A exposição começa no exterior e de forma pouco discreta. No pátio central, à porta do Museu Berardo, uma grande escultura nova de José Pedro Croft interpela quem passa. São três janelas gigantes, vidro e ferro, leveza e peso ao mesmo tempo. Para onde se olha através delas? Não sabemos bem, mas é certo que nos vemos refletidos nelas durante o processo. O resto da exposição, já lá dentro (no piso -1 do museu), pode iluminar, ainda, a resposta possível a essa questão.
No texto em que apresenta a lógica desta exposição, a comissária, Yuko Hasegawa (japonesa, diretora artística do Museu de Arte Contemporânea de Tóquio), fala da “íntima relação das obras com a narrativa da saudade” – sublinhando, pela enésima vez, o caráter intraduzível dessa nossa palavra.
O pensador Eduardo Lourenço nunca é citado, mas os títulos de dois textos seus assaltam-nos a cada passo pela galeria: O Labirinto da Saudade e Mitologia da Saudade. É, no fundo, disso que se trata neste diálogo entre 16 artistas portugueses (Vasco Araújo, José Pedro Croft, Luísa Jacinto, Rui Moreira, André Sousa, Pedro Valdez Cardoso e Joana Vasconcelos) e chineses (Leng Guangmin, Tao Hui, Liu Jianhua, Cheng Ran, Guan Xiao, Sun Xun, Shi Yong, Xia Yu e Liang Yuanwei) em diversos suportes (escultura, desenho, pintura, vídeo). A relação com o tema nem sempre é óbvia e linear – mas isso, mais do que uma fragilidade, é uma força que obriga à reflexão sobre as pontes entre os trabalhos expostos. No fim, talvez saibamos para onde nos levam as janelas de Croft. Como quase sempre na arte, olhamos para o futuro ainda cheios de passado. Ou, nas palavras ali citadas do artista Rui Moreira: “Eu vejo a saudade como uma nostalgia utópica do futuro.”
Saudade, China & Portugal Arte Contemporânea > Museu Coleção Berardo, Pç. do Império, Lisboa > T. 21 361 2878 > até 6 jan, seg-dom 10h-19h > €5