A Polónia, a Letónia e a Lituânia têm visto aumentar o número de migrantes a chegar às suas fronteiras a partir da Bielorrússia. A maioria vem do Médio Oriente e da Ásia, à procura de uma entrada na união Europeia.
Impedidos de entrar na Polónia, mas sem poderem regressar à Bielorrússia, os migrantes acabam acampados nas zonas adjacentes à froteira, uma faixa sob forte controlo policial e militar em que não existem quaisquer condições sanitárias. A nível diplomático, a questão agrava-se com Minsk e Varsóvia a trocarem acusações.
Margaritis Schinas, vice-Presidente da Comissão Europeia, classifica as ações da Bielorrússia como “inaceitáveis”, e acusa o país de “utilizar o o sofrimento humano como uma arma” para atacar a União Europeia (UE). Tal como já fizera a presidente da Comissão, Ursula von der Leyen, fala num “ataque híbrido” e diz que a situação não é a de um movimento de refugiados normal: estas pessoas estão a ser “empurradas para a fronteira” e “instrumentalizadas” pelo regime de Alexander Lukashenko, presidente bielorrusso. O Executivo comunitário já anunciou a intenção de aprovar mais um pacote de sanções contra o governo de Minsk – o quinto desde que o homem conhecido como “último ditador da Europa” se fez reeleger nas eleições de 2020, cujo resultado não é reconhecido pela UE nem pelos EUA. Em princípio, os ministros dos Negócios Estrangeiros dos 27 vão na próxima segunda-feira, 15, encarregar-se do assunto.
“A segurança da nossa fronteira oriental está a ser brutalmente violada por um tirano implacável que quer vingar-se da Polónia e da Europa por se opor às violações dos direitos humanos na Bielorrússia. Mas nós sabemos que a sua vingança é controlada a partir de Moscovo”, alega, por seu lado, o primeiro-ministro polaco, Mateusz Morawiecki.
Vários estados-membros da UE têm acusado a Bielorrússia de encorajar os migrantes, que vêm do Médio Oriente, África ou Ásia, a entrar ilegalmente no espaço comunitário devido às sanções aprovadas nos últimos anos pelos atropelos aos direitos humanos no país. A Comissão Europeia, inclusive, caracteriza-o como “um regime de gangsters”, considerando que o país de atrair os migrantes com “falsas promessas de uma entrada fácil na União Europeia”.
Apesar de o seu regime estar a ser alvo de inúmeras críticas internacionais, Lukashenko nega as acusações, e defende-se, culpando a Europa e os Estados Unidos da América pela situação dos migrantes na fronteira, graças ao apoio político que recebe da Rússia.
Muitos dos migrantes que se encontram agora na fronteira são atraídos para a Bielorrússia por agências de viagens bielorrussas, controladas pelo governo autoritário de Lukashenko, que organizam viagens do Médio Oriente para Minsk, prometendo passagem para a UE. Amila Abedelkader, uma migrante iraquiana contou ao jornal britânico The Guardian que o seu grupo – onde se incluíam os seus dois filhos, um menino de dois anos e uma bebé de oito meses – embarcou em voos organizados por uma agência de viagens bielorrussa que os transportaram de Istambul, na Turquia, para Minsk, prometendo acesso à fronteira com a Polónia.
Ao chegarem à Bielorrússia, os migrantes têm de pagar entre quinze a vinte mil euros, são instalados em hotéis geridos pelo governo e daí transportados em autocarros especiais para a fronteira com a Polónia ou Lituânia.
Nenhum dos países se quer responsabilizar pelos migrantes
No meio da confusão diplomática, os migrantes são deixados numa situação verdadeiramente dramática. A Polónia resiste a conceder-lhes o estatuto de asilo, negando as acusações de várias ONG’s de que está a violar o direito internacional e garantindo que está a agir de acordo com a lei. Por outro lado, os oficiais bielorrussos estão a impedi-los de regressar a Minsk, a capital do país, acabando os migrantes por ficar “presos” entre os dois países.
A viverem em acampamentos improvisados na floresta, não há acesso a comida, água ou cuidados de saúde, e as temperaturas frequentemente descem abaixo dos zero graus. Entre os migrantes encontram-se centenas de mulheres grávidas, idosos e crianças.
Para Youssef Atallah, um migrande sírio, esta é a terceira vez que tenta passar a fronteira entre a Bielorrússia e a Polónia. Já na Polónia, num centro de refugiados em Białystok, recorda como a viagem foi difícil: ao chegar à fronteira, os guardas bielorrussos espancaram-no, e aos outros três membros do seu grupo. Atallah sofreu lesões faciais, ficou com o nariz partido e costelas fraturadas.
Descreve ainda como os guardas bielorrussos recusaram fornecer-lhe cuidados médicos, e praticamente ‘empurraram-nos’ para a fronteira, não lhes permitindo regressar a Minsk. “Dissemos aos guardas que queríamos voltar para Minsk, que não queríamos continuar a viagem”, relembra. “Eles disseram-nos que não podíamos regressar a Minsk. Tínhamos de ir para a Polónia”. Até lá chegar, o grupo não tinha acesso a comida e tiveram de beber água de pântanos.
A sua situação só melhorou quando chegou ao centro de refugiados de Białystok. “Na verdade, eles [os guardas do centro de refugiados] são muito amáveis connosco. Levaram-me para o hospital e a equipa do hospital foi maravilhosa. Os médicos até me deram roupa”, contou à CNN.
Thaer Rezk, oriundo da Síria, conta que por vezes os guardas bielorrussos abriam buracos na vedação que separa os dois países, para que os migrantes pudessem atravessar a fronteira. Apesar da viagem difícil, Rezk mostra-se otimista quanto ao seu futuro: “Agora sinto-me mais seguro. Estou certo de que construirei aqui uma boa carreira e o meu filho terá uma boa educação – o seu futuro será seguro”, afirma.
Inúmeros grupos de ativistas e organizações não governamentais têm criticado o conflito, chamando a atenção para as condições indignas que os migrantes são obrigados a suportar. Anita Bay, diretora da Save the Children Europe afirmou, em declarações à CNN, que a situação na fronteira vai “contra as leis e valores da União Europeia”, acrescentando que é “inaceitável que as vidas das crianças e das suas famílias estejam a ser usadas como moeda de troca num conflito regional”.
Nos últimos dias, o cenário tem-se tornado particularmente grave, com grupos cada vez maiores de migrantes – que a Comissão Europeia estima terem chegado aos dois mil – a tentarem ultrapassar a fronteira à força. Desde maio, quando Aleksander Lukashenko anunciou que iria deixar passar toda a gente que chegasse ao seu país rumo à UE, estima-se que mais de 30 mil pessoas tenham cruzado as fronteiras com os estados vizinhos que fazem parte da UE. A maioria fê-lo através da Polónia, mas a Letónia e a Lituânia também receberam pequenos contingentes.