Era um jantar descontraído de uma dezena de amigos. Uma das convivas precisava de desabafar e pedir conselhos: o seu gato estava doente. Logo todas as cabeças se viraram para o veterinário Bruno Santos, que se encontrava no grupo. “Podias ir ver o gato”, disseram-lhe, entre a sugestão e a intimação. Bruno acedeu, e resolveu o problema dermatológico de que o animal padecia. A amiga quis pagar-lhe a consulta, mas ele recusou. Saiu dali, porém, com uma ideia que rapidamente ganhou forma – criar uma empresa de veterinários ao domicílio.
No mesmo jantar estava Rui Patriarca, 40 anos, profissional de gestão e marketing. Conheceu Bruno Santos, 29, através de amigos comuns e, conversando ambos sobre aquele episódio, concluíram que acreditavam a sério nas potencialidades da empreitada e pouco depois, a 10 de junho de 2015, a start up Dr. Bigodes entrava no mercado da medicina veterinária. E a diferenciação vai para lá de o nome não ter as palavras “pet” ou “vet”, como é habitual. Estes veterinários ao domicílio, que atendem todos os dias da semana, das 10 da manhã à meia-noite, resolvem um problema recorrente dos donos de animais de estimação – o da deslocação a clínicas em horário laboral. Ou, noutros casos, de pessoas com mobilidade reduzida, por exemplo. Os animais também beneficiam, pois ficam nervosos com essas saídas de casa para consultas, além de se evitar aí a possibilidade de contágio ou infeção, hipótese sempre presente.
E o que for combinado com o cliente (as marcações podem ser feitas online) é rigorosamente cumprido. “Chegar a horas faz parte da ética da empresa”, diz Bruno Santos. O veterinário lembra-se bem da primeira consulta da Dr. Bigodes. Foi ele quem a fez – e revelou-se pesada. “Fui a casa, no Cacém [Sintra], de uma família que tinha a sua gata, idosa, em falência orgânica. Coloquei a possibilidade de eutanásia sobre a mesa, mas os clientes pediram-me antes indicações paliativas, de maneira a que a gata expirasse na sua casa, aconchegada pelos seus donos.” Morreu nessa mesma noite. E Bruno Santos não lhe esqueceu o nome: “Era a Luna.”
Para supersticiosos, tal arranque seria condenatório. Mas a realidade mostrou-se risonha. Hoje, quando ainda não passou um ano sobre o início da atividade, a Dr. Bigodes apresenta uma carteira de meio milhar de clientes e €60 mil de faturação. E isto só com três veterinários para a Grande Lisboa e apenas um para o Grande Porto. Além de que, do trio de médicos para Lisboa, um dedica-se em exclusivo à acupuntura. “Trabalha com microagulhas e os animais nem as sentem”, explica Bruno Santos. “Até resulta com gatos. É claro que o ambiente em casa tem de estar calmo, e o meu colega também sossega os animais com intervenções no sistema nervoso parasimpático.”
O céu parece ser o limite para a Dr. Bigodes. “O mais cedo possível”, diz Bruno Santos, “queremos chegar a todo o território continental”. Isso implicará a contratação de uma vintena de médicos veterinários. Antes, porém, a empresa tenciona comprar ambulâncias, para o transporte de animais que precisem de exames e tratamentos só passíveis de serem feitos nas clínicas e hospitais com os quais a Dr. Bigodes tem protocolos estabelecidos.
Os estatutos da Ordem dos Médicos Veterinários proíbem a publicitação de preços. Bruno Santos diz, no entanto, que a tabela da Dr. Bigodes “é concordante com a média dos preços das clínicas portuguesas”. E o valor da consulta é sempre o mesmo, “independentemente da hora ou dia pretendidos pelos donos”.
De resto, está aí um imenso mercado para conquistar. Um estudo da Marktest indica que metade dos lares portugueses têm pelo menos um animal de estimação, que há mais donos de cães (3,2 milhões) do que de gatos (2,4 milhões), e que 30% dos gastos com os bichos são em saúde.