Os espectadores são conduzidos para uma sala escura pelos bastidores do Teatro São Luiz, em Lisboa, como se estivessem a caminho de outra dimensão. O realizador tailandês Apichatpong Weerasethakul, que está em Portugal no âmbito do festival Temps D’Images, explicaria que a ideia é as pessoas não terem consciência do espaço para que se sintam mais livres de embarcar na viagem. Fever Room é a continuação do cinema de Apichatpong por outros meios.
Há algumas cadeiras destinadas aos espectadores com mais dificuldade em sentarem-se ou deitarem-se no chão, mas o objetivo é que o público ocupe o espaço e seja parte ativa nesta experiência em que o cinema salta do ecrã para a sala de teatro. Inicialmente, surgem quatro ecrãs grandes (dois à frente, um à esquerda e outro à direita) em que é possível reconhecer alguns dos rostos do último filme do realizador, Cemitério do Esplendor (2015), que também aqui se encontram mergulhados em sonhos. Foi, aliás, durante a pesquisa para o filme que Apichatpong se deixou fascinar pelos sonhos e o seu mecanismo durante o sono.
“Os sonhos são criados a partir do que vivemos e o cinema é influenciado pelos sonhos e pela vida. Este espetáculo é uma tentativa de tentar esbater a distância entre os sonhos e o cinema”, explica à VISÃO Se7e o vencedor da Palma de Ouro de Cannes, em 2010, com o filme O Tio Boome Que Se Lembra das Suas Vidas Passadas.
Quando a polifonia cinematográfica dos quatro ecrãs de Fever Room desaparece, o público é convidado a criar o seu próprio sonho com a ajuda de um jogo de luzes e de fumo hipnotizante. Como se cada espectador fosse sugado para esse universo e se tornasse numa nova personagem de Cemitério do Esplendor. “Quando estamos a ver cinema podemos ser um pouco passivos, mas quando passamos para as artes visuais o nosso cérebro é ativado. Aqui combinamos o ativo e o passivo”, afirma Apichatpong. E cada um terá liberdade para fazer deste o seu próprio sonho: “Precisamos de nos libertar do significado das imagens. A audiência terá interpretações diferentes de acordo com as suas experiências.”
Apesar de não ter ninguém em cena, Fever Room é exigente do ponto de vista tecnológico – criar um túnel de luz e fumo que parece sugar-nos para outra dimensão não é coisa fácil. Uma equipa de oito pessoas, incluindo Apichatpong, monta o espetáculo e está atenta às questões técnicas, que incluem pormenores como a densidade do ar na sala de espetáculos.
Fever Room pode ser visto sábado e domingo, 29 e 30, em três sessões diárias, às 15 horas, 17 horas e 22 horas. No domingo, às 18 e 30, haverá uma conversa, também no São Luiz, que junta Apichatpong, a investigadora e realizadora Susana Sousa Dias e o fotógrafo André Príncipe, que prepara uma edição em livro com o realizador tailandês. Até 2 de novembro decorre, também, uma semana com Apichatpong no Cinema Ideal, sempre às 19 e 45, com filmes escolhidos pelo realizador.
Nesta 14ª edição, agora com direção artística de David Cabecinha, o festival criado por António Câmara Manuel inclui uma conferência com o coreógrafo e bailarino Faustin Linyekula (Palácio do Príncipe Real, 20 nov, 17h).
Miguel Bonneville estreia, no Temps D’Images, Chérie Chéri, apresentado em sessões individuais num clube de sexo, que resulta da pesquisa das obras de Paul B. Preciado (Mise-en-Scène, 8-10 dez, das 20h às 02h).
Vera Mantero, Rui Catalão ou Miguel Gonçalves Mendes são alguns dos artistas nacionais representados na programação. Destaque ainda para a estreia absoluta de A Voz Humana, de Francis Poulenc e Jean Cocteau, com direção musical de João Paulo Santos (piano), voz de Lúcia Lemos (soprano), imagem de Vasco Araújo e direção cénica de Jean Paul Bucchieri (Teatro São Luiz, 3, 5, 7 e 11 nov, às 18h30). Tudo para descobrir até 10 de dezembro.
Temps D’Images > em vários locais de Lisboa > T. 21 346 5117 > 27 out-10 dez > grátis a €7