São 190 os prelados reunidos no Vaticano para, numa atitude inédita da Igreja Católica, discutir os casos de abusos sexuais de menores que durante os últimos anos têm vindo a ser provados e divulgados em todo o mundo.
No início dos trabalhos, esta quinta-feira, 21, e até domingo, os representantes dos vários Países são instados a ouvir algumas vítimas e a apresentar sugestões para que os abusos sexuais de menores deixem de ser uma realidade dentro da Igreja Católica.
“O santo povo de Deus olha para nós e espera de nós não apenas condenações simples e óbvias, mas medidas concretas e eficazes a aplicar. É preciso ser concreto”, referiu Francisco no início do encontro, e citado pela agência Ecclesia.
“Diante da chaga dos abusos sexuais perpetrados por clérigos contra menores”, o Sumo Pontífice afirmou ser tempo de ouvir bispos, arcebispos cardeais, responsáveis de instituições religiosas entre outros, de forma a conseguir-se traçar um caminho diferente daquele que tem sido seguido até agora.
“Que todos, juntos, nos coloquemos à escuta do Espírito Santo e, com docilidade à sua orientação, escutemos o grito dos pequeninos que pedem justiça”, pediu. “Recai sobre o nosso encontro o peso da responsabilidade pastoral e eclesial que nos obriga a discutir juntos, de maneira sinodal, sincera e profunda, sobre como lidar com este mal que aflige a Igreja e a humanidade”.
Segundo informações da mesma agência noticiosa, todos os participantes receberam indicações sobre algumas linhas de ação que foram entretanto desenvolvidas por Comissões e Conferências Episcopais. No entanto, Francisco pediu que estas recomendações servissem apenas de ponto de partida, e pediu que todos dessem contribuições que possam realmente fazer a diferença.
Na preparação para este encontro, um dos mais aguardados do ano, foi também pedido a cada bispo que ouvisse, no seu próprio País e nas suas comunidades, as vítimas que pudessem existir.
Este dia 21 vai ficar também marcado pela apresentação do livro ‘No Armário do Vaticano’, cujos primeiros capítulos a VISÃO pré-publicou recentemente e que, segundo o autor, estabelece uma relação de causalidade entre a cultura de segredo que se vive na Igreja e o facto de ser dentro dela que vive a “maior comunidade de homossexuais” do mundo. O autor, Frédéric Martel, decidiu fazer a apresentação pública da obra precisamente no Vaticano.
O Cardeal Patriarca de Lisboa e presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, D. Manuel Clemente, está no Vaticano a representar a Igreja Católica portuguesa.
“Em muito boa hora o Papa Francisco quis alargar à Igreja mundial, de uma maneira mais intensa com esta convocação, a sua preocupação e o seu empenho em ultrapassar e resolver um problema que é grave e precisa de ser resolvido”, referiu D. Manuel Clemente em entrevista à agência Ecclesia na véspera do encontro e mostrando-se disponível para fazer o que for necessário. “Se formos parte do problema, agora temos de ser parte da solução”.
Recorde-se que em Portugal foram, desde 2001, denunciados 11 casos de abusos sexuais de menores, sendo que desses, apenas três terão seguido para o Ministério Público, confirmou ainda esta quinta-feira o porta-voz da Conferência Episcopal Portuguesa, padre Manuel Barbosa, em declarações à Antena 1.
Note-se ainda que desta reunião não vai sair nenhum documento final. “O objetivo desta reunião será identificar as propostas apresentadas durante a reunião e as tarefas que devem ser realizadas, para que estas propostas possam ser colocadas em prática sem demora”, pode ler-se num documento libertado entretanto pelo Vaticano. Ao Papa Francisco caberá, assim, apresentar uma conclusão dos trabalhos, após a missa de domingo de manhã, num discurso que será transmitido online para todo o mundo.
No final do mês passado Francisco salientava que a prioridade deste encontro era a tomada de consciência, por parte dos prelados, do “sofrimento terrível” que tem sido causado ao longo dos anos, admitindo que alguns “bispos não sabiam o que fazer”.