Passou apenas uma semana desde que tomou posse, mas Donald Trump já conseguiu assinar vários decretos polémicos, ter uma série de chefes de Estado do mundo inteiro a criticar as suas decisões e a lembrar-lhe os valores de convenções internacionais e colocar as multinacionais com trabalhadores estrangeiros no país à beira de um ataque de nervos. A sociedade civil tem-se multiplicado em protestos na rua contra as restrições à imigração ou pelos direitos das mulheres.
Uma pequena amostra daquilo que promete ser uma administração norte-americana pouco preocupada com o que dela pensam. Devidamente registado nas redes sociais, o novo Presidente dos EUA tem orgulhosamente partilhado com o mundo a imagem da sua assinatura em dezenas decretos. O primeiro colocou fim ao Obamacare, o programa de seguros de saúde do antigo presidente. Mas o que mais tem preocupado a comunidade internacional é mesmo aquele que coloca restrições – muito próximas da proibição total – à entrada de cidadãos vindos de sete países de maioria muçulmana (Irão, Síria, Somália, Sudão, Líbia, Iémne e Iraque).
Angela Merkel, a poderosa chanceler alemã, já manifestou a sua preocupação diretamente ao presidente dos EUA,num telefonema feito no sábado. Segundo o seu porta-voz, Merkel lembrou a Trump que a convenção de Genebra exige aos estados que recebam refugiados de guerra com base em fundamentos humanitários e que a lutra contra o terrorismo não justifica colocar sob suspeita todas as pessoas de determinada origem ou fé.
Também o vizinho canadiano, Justin Trudeau, retaliou decidindo “abrir as portas” do Canadá aos que fogem de perseguição ou guerra.
Um coro de vozes que se junta às dos países diretamente abrangidos pela medida. Depois do Irão ter decidido proibir a entrada no seu território de cidadãos dos EUA, também o parlamento iraquiano aprovou uma proposta no mesmo sentido, falando em “reciprocidade”.
No terreno, os protestos multiplicaram-se durante o fim de semana. Várias manifestações foram convocadas para os aeroportos e uma decisão de uma juíza federal de Nova Iorque – que suspendeu partes do decreto antes da sua entrada em vigor – lançou o caos nos terminais dentro e fora dos EUA.
Sean Spicer, porta-voz de Trump, confirmava no sábado que dos 325 mil estrangeiros que chegaram aos Estados Unidos nesse dia, 109 mil passaram por um controlo reforçado, por forma a “garantir que as pessoas que deixamos entrar no nosso país vêm com intenções pacíficas”.
“Não queremos deixar que se infiltre alguém que procure prejudicar-nos. É tudo. Sei que em alguns casos isto vai causar inconvenientes”, admitiu Spicer numa declaração ao canal ABC.
Esta segunda-feira, o próprio Donald Trump reagiu… no Twitter, como tem sido hábito. Desta vez, o alvo foram os democratas, a quem lembrou que não se indignaram “quando os empregos estavam a fugir do país”.
Governo português fala em proposta “inconcebível”
Por cá, o Governo português também reagiu com “muita preocupação”. Num país onde a comunidade portuguesa já ultrapassa um milhão de pessoas, o ministro dos Negócios Estrangeiros Augusto Santos Silva considerou “inconcebível que se negue o direito de entrada a pessoas que têm residência no país”, lembrando que “em termos europeus”, isso é “absolutamente ilegal”.
“Não podemos usar critérios do tipo ‘todos os cidadãos do país X ou Y’ estão impedidos de entrarem no prazo de tantas semanas. Isso não é possível.”, considerou o ministro à Lusa.
Quanto à comunidade portuguesa e lusodescendente nos EUA, Santos Silva garantiu que não tem “qualquer sinal de que os portugueses tenham algum motivo de preocupação”, e aproveitou para dizer que as autoridades portuguesas prestarão apoio a cidadãos com dupla nacionalidade que sejam impedidos de entrar nos EUA.
Além desta medida, Trump também já assinou a retirada dos EUA do Tratado TransPacífico, proibiu o financiamento público a organizações pró-aborto e autorizou a construção de um muro entre EUA e México. O cancelamento de fundos para as cidades-santuário (que não cooperam para a deportação de ilegais) teve a rúbrica do presidente norte-americano.
Sem decreto assinado, o gabinete de Trump não deixou de aconselhar os jornalistas “a manter a boca calada e ouvir”, considerando estes profissionais como “a oposição”.