Se esperava que o Seal U fosse um género de Seal mais alto, desengane-se. Apesar das semelhanças no nome e no design (parte frontal), o Seal U foi desenvolvido com objetivos e prioridades bem diferentes do Seal, versão berlina, que já conduzimos. Enquanto o Seal, apesar das competências familiares, é um carro muito virado para o condutor, o Seal U é o oposto: coloca a família e a funcionalidade em primeiro lugar em detrimento da dinâmica de condução.
No novo SUV da BYD não há acelerações que nos deixam colados ao banco. Aliás, os mais de 9 segundos dos 0 aos 100 km/h são quase uma ‘eternidade’ para um elétrico. E, no lugar da suspensão firme da berlina, temos uma suspensão alongada, afinada para oferecer grande suavidade no rolamento. Uma suspensão que se pode considerar ‘mole’, mas que lida bem com ressaltos. Pelo menos foi essa a experiência que tivemos a passar, em diferentes velocidades, por lombas na área de Sintra/Cascais: suavidade na abordagem às lombas, mas com saídas estáveis, sem aquele efeito ‘de barco’.
Apesar de os responsáveis da BYD terem-nos garantido que a plataforma do Seal U é a mesma do Seal, denominada e-Platforma 3.0, a verdade é que as diferenças são notórias. Por exemplo, o Seal foi concebido de base para ser um carro de tração traseira, estando também disponível com tração integral com a adição de um motor frontal, enquanto o Seal U é um carro de tração frontal. Outro exemplo: ambos os modelos usam baterias blade LFP (fosfato ferro-lítio), consideradas mais resistentes a acidentes e mais duráveis. Mas no Seal as células estão instaladas numa arquitetura, mais recente, denominada cell-to-body (CTB), que aumenta a resistência do chassis à torção, enquanto no U as células estão montadas uma arquitetura cell-to-pack (CTP).
As diferenças também são evidentes no interior. Neste SUV a inspiração aquática não é tão evidente e há mais semelhanças com o Han ou mesmo com o Atto 3 do que com o Seal (o volante, por exemplo). Em resumo, ficámos com a sensação que o Seal U está num passo evolutivo anterior relativamente ao Seal berlina.
Muito espaço
Mas estas questões técnicas são ‘transparentes’ para o utilizador e não prejudicam a qualidade do Seal U. Aliás, até podemos defender que as escolhas da BYD foram mais adequadas para um carro onde se procurou, e conseguiu, potenciar o espaço a bordo, o conforto e a funcionalidade. À suavidade de rolamento já mencionada podemos adicionar o bom isolamento acústico, os bancos confortáveis e o espaço generoso no habitáculo. Sobretudo no que diz respeito ao espaço para as pernas nos bancos traseiros, onde três adultos podem viajar com um bom nível de conforto. A mala, com cerca de 550 litros de capacidade base, é generosa e pode chegar a uns expressivos 1440 litros com o rebatimento dos bancos.
Naturalmente, durante este primeiro ensaio, abrimos o capot para verificar se havia frunk e demos com um grande espaço vazio por cima da unidade motriz. Sem qualquer tampa, o que nos levou a acreditar que este seria um espaço para ser ocupado por um frunk (mala frontal) nos carros de produção. Mas quando questionámos um dos engenheiros da BYD, a resposta foi “este é um carro de produção e é mesmo assim”. Estranhámos, até porque o capot tem um sistema de abertura fácil e está equipado com amortecedores para mantê-lo aberto. Ou seja, há todas as pré-condições para se instalar uma frunk generosa e prática.
Duas baterias para escolher
O Seal U vai estar disponível em duas versões: Confort e Design. A principal diferença é a bateria, de 71,8 kWh na versão Confort, e de 87 kWh na versão Design. As autonomias (WLTP) anunciadas são de, respetivamente, 420 e 500 km. Valores generosos, mas que não impressionam considerando as capacidades das baterias. A este respeito, veja-se os exemplos de alguns concorrentes: o Tesla Model Y SR, com bateria de 60 kWh, tem uma autonomia WLTP de 450 km e o VW ID.4, com bateria de 82 kWh, tem uma autonomia WLTP de 550 km. Dois concorrentes de dimensões similares que conseguem fazer bem mais quilómetros com menos capacidade de bateria, apesar de até serem significativamente mais potentes.
O BYD Seal U também não impressiona na potência máxima de carregamento rápido, que é de 115 kW para a versão Confort e de 140 kW para a versão Design. Mas, garantiram-nos que a curva de carregamento é favorável, ou seja, que é possível manter potências de carregamento máximas elevadas durante muito tempo.
Pela positiva, o carregador interno de 11 kW é standard, o que é uma vantagem em postos de carregamento normal e há suporte para a tecnologia V2L, que permite usar a porta de carregamento para fornecer energia elétrica a aparelhos.
Voltando às diferenças entre as duas versões, o Design tem um ecrã central maior (15,6” em vez de 12,8”), sistema de Head-Up Display (projeção de informação no para-brisas), melhor som (10 altifalantes Infinity) e dois carregadores wireless para smartphones. Tudo o resto é idêntico em ambas as versões, incluindo o teto de abrir panorâmico, e o vasto leque de funcionalidades de apoio à condução.
