Em Novembro de 2012, Salvador Alvarenga foi pescar, acompanhado apenas por um jovem pescador, ao largo da costa mexicana. Dois dias mais tarde, apanhados por uma enorme tempestade, pediu socorro, mas acabaria por ser resgatado apenas 14 meses depois.
Quando foi encontrado, tinha o cabelo e barba emaranhados, os tornozelos inchados, os pulsos finíssimos e mal conseguia andar. Recusava contacto visual e escondia a cara com frequência.
Alvarenga, pescador de 36 anos, de El Salvador, abandonou a costa do México num pequeno barco com o inexperiente Ezequiel Córdoba. O barco estava carregado com equipamento, incluindo 265 litros de gasolina, 61 litros de água, 23 kg de sardinhas para isco, 700 anzois, quilómetros de linha, um arpão, três facas, um telemóvel, um aparelho GPS (não resistente à agua), um rádio de duas vias (bateria carregada a metade), várias chaves de fendas e 91 kg de gelo.
Quando a tempestade começou, Córdoba não conseguiu manter-se calmo, mas Alvarenga, capitão veterano, sabia que tinha que manter a compostura pelos dois, escreve Jonathan Franklin, autor do livro “438 Dias”, de que o britânico The Guardian publica um extrato.
Quando o mar acalmou, os dois homens estavam a aproximadamente duas horas da costa. Alvarenga pegou no rádio e ligou ao seu chefe “Willy! Willy! Willy! O motor está avariado!”, Willy pediu-lhe as coordenadas, mas o GPS não estava a funcionar. Pediu-lhes então que ancorassem, mas eles não tinham âncora. Willy disse que os ia buscar e, logo em seguida, o rádio ficou sem bateria.
Alvarenga e Córdoba esperaram pelo resgate, entre as imprevisíveis ondas e apenas com as estrelas como guia. Com todos os meios para pescar perdidos na tempestade, Alvarenga inventou uma forma alternativa de apanhar peixe: ajoelhava-se à beira do barco e punha as mãos na água até ao nível dos ombros. Quando um peixe passava, agarrava-o com as mãos cravando as unhas nas suas duras escamas. Com uma faca, Córdoba limpava e cortava o peixe e depois deixava-o a secar ao sol. Em dias de sorte, conseguiam apanhar tartarugas e peixes saltavam para o barco.
Dentro de poucos dias, Alvarenga começou a beber a sua própria urina, encorajando o jovem a fazer o mesmo. “Tinha tanta fome que comecei a comer as minhas próprias unhas, engolindo todos os pequenos bocados,” contou Alvarenga.Chegou a apanhar medusas e a engoli-las inteiras – “Queimava um pouco na parte de cima da garganta, mas não era assim tão mau.”
Finalmente, começou a chover e os dois beberam desesperadamente a água da chuva que lhes caia em cima. Os dias passavam e os dois perceberam que muitas coisas que flutuavam no mar eram aproveitáveis. Um dia, um saco do lixo à deriva forneceu-lhes um pouco de leite, cenouras, uma pastilha elástica e uma cabeça de repolho.
Dois meses no mar e Alvarenga habitou-se a capturar e comer pássaros e tartarugas, enquanto Córdoba começou em declínio físico e mental. Ficou mal disposto depois de comer aves marinhas cruas e começou a rejeitar toda a comida. Perdeu a energia e a motivação para comer, Alvarenga tentava que ele comesse, mas este tinha entrado em depressão e o seu corpo estava a deixar de responder.
“Estou a morrer, estou a morrer, estou quase a ir,” disse Córdoba numa manhã. “Não penses nisso. Vamos fazer uma sesta,” respondeu Alvarenga e deitou-se ao seu lado. Córdoba morreu pouco depois. Para lidar com a perda da sua companhia, Alvarenga fingiu que ele não tinha morrido e falava com o corpo como se ainda estivesse vivo, fazendo-lhe perguntas e respondendo.
Alvarenga fez uso da sua imaginação para se manter são, imaginando que não estava ali, que fazia caminhadas matinais e vivia uma vida normal outra vez. Quando era mais novo, o seu avó ensinou-o a controlar o tempo usando ciclos lunares. Ele sabia que estava no mar há meses, pois sabia que já tinha visto 15 ciclos lunares.
Um dia, arrastado por uma corrente suave, o pescador percebeu que o céu se encheu de pássaros costeiros. Sem conseguir acreditar, chegou a achar que era uma miragem, mas as miragens não duravam tanto tempo – era uma ilha tropical. Tinha chegado a Tile Islet, uma pequena ilha no sul das Ilhas Marshall, um dos sítios mais remotos da Terra.
Um casal encontrou-o e acolheu-o. A história chamou a atenção dos media que, com ceticismo, analisaram a história que parecia retirada de um filme. Depois de consultarem vários especialistas, tudo batia certo.
Alvarenga foi acompanhado por uma equipa de profissionais, mas o seu estado de saúde piorava. Os seus pés e pernas estavam inchados. Os médicos suspeitava que os tecidos tinham sido privados de água durante tanto tempo que absorviam tudo. Só 11 dias depois, os médicos determinaram que a saúde de Alvarenga estava estável o suficiente para poder voltar para El Salvador para junto da sua família.
Durante meses, Alvarenga continuou choque, manifestando um enorme medo não só do oceano, mas de água no geral. Dormia com as luzes ligadas e precisava constantemente de companhia. Só um ano mais tarde, começou a falar da sua aventura. “Passei fome, sede e solidão extrema e isso não acabou com a minha vida”, resume.