Numa altura em que o mundo depara com uma onda de prisões de realizadores iranianos (Jafar Panahi foi o último), Nadav Lapid estreia, em Portugal, O Joelho de Ahed, filme que denuncia as subtis formas de censura na supostamente muito democrática e ocidentalizada Israel. Claro que os problemas de Lapid em nada se comparam com os dos colegas e vizinhos iranianos – quando muito, poderá ver o financiamento cortado em Telavive e recorrer definitivamente a Paris –, contudo não deixa de ser um filme corajoso e revelador.
O Joelho de Ahed é uma obra catártica e visceral. Está filmada de forma livre e experimental, não só em termos estéticos mas também nas próprias formulações narrativas. É o retrato de um homem só. Um realizador (alter-ego de Lapid?), que é convidado pela Direção-Geral de Bibliotecas de Israel para a apresentação de um filme, numa região remota e desértica do país, vê-se compelido a assinar um papel elencando e restringindo os temas a abordar na conversa.
Isto serve de base para uma catarse moral e denunciante, em que se faz, em simultâneo, um levantamento dos fantasmas da guerra e uma exposição da podridão da política militar e ideológica do país.
Se em O Joelho de Claire, clássico de Éric Rohmer, o joelho é um poderoso símbolo de erotismo, aqui a mesmíssima parte do corpo de uma jovem mulher é o mais robusto símbolo de violência e de opressão. O título da longa-metragem (que é também o filme que o realizador/personagem está a filmar) é tirado de uma frase polémica e bruta de um alto responsável do governo israelita, que disse que Ahed, uma jovem condenada a prisão domiciliária pelo alegado envolvimento na resistência palestiniana, deveria levar um tiro no joelho para ficar em prisão domiciliária para o resto da vida.
Com O Joelho de Ahed, o realizador, já homenageado no curtas de Vila do Conde, confirma ser um dos casos mais sérios e insurgentes do novo cinema israelita.
O Joelho de Ahed > De Nadav Lapid, com Avshalom Pollak, Nur Fibak, Oded Azulay, Michal Benkovitz Sasu > 109 minutos