Há mais de 5 milhões de pessoas que não foram imunizadas nas 54 cidades do estado brasileiro de São Paulo abrangidas pela campanha contra a febre amarela e as vacinas continuam armazenadas nos centros de saúde. Não que já não haja vítimas mortais – chegaram a 93 na última sexta-feira, mas nem o prolongamento da campanha de vacinação até 2 de março está a revelar-se suficiente para convencer a população.
As autoridades já perceberam que vão ter de encontrar um “plano B”: “Vamos ter de traçar uma segunda estratégia para atingir a meta dessa imunização preventiva”, admitiu aos jornalistas Regiane de Paula, diretora do Centro de Vigilância Epidemiológica da Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo.
Esta inversão da corrida à vacina dá-se numa altura em que se multiplicam nas redes sociais os posts a manifestar preocupação com os efeitos secundários ou a acusar mesmo a vacina das mais variadas complicações, desde abortos, no caso das grávidas, a cancro.
E de nada têm valido as garantias repetidas sucessivamente por Helena Sato, diretora de Imunização da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo: “Não precisamos ter medo dessa vacina, ela é excelente.”
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a vacina contra a febre amarela tem uma eficácia superior a 95% e mesmo esta versão, que é fracionada, confere proteção durante um mínimo de oito anos.
A alimentar os rumores sobre os efeitos secundários graves estão as três mortes confirmadas, de 15 suspeitas, no estado de São Paulo, atribuíveis a uma reação à vacina. As vítimas tinham menos de 60 anos e não tinham registo de doenças prévias. Mas para alimentar o medo, as suposições bastam.
Alarme e muitas dúvidas
O Manual brasileiro de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinação alerta que não devem ser vacinadas pessoas com história de reação anafilática a qualquer uma das substâncias que compõem a vacina, bebés com menos de seis meses, imunodeprimidos (doentes transplantados ou a fazer quimioterapia, por exemplo) ou que tenham mais de 60 anos e nunca tenham levado a vacina.
O mesmo documento aponta como efeitos secundários possíveis e graves encefalite, meningite e doenças autoimunes com envolvimento do sistema nervoso central e periférico, que podem levar à morte. Segundo Regiane de Paula, é o caso de um em cada 500 mil imunizações.
“O governo quer acabar com o povo”, “A vacina é uma fraude”, “Nunca confiei nessas vacinas, vejam o caso do ébola, tudo criado”. Comentários como este abundam no Facebook da irmã de uma adolescente de 15 anos que morreu cerca de duas semanas depois de levar a vacina e de um agravamento progressivo do seu estado de saúde, que começou com enjoos e dores abdominais e evoluiu para febre alta e dores de cabeça fortes, a que seguiu um edema que começou nos olhos e se alastrou, acompanhado de dores generalizadas e, mais tarde, dificuldade em respirar e três paragens cardíacas que se revelariam fatais. A certidão de óbito diz que a jovem morreu devido a uma pneumonia, mas não convence a família nem os seguidores da irmã no Facebook.
Outro caso, conta a BBC, envolve a morte de um menino de três anos, cinco dias depois de receber a vacina. O hospital onde foi visto começou por diagnosticar uma nasofaringite aguda, mas dois dias depois a criança sofreu convulsões e acabaria por morrer com uma paragem cardio-respiratória. Mais uma vez, o Facebook foi o palco da indignação generalizada contra a imunização: “A vacina está matando mais que a tal febre”, escreve um utilizador. “Isso tem nome e chama-se homicídio culposo”, atira outro.