Os britânicos não levaram muito a sério os avisos do especulador George Soros sobre a “sexta feira negra” que iria agitar os mercados caso o Brexit saísse vencedor do referendo de 23 de junho. Só quando viram a libra perder 11% do seu valor contra o dólar (entre os dias 23 e 27) e recuar até valores de 1985 é que perceberam que o financeiro estava a falar a sério. Nem eles nem os restantes europeus estavam preparados para enfrentar uma nova tempestade financeira como a que assolou o mundo ocidental em 2007/2008.
Passado o choque inicial, os mercados começaram a recuperar das perdas ao fim de três dias. Logo no dia a seguir ao referendo britânico, as bolsas mundiais terão perdido 2 biliões de dólares (1,8 biliões de euros) com a queda das cotações, valor ao qual somaram 1 bilião de dólares na sessão de segunda-feira. Mas, na terça-feira, 28, o índice de referência para a Europa, o Stoxx 600, deixava para trás uma desvalorização de quase 11% e regressava aos ganhos, abrindo nesse dia a subir mais de 2%.
Foi este o ponto de partida de uma análise de Jeffrey Kleintop, analista chefe da gestora de ativos Charles Schwab, citada pelo The New York Times. Frisando que não há dois choques iguais nos mercados, aquele responsável defende que as bolsas mundiais recuperam das crises nos três a quatro meses seguintes. É assim desde que a crise europeia da dívida teve início em 2009. E exemplifica a sua teoria com três maus momentos da bolsa caracterizados por grandes desvalorizações, logo seguidas de amplas recuperações:
O primeiro exemplo leva-nos até ao fatídico dia 11 de março de 2011, quando um sismo seguido de maremoto provocou um grave acidente na central nuclear de Fukushima. O índice Nikkei recuou 6 por cento numa única sessão, acumulando perdas de 16% em apenas dois dias. Ao fim de 4 meses, tinha regressado aos valores anteriores à catástrofe.
Ainda em 2011, o Congresso norte-americano inviabilizou uma proposta para aumentar o teto da dívida pública e a 1 de agosto o índice Standard & Poor’s 500-stock índex caiu 3%, agravando as perdas para 14% nos dois meses seguintes. Recuperou tudo em 3 meses.
A 12 de março do ano seguinte, a crise europeia da dívida forçou a Espanha a adotar medidas de austeridade e a pedir ajuda externa para salvar a banca. O índice Stoxx Europa 600 caiu 3% num dia, desvalorizando 11% nas sessões seguintes. Os investidores recuperaram tudo também em 3 meses.
Claro que recuar a 2009 parece pouco para avaliar o ciclo de ganhos e perdas dos mercados, mas o analista da Charles Schwab refere que “é importante para os investidores de longo prazo saberem que, nestes momentos, as bolsas recuperam os níveis pré-choque em 3 ou 4 meses”, mesmo “quando acontece uma recessão”.
Apesar de surpreendente, o Brexit não provocou danos tão grandes como se temia na carteira dos investidores – pelo menos até ao momento. A descida de 3,6% no índice S&P 500, logo no dia 24, torna-se “inconsequente” se olharmos para as séries históricas do índice que, desde 1928, mostram quebras maiores das cotações em 180 momentos diferentes. Alguns analistas explicam o menor impacto com as compras massivas de ações realizadas antes do referendo pelos investidores que acreditavam que os ingleses votariam a favor da União Europeia. Ao puxarem pelas cotações, ganharam algum espaço para acomodar as perdas e dessa forma travarem a descida dos índices bolsistas em poucos dias.
Em relação à libra, os efeitos do Brexit também foram assimilados com relativa rapidez. Uma análise do think tank Bruegel, assinada por Zsolt Darvas, conclui que a forte valorização do esterlino, ocorrida entre 2012 e 2015, poderá ter impedido uma maior desvalorização da moeda. Apesar das perdas de dois dígitos contra o dólar, a libra recuou apenas 8% contra o euro, para valores de 2013. E, quando ajustado da inflação, o câmbio da libra não foi tão afetado como tinha sido durante a crise de 2007/8, iniciando de seguida a sua recuperação.