Fonseca e Costa deixa como testamento cinéfilo uma sonora gargalhada. Axilas, o seu filme póstumo, terminado por Paulo Milhomens, está mais próximo de Kilas, o Mau da Fita do que de Cinco Dias, Cinco Noites. Uma comédia que celebra uma Lisboa de outras eras, mas que ainda se encontra entre os amontoados de turistas. Com uma fina ironia, um sentido profundo da cidade e espírito transgressor, é uma das mais interessantes obras do realizador falecido em novembro passado.
Axilas é baseado num conto homónimo do escritor brasileiro Rubem Fonseca. Com a ajuda do argumentista Mário Botequilha, Fonseca Costa retirou a história do seu contexto tropical, do Rio de Janeiro, para a colocar na pacatez da cidade de Lisboa. Mas não fez apenas isso: deu todo um novo enredo, uma ancoragem, fazendo com que a pequena história de Rubem só entroncasse com o filme na parte final.
E se esse final está repleto de todo o humor negro, da frieza de crimes sem castigo e sem remorso, que caracteriza parte da obra do escritor brasileiro, em tudo o resto se desenvolve o ambiente de crónica de costumes lisboeta, com as suas figuras-tipo, e algