É pela dança que o coreógrafo e bailarino congolês Faustin Linyekula enfrenta os seus medos, as suas dúvidas, as suas alegrias, é através dela que olha o seu passado e se situa no presente. O Artista na Cidade de 2016 regressa a Lisboa durante o Festival Alkantara, para apresentar dois espetáculos que nos mostram isso mesmo: The Dialogues Series: III. Sur les Traces de Dinozord (2012) e The Dialogues Series: IV. Moya (2014), os mais recentes deste conjunto de peças que tem criado para dialogar com artistas mortos e vivos e falar de compromisso e envolvimento com os outros e com o que nos rodeia.
A primeira (Culturgest, 1-2 jun) leva o nome de Dinozord, um dos bailarinos que está com ele em palco e a história deste espetáculo tem mesmo que ser contada na primeira pessoa. A palavra a Faustin Linyekula: “Dinozord veio ter comigo quando estava em Kinshasa e disse: ‘Quero dançar contigo.’ Respondi: ‘Que idade tens?’ ‘Tenho 16.’ ‘Então, devias estar na escola.’ ‘Não posso ir à escola porque o meu avô não pode pagar.’ ‘Como te chamas?’. ‘O meu nome é Dinozord.’ E eu: ‘Uau, foi o que a tua mãe te chamou quando nasceste?’ ‘Não, mas é como me chamo a mim. Porque sou o último da minha raç.a. E ao ouvir um rapaz de 16 anos dizer aquilo percebi que tínhamos que fazer alguma coisa juntos.” Foi com ele que, três anos depois, viajou de regresso a Kisingani, a sua cidade-natal, de onde saíra por causa da guerra (e onde hoje vive). “Pensei: ‘ok, vou ao sítio onde comecei a sonhar.’ Muitos dos meus amigos tinham morrido ali, muitos tinham partido. Regressar era como cantar um requiem pelos velhos tempos, mas não queria ficar no passado, queria olhar em frente, queria dizer ‘as coisas colapsaram, mas Dinozord está aqui, nós estamos aqui’.” A peça fala de renascimento e de esperança, do sonho num lugar devastado pela guerra, e de como nos devemos projetar no futuro. Em palco, Linyekula rodeia-se de outros bailarinos e do seu amigo Antoine Vumilia Muhindo, escritor e preso político, entretanto exilado.
Outro registo toma a peça The Dialogues Series: IV. Moya (São Luiz, 4-5 jun), um solo que é, na verdade, um diálogo entre Faustin Linyekula e a bailarina e coreógrafa sul-africana Moya Michael. Ali se conversa sobre política, cor de pele e vulnerabilidades, num espetáculo criado, primeiro em Joanesburgo e, depois, em Kisingani, entre amigos e familiares. “Se no nosso trabalho falamos dos nossos aspetos mais humanos, então temos que passar tempo com os amigos e a família e não ficar apenas a trabalhar em estúdio”, defende o coreógrafo.
The Dialogues Series: III. Sur les Traces de Dinozord > Culturgest > R. Arco do Cego, 50, Lisboa > T. 21 790 5155 > 1-2 jun, qua-qui 21h30 > €15
The Dialogues Series: IV. Moya > Teatro Municipal São Luiz > R. António Maria Cardoso, 38, Lisboa > T. 21 325 7650 > 4-5 jun, sáb 21h, dom 17h30 > €12, €15