A culinária japonesa em Lisboa atravessa um bom momento, graças a um número cada vez mais elevado de restaurantes a servir experiências exclusivas para quem aprecia a tradição nipónica mais tradicional. De fora ficam as fusões e tudo o que elas representam; à mesa chegam produtos sazonais, peixes frescos ou com alguns dias de repouso (ou maturação, mas usar o termo é complexo), pratos quentes e frios, seguindo diferentes estilos. Um dos mais especiais dá pelo nome de kaiseki e, usado de maneira simplista, consiste numa refeição de pequenas porções (degustação), feita seguindo algumas técnicas específicas e produtos da estação, trabalhados também do ponto de vista estético. “Na cozinha kaiseki há mais ou menos 20 técnicas, aqui eu uso 10. Prefiro dominá-las bem, antes de aprender outras”, explica Habner Gomes, o chefe responsável pela cozinha do Mätte. Um brasileiro de Minas Gerais de sorriso fácil, com muita experiência em Lisboa – antes desta aventura estava no Hikidashi, em Campo de Ourique. E acaba de voltar do Japão onde esteve uma semana num restaurante de topo a aprender ainda mais sobre a arte que o apaixona.
O Mätte já servia menus especiais ao balcão, que senta até 8 pessoas, mas a abordagem kaiseki é uma novidade, bem como o próprio balcão, que foi remodelado para criar uma relação mais intimista entre chefe e cliente. O serviço kaiseki funciona de terça a quinta, ao almoço e ao jantar, momentos ao longo dos quais é possível trocar mais do que dois dedos de conversa com o chefe. Com parcimónia, claro, afinal é preciso deixá-lo concentrar-se no corte dos peixes, no empratamento, na preparação de cada momento. “A cozinha kaiseki é muito poética, está ligada à cerimónia do chá e tem vários detalhes. Era chamada a ‘cozinha estranha de Quioto’, por oposição aos pratos de Tóquio, mais focados na ligação entre peixe e arroz, num estilo chamado de Edomae”, conta Habner, em referência à palavra ‘Edo’, nome pelo qual era conhecida a atual capital do Japão. E este último um estilo atualmente também bem representado em Lisboa.
O menu kaiseki do Mätte desenrola-se em 12 momentos, pratos sempre diferentes, feitos consoante os melhores peixes vindos dos Açores e do Algarve. “Uso 100% pescado português, os restantes produtos vêm do Japão”, comenta Habner. O serviço obedece a uma ordem específica, que o chefe vai apresentando com pormenorizadas explicações. Numa refeição recente, o festim começou com um usuzukuri de robalo e raspas de limão-siciliano; seguiu pelo Hassun, uma espécie de caixa onde se representam os produtos da estação em diferentes proteínas, como carne, peixe ou ovos; teve um caldo de miso branco com caranguejo dos Açores; teve uma trilogia de atum; teve um desfile de niguiris que já era uma imagem da casa e continuará a ser – e aqui houve robalo, pargo, lírio dos Açores, sarrajão, chutoro e otoro, este último o expoente máximo do umami; seguiu-se uma gola de lírio, um prato fabuloso onde se serve uma parte do pescoço do peixe; e um pudim de gengibre com caviar ossetra. “O serviço que tenho aqui agora é bem diferente. Observo os produtos da estação, as cores da natureza, faço um menu numa linha mais poética. Tenho muita liberdade e também é isso que me faz amar a profissão”, resume.
O menu kaiseki custa €125 e há possibilidade de fazer pairing de saké ou vinhos. E para toda esta celebração japonesa da estética e da sazonalidade é preciso fazer reserva, claro.
Calçada Marquês de Abrantes, 22, Lisboa / 91 468 2234 / menu servido às terças e quintas 12h30-15h, 19h30-00h