: “Esconde as tuas capacidades, espera pelo teu tempo.” Recém-reeleito para um terceiro mandato, Xi quer acabar com a pax norte-americana, posicionar o seu país no centro do mundo e impor uma nova ordem global.
Vladimir Putin
Presidente da Federação Russa
Governa a Rússia há quase um quarto de século e a sua ambição, a par do revisionismo histórico, fê-lo acreditar que o seu país poderia ainda expandir-se de forma imperial. A invasão da Ucrânia converteu-se num desafio existencial para o Kremlin, e Putin está cada vez mais à mercê do amigo Xi Jinping.
Cyril Ramaphosa
Presidente da África do Sul
O país do arco-íris, que teve em Nelson Mandela um Presidente exemplar (1994-1999), enfrenta agora múltiplos desafios. A sua economia já é a terceira do continente (depois de Nigéria e Egito), e Ramaphosa fala em neutralidade, embora se aproxime de Moscovo e aceite o “reajustamento” da ordem mundial.