A rainha de Inglaterra não chora em público. Isabel II foi educada nesse sentido e tem sabido manter-se quase sempre fiel ao desafio, mesmo em momentos emocionalmente mais delicados. A caminho dos 70 anos de reinado, foram muito poucas as vezes em que não conseguiu conter os sentimentos de tristeza e angústia, o que torna essas raras ocasiões em momentos dignos de nota. Ontem, na despedida do príncipe Filipe, o homem com quem casou aos 21 anos e partilhou a vida durante 73, os fotojornalistas e os operadores de câmara respeitaram o seu luto, evitando os grandes planos, mas, naturalmente, admite-se que a rainha tenha voltado a chorar, face ao contexto de uma perda tão grande. Alguns jornais garantem que ela não resistiu às lágrimas enquanto seguia, de carro, no cortejo fúnebre, atrás do Land Rover que transportava o corpo de Filipe, falecido no passado dia 9, aos 99 anos; outros escrevem que já no interior da capela de São Jorge, durante a missa de homenagem, as emoções voltaram a tomar conta da rainha. No entanto, não foram registadas imagens desses momentos íntimos.
Sempre de máscara na cara, Isabel II permaneceu afastada dos restantes membros da família real, devido às restrições impostas pela pandemia, durante toda a cerimónia, realizada na presença de apenas 30 convidados, pelos mesmos motivos. Apesar da carga emocional associada à perda do seu companheiro de vida, a rainha terá feito um esforço para manter a compostura, sabendo que os olhares iriam estar concentrados em si, como sempre. Sucessora do seu pai, Jorge VI, no trono do Reino Unido (e de outros estados independentes como o Canadá, a Austrália ou a África do Sul), ela foi desde cedo preparada para controlar as emoções em público.
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“Ela é uma mulher de sentimentos profundos, mas esforça-se muito para apresentar uma expressão impassiva”, afirma Sally Bedell Smith, historiadora norte-americana e biógrafa de Isabel II. “Em parte é devido às funções que desempenha e, por outro lado, deve-se ao seu temperamento e à forma como foi criada”, acrescenta, em declarações ao diário USA Today. Enquanto rainha, qualquer que seja o comportamento de Isabel II face a determinado acontecimento, há sempre os dois lados da moeda, o dos que aplaudem e o dos que contestam. Não se comprometer com nenhum é uma regra de ouro que se autoimpõe. “Se ela começa a expressar reações, quaisquer que sejam, serão vistas como uma preferência por um grupo em detrimento do outro”, argumenta Sally Bedell Smith, ao justificar o motivo pelo qual Isabel II não costuma bater palmas em público.
É o mesmo princípio que a leva a evitar comover-se perante olhares indiscretos. “A rainha é uma pessoa incrivelmente estoica”, salientou há dias o seu filho André, após a morte do pai. A ideia de que ela não cai, por maior que seja a adversidade, é outra mensagem-chave por detrás da pose de estado que Isabel II tenta preservar a todo o custo.
Nem sempre seguiu à letra esse desígnio, porém. Em 1997, naquele que será talvez o seu momento de comoção pública mais mediático, a rainha de Inglaterra foi fotografada com lágrimas no rosto, por ocasião da despedida de um navio que transportou com frequência a família real e que ela própria havia inaugurado no início do seu reinado, em 1953, o ano a seguir à morte do seu pai. Isabel II também já foi vista a chorar em pelo menos três homenagens a soldados mortos ao serviço da coroa, em 2002, 2016 e 2019; e, no mais longuínquo ano de 1966, terá igualmente deixado escapar as lágrimas numa visita a Aberfan, no País de Gales, após uma derrocada de resíduos de uma mina ter provocado a morte de 144 pessoas, a grande maioria crianças.