A conversa teve lugar no meio do deserto do Mojave, entre Los Angeles e Las Vegas, nos EUA. Foi ali que a EDP inaugurou o seu mais recente projeto de energias renováveis, um parque eólico e o seu primeiro parque solar naquele país. A aventura na América do Norte começou em 2007 com a compra da Horizon. Hoje, a EDP tem já 40 parques de energia renovável e gere ativos no valor de 7,5 mil milhões de euros.
> Está há 9 anos a liderar a EDP. Foi nomeado para um mandato de mais três. Acha que há um limite de tempo para um gestor estar à frente dos destinos de uma grande empresa?
Acho que não há prazos. Nem demasiado longos nem demasiado curtos. Não há limite enquanto for capaz de trazer energia, ambição, pessoas, novas ideias e de atrair capital para a empresa. Não há limite enquanto conseguir fazer com que o ‘oxigénio’ da organização seja melhor que o da concorrência. A pessoa tem de sentir que está entusiasmada e que tem energia para levar os projetos para a frente.
> Ainda sente entusiasmo após três mandatos?
Sim, mas isso não tem a ver só comigo.
O principal elemento de sucesso assenta nas pessoas que estão à minha volta. Está relacionado com uma equipa cujo núcleo duro está comigo desde 2006, embora tenha tido algumas renovações.
> E tem conseguido arranjar quadros para estes novos desafios?
A EDP é uma referência a nível de s tabilidade, de transparência das contas, da relação com os acionistas e de valorização bolsista. E isso atrai as pessoas.
> Está a falar da sua equipa, mas e o gestor António Mexia? Para mim, o setor continua a ser um enorme desafio. Está no meio de uma revolução.
Uma revolução a vários níveis, quer tecnológico, quer de alteração do centro de gravidade de onde se fazia dinheiro.
O desafio continua vivo.
> Mas não sente necessidade de mudança?
Não. Começa logo pelo facto de em Portugal não existir nenhuma entidade como a EDP. Do ponto de vista de gestão empresarial não há outra. Veja os projetos da EDP nos EUA. Têm uma escala de tal ordem que dá gozo a quem os gere.
> Podem dar gozo ou tornarem-se assustadores…
Gostei sempre, em toda a minha vida, de estar envolvido em coisas com escala. Estive na Gás de Portugal, na Galp e fiz uma passagem fugaz pela política. Nos negócios estrangeiros [António Mexia foi Adjunto do secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros entre 1986 e 1988 e ministro das Obras Públicas em 2004]estive com grandes projetos como as negociações com a Autoeuropa e as privatizações. Estes foram processos que mudaram o País. Sem a Autoeuropa, Portugal não teria tido crescimento económico durante vários anos.
> Por falar nesse período em que esteve no Governo. Ainda tem ambições políticas?
Durante muitos anos tive ambições autárquicas.
Ambições de desenvolver trabalho a nível camarário. Muitas pessoas gozaram comigo por causa da ideia, mas acho que a gestão autárquica é, no fundo, como gerir um enorme conselho executivo. São equipas muito grandes que têm de estar viradas para o cliente que, nesse caso, é o munícipe. Mas, hoje em dia., a política deixou de me atrair. Acho graça à política, mas não me apetece estar envolvido.
> Porquê?
A diferenciação em Portugal é um elemento difícil. As pessoas estão permanentemente sob ataque. Não é sob escrutínio.
O escrutínio é bem-vindo. O problema é o ataque baixo, que a única coisa que faz é criar um ciclo vicioso negativo. Discute-se mais a vida da pessoa, o acessório, do que aquilo que é realmente importante.
> Quer isso dizer que recusará se for convidado para um cargo num futuro governo?
Neste momento não me apeteceria nada voltar.
> Nem se vê noutra atividade?
Tenho pena de não ser bom treinador de futebol. É uma profissão que deve dar gozo (risos). Embora estejam muito dependentes do curto prazo, do jogo a jogo. Na gestão é um pouco diferente. Somos avaliados a cada trimestre.
> Têm uma capacidade instalada de 4 mil MW nos EUA e 5 mil MW na União Europeia.
Uma vez que a América do Norte é o motor de crescimento das energias renováveis, quando é que os EUA terão mais peso que a Europa na carteira da EDP Renováveis?
Por acaso ainda não fiz essas contas, mas, a este ritmo, os EUA poderão estar equilibrados com a Europa dentro de cinco anos.
Apesar de estarmos a investir muito no mercado norte-americano, também continuaremos a fazer investimentos na Europa.
> Mas numa escala inferior?
Na Europa, a base dos mercados é mais pequena. A grande mudança dar-se-á com os investimentos off-shore [parques eólicos no mar]. Países como a França, Inglaterra, Alemanha, Dinamarca e Holanda, por exemplo, dão muita importância ao off-shore face à ausência de condições em terra para projetos eólicos.
> Estão também a concorrer a parques eólicos no mar?
Ganhamos um em França no ano passado em consórcio com a GDF Suez. Trata-se do maior projeto eólico lançado a concurso naquele país, com mil MW. É um projeto que deverá estar em funcionamento no final desta década. Concorremos também a um no Reino Unido, mas não ganhámos.
Mas vamos candidatar-nos, com esse mesmo parque, ao próximo leilão que se realizará até ao final deste ano.
> Além destes, poderão concorrer a mais algum concurso off-shore noutro país?
França e Inglaterra são, neste momento, as nossas duas grandes apostas no off-shore.
> Já tem investimentos no leste, nomeadamente na Polónia e na Roménia. É um mercado atrativo para este setor?
É um mercado muito importante onde podemos e queremos crescer mais.
O mercado polaco é bastante interessante, onde poderemos vir a fazer rotação de ativos [venda de participações em parques eólicos já existentes para investir noutros].
Temos claramente de manter o equilíbrio regional.
> O que é que isso significa?
Uma das razões de sucesso da EDP são as suas políticas de carteira de investimento.
Isto é, diversificar os riscos de cada um dos mercados. Essa é uma razão que nos leva a fazer mais nos países onde temos menos.
> Pode explicar melhor?
Vou dar um exemplo. Podemos ter seca no Brasil, onde temos projetos hídricos, mas, em contrapartida, ter bom vento nos EUA para as eólicas. No global, ficamos menos expostos com esse efeito de diversificação de mercados e de tecnologias.
> Por falar em Brasil, como estão os investimentos nesse país onde já têm investimentos na energia eólica?
O Brasil é um país onde mais de 80% da eletricidade depende da hídrica. No entanto, eles perceberam que o vento pode ser uma componente da resposta à diversificação energética, para não estarem tão concentrados na água. No próximo ano deveremos concorrer a novos leilões no Brasil para aumentarmos a capacidade eólica.
> Para além da Europa e da América, em que outros mercados pretendem apostar?
Vamos avançar com um investimento no Peru e estamos a abordar projetos em África, nomeadamente em Moçambique.
E queremos avançar para a Ásia.
> São grandes investimentos para uma empresa como a EDP. Há capacidade financeira para os fazer?
Já tivemos anos em que investimos mais de 3 mil milhões de euros. Depois passámos para um patamar de 2 mil milhões. Este ano deveremos ficar pelos 1,6 mil milhões de euros.
> Com todos estes investimentos na energia eólica, um pouco por todo o mundo, quando é que a EDP Renováveis ultrapassa a EDP em termos de dimensão?
Não pode.
> Sim, não pode porque está integrada na casa mãe. Mas a Renováveis está a tornar-se um ativo enorme dentro do grupo EDP e com grandes perspetivas de crescimento nos próximos anos…
Sim, mas em termos de valorização bolsista a EDP vale mais do dobro da Renováveis.
O Grupo EDP tem 24 mil MW instalados, dos quais 9 mil são eólicos. A Renováveis é uma componente muito importante do investimento, mas será sempre uma componente.
Começou praticamente do zero há cerca de 10 anos e agora já supera um terço dos ativos da casa-mãe.
> O multimilionário Elon Musk anunciou recentemente o lançamento de baterias para que as pessoas e pequenas empresas possam armazenar eletricidade em casa. O que acha desta iniciativa?
O grande problema da eletricidade é que ela tem de ser consumida quando é produzida.
Atualmente, o maior armazenamento possível é na água, nas barragens e daí os processos de bombagem de água de volta para as barragens, nos períodos de menor consumo. Se fizer uma revolução na armazenagem junto à casa das pessoas, cria uma mudança radical no modelo de negócio.
Ainda não estamos lá, mas não tenho dúvidas que esse será o caminho.
> Uma verdadeira revolução, como Elon Musk lhe chamou?
É um caminho que poderá ter ainda mais impacto com a mobilidade elétrica. Essa sim, será a verdadeira revolução deste setor.