Há um manto comprido e pesado a inundar o palco. Cada um dos retalhos coloridos que o compõe simboliza a complexidade do espírito do poeta Daniel Faria (1971-1999), pouco conhecido do grande público mas autor de culto para muitos. Também na primeira peça de teatro por ele encenada no Mosteiro de Singeverga (Santo Tirso), onde entrou para se tornar monge beneditino, Daniel Faria envergava um manto enquanto dizia os seus poemas. “O manto representava todas as coisas com as quais Daniel entrava no mosteiro”, clarifica Pablo Fidalgo. O poeta e dramaturgo galego, atualmente a viver em Lisboa, descobriu a obra do autor português pouco tempo depois da sua morte trágica na sequência de uma queda.
O espetáculo Daniel Faria, que se estreia no D. Maria II, com interpretação de Fidalgo e Tiago Gandra, faz parte da trilogia Estúdio Poético que incluirá também Força Humana (26-29 jan), a partir de Luís de Camões, dirigida por António Fonseca e José Neves, e Rosto, Clareira e Desmaio (9-12 fev), encenada por Susana Vidal, nascida da poesia de Miguel-Manso.
A peça de Pablo Fidalgo parte “não dos poemas de Daniel Faria mas da sua vida, daquilo que envolve toda a sua poesia”. Apesar de não ter procurado fazer uma biografia, o encenador admite que esta é uma peça com “capas de ficção mas não ficcional”.
A dado momento, faz-se um teatrinho com figuras de papel em profundo silêncio – o mesmo silêncio que os monges sempre procuram e que parece “fora do nosso tempo”. O teatro como liturgia. A poesia como fazer. “A ideia de fé de Daniel estava muito relacionada com a partilha. A procura de um lugar para estar com os outros e isso é muito revolucionário”, acredita Pablo Fidalgo.
“Há vidas que não existem no seu tempo. Só acontecem mais tarde.” Talvez seja hora de a vida de Daniel Faria começar, finalmente, a revelar-se.
Daniel Faria > Teatro Nacional D. Maria II > Pç. D. Pedro IV, Lisboa > T. 800 213 250 > 19-22 jan, qui-sáb 21h30 e dom 16h30 > €6 a €12