Na despedida do cargo de diretor artístico do Teatro Nacional São João (TNSJ), Nuno Carinhas regressa a Gil Vicente e a Samuel Beckett, dois dramaturgos com quem se cruzou frequentemente no seu percurso profissional. Na dramaturgia, partilhada com Pedro Sobrado (atual presidente do conselho de administração do TNSJ), procuraram fugir dos lugares-comuns associados às adaptações das obras destes autores. “Não brincamos aos encontros improváveis – confiamo-nos à capacidade de o palco revelar a secreta simpatia que os une, levando-nos a vê-los com outros olhos”, sublinha o texto de apresentação de Uma Noite no Futuro. Ambos são autores bilingues, leitores das escrituras e cultivam a forma breve, marcados por uma escuridão congénita, que o espírito natalício não consegue mascarar.
De Samuel Beckett, recorreram a dois “dramatículos”: Velha Toada, uma peça relativamente desconhecida (adaptação de La Manivelle, de Robert Pinget), em que dois velhos recordam o passado enquanto o mundo moderno lhes passa ao lado; e A Última Gravação de Krapp, monólogo em que um velho ouve e dialoga com uma gravação feita 30 anos antes, versão de si próprio cheia de ânimo e ingenuidade, de que agora escarnece. Já de Gil Vicente, é recuperado o Auto da Fé, texto pouco lido e representado, estreado no Natal de 1510, com dois pastores, Brás e Benito (próximos de Didi e Gogo de À Espera de Godot, de Beckett), a manifestar o seu espanto perante o aparato dos festejos natalícios e o significado da própria época. Além da dramaturgia, Carinhas assina a encenação, os figurinos e a cenografia. O elenco é formado por Alberto Magassela, João Cardoso, João Delgado Lourenço, Paulo Freixinho e Sara Barros Leitão – duas gerações de atores a cruzarem-se em mais uma produção do TNSJ.
Uma Noite no Futuro > Teatro Carlos Alberto > R. das Oliveiras, 43, Porto > T. 22 340 1910 > 13-22 dez, qua e sáb 19h, qui e sex 21h, dom 16h > €10