Como já acontecia no Seal, estes sistemas são intrusivos e nem sempre funcionam da melhor forma. Na Serra de Sintra voltámos a sentir uma tendência exagerada do sistema ‘empurrar’ o carro para o centro da via que, mesmo em estradas com dois sentidos, como era o caso. As regras regulamentares mais recentes exigem que determinados alertas sejam sempre reativados automaticamente quando se desliga e volta a ligar o carro, mas parece-nos que a BYD podia ter feito um melhor trabalho na forma como estes alertas, sobretudo os de áudio, são apresentados ao condutor – torna-se muito irritante e desligar os alertas exige demasiados passos nos menus do ecrã central.
Ainda na tecnologia, temos um painel digital generoso e muito informativo. Demasiado até porque há muitos elementos e alguns acabam por ser de leitura difícil para quem não tem visão 10/10. Felizmente, o Head-Up Display (versão Design) é muito generoso e apresenta a informação mais importante na área onde é mais fácil de a ver sem desviarmos os olhos da estrada.
Interface: o bom e o mau
Quanto ao ecrã central, rotativo (pode funcionar na horizontal ou na vertical), apresenta o sistema que já conhecemos da BYD. Pela positiva, está carregado de funcionalidades e oferece um nível de controlo muito alargado. Aqui é possível configurar, em detalhe, um grande número de aspetos, como o tipo de luz ambiente, a forma como o carro ‘recebe’ o utilizador, parâmetros de carregamento, agendamento da climatização, purificação do ar da cabine, modos de condução… Há muita coisa para explorar e a interface reage muito rapidamente, mesmo quando se brinca com funcionalidades mais exigentes para o processador, como é o caso da câmara virtual 3D. Aliás, as muitas câmaras são uma das mais-valias do BYD, na medida em que permitem ver tudo, com pormenor, tudo o que se passa em redor do carro.
Pela negativa, há alguma inconsistência na forma na interface. Apesar de gostarmos de que as funcionalidades mais utilizadas surjam, em grande, no primeiro ecrã, a interface depois muda muito a partir de um segundo nível de exploração. E não somos fãs do estilo smartphone para comutar entre apps – se mantivermos o botão Home pressionado, podemos alternar entre apps abertas ou fechá-las. Parece-nos que a BYD poda fazer um melhor trabalho em adaptar a interface à utilização num automóvel, tornando os menus mais contextuais.
O sistema de apoio à condução permite nível 2 de autonomia (cruise control adaptativo com manutenção na faixa de rodagem) em boa parte das vias, mas está longe, por exemplo, da eficiência do Autopilot da Tesla. Basta as curvas serem um pouco mais apertadas ou não existirem linhas que delimitam claramente as vias para que o sistema deixe de conseguir manter o carro na faixa de rodagem. Mas também se pode argumentar que, deste modo, o sistema não transmite uma falsa sensação de segurança, obrigando-nos a estar constantemente com as mãos no volante… como é suposto.
Preços: só de referência
A BYD ainda não anunciou os preços para Portugal, mas revelou os preços para a Alemanha: €41.990 para a versão Confort e €44.990 para a versão Design. Teremos de esperar pelos valores para o nosso mercado para percebemos o nível de competitividade do Seal U em termos de preço. Mas, a título de curiosidade, fomos verificar os preços do BYD no site da marca na Alemanha: o Seal (berlina) tem um preço base mais baixo que em Portugal (€44.900 em vez de €46.990), mas a versão Excellence AWD é bem mais cara (€50.990) do que por cá (€46.990). O que significa que parece haver alguma margem para o importador português, a Salvador Caetano, adaptar os preços indicados.
Relativamente à concorrência, os €42.990 do Tesla Model Y (versão SR) serão difíceis de bater porque, com base neste primeiro contacto, pareceu-nos que o Tesla tem mais argumentos, sobretudo nas componentes dinamismo e tecnologia. Mas, considerando o perfil mais funcional e menos desportivo do Seal U, parece-nos que os concorrentes mais diretos acabam por ser o VW ID.4, o Nissan Ariya e o Škoda Enyaq, que têm preços bem mais elevados que os preços indicados para o Seal U na Alemanha, sobretudo quando comparamos níveis de equipamento semelhantes.
Primeira opinião
Teremos de esperar por um ensaio mais longo para tirarmos conclusões sobre o Seal U, nomeadamente no que diz respeito à eficiência real, velocidades de carregamento e àqueles pormenores que só se notam em utilização real. Ainda assim, os cerca de 200 km que fizemos, em estradas que conhecemos – a vantagem da apresentação à imprensa internacional ter sido feita na região de Lisboa – são suficientes para uma primeira opinião bem formada.
O primeiro aspeto a realçar é que este Seal U é um Seal apenas no nome. Aliás, na China este SUV tem outro nome e parece-nos que a mesma política deveria ter sido seguida na Europa. Isto porque a denominação Seal pode criar uma falsa expectativa relativamente ao dinamismo do carro. O que só é reforçado pelo design desportivo: o Seal U parece um SUV desportivo, mas não é. Este é um carro com valências familiares. E gostamos disso! Estamos um pouco cansados de SUV duros e desconfortáveis. O Seal U é o oposto disso: é suave e confortável, com um nível de funcionalidade mais típico de uma carrinha ou dos ‘velhos’ monovolumes. Como os outros BYD que temos testado, aparenta ser sólido, bem construído e oferece das melhores garantias do mercado, tanto em duração como nas condições.
Logo que possível voltaremos ao Seal U, que deverá chegar ao mercado nacional em maio. Mas este é um carro que promete muito.