Um comboio da empresa Norfolk Southern, que transportava compostos químicos perigosos, descarrilou na pequena cidade de East Palestine, no estado americano do Ohio, perto da fronteira com a Pensilvânia, no dia 3 de fevereiro. A vila foi temporariamente evacuada entre 6 e 8 de fevereiro e, durante este período, a empresa ferroviária procedeu a uma “explosão controlada” de materiais tóxicos como o acrilato de burilo e cloreto de vinilo, frequentemente utilizados na produção de tintas, adesivos, PVC e corantes, e que quando inalados ou em contacto com a pele provocam queimaduras, falta de ar e tosse.
Só que depois de voltarem às suas casas, os moradores de East Palestine queixam-se de erupções cutâneas, dores e inflamação da garganta, náuseas, dores de cabeça e hemorragias nasais.
“O cheiro a químicos era tão forte que me dava náuseas”, conta Amanda Greathouse à CNN. “Eu só queria pegar rapidamente no que precisava e partir. Só levei algumas peças de roupa porque até a roupa cheirava a químicos e tenho medo de as vestir aos meus filhos”.
“Antes de as minhas filhas voltarem a casa, lavei um monte de roupa, limpei superfícies e arejei a casa”, relata Ayla Antoniazzi também à CNN, “Mas, no dia seguinte, a mais velha tinha uma erupção cutânea na face. A mais nova queixava-se de que lhe doía o olho e estava muito letárgica, por isso levei-as de volta para a casa dos meus pais”.
Os habitantes preocupam-se também com a contaminação da água e do solo. Segundo o departamento de recursos naturais do Ohio, a libertação destes químicos tóxicos levou à morte de milhares de peixes. “Temos medo de tomar banho”, conta Doug Brayshaw à NBC, “Nem sequer vou dar água do meu poço ao meu cão porque estou muito preocupado”.
Depois do incidente, que provocou uma grande nuvem de fumo e da libertação controlada dos químicos contidos nos vagões, funcionários federais e locais garantiram à população que o ar e a água não estavam contaminados. No dia 21 de fevereiro, a Agência Americana do Ambiente afirmou ter realizado a monitorização do ar em mais de 550 casas, não sendo detetados valores de cloreto de vinilo acima dos níveis de preocupação. Os habitantes de East Palestine sentem que as suas apreensões não são ouvidas. Há uma dissonância entre as garantias de segurança dadas pelas autoridades e as lesões verificadas nas pessoas.
A Norfolk Southern tem sido criticada por evitar conferências de imprensa e pela demora em assumir responsabilidades pelo acidente. “Já não me sinto seguro nesta cidade, vocês arruinaram-na!”, lamenta Jim Stewart no programa CNN Town Hall, que reuniu moradores de East Palestine e o CEO da empresa, Alan Shaw.
O Governador da Pensilvânia, Josh Shapiro, acusou a empresa de “arrogância e incompetência”, enquanto o Secretário dos Transportes, Pete Buttigieg, relembrou o lobby feito pela Norfolk Southern junto dos reguladores contra medidas destinadas a melhorar a segurança ferroviária. Já os sindicatos dos trabalhadores salientaram a estratégia de redução de custos da empresa centrada na diminuição da mão-de-obra, na circulação de comboios mais longos e no encerramento de estaleiros ferroviários.
O descarrilamento parece ter sido provocado pelo sobreaquecimento de uma roda na 23ª carruagem, de acordo com o relatório do Conselho Nacional de Segurança dos Transportes (NTSB) publicado a 23 de fevereiro. A Norfolk Southern equipou a linha ferroviária com detetores de calor, que são concebidos para avisar a tripulação de um possível aumento de temperatura. O comboio passou por três destes sensores e só depois de ultrapassar o terceiro é que o sistema alertou para um pico de temperatura de 75ºC. A tripulação tentava abrandar o comboio quando este descarrilou. “Posso dizer-vos que isto era 100 por cento evitável. Chamamos a estes acontecimentos ‘acidentes’. Não há acidentes. Todos os eventos que investigamos são evitáveis”, declarou Jennifer Homendy, presidente da NTSB, durante uma conferência de imprensa na quinta-feira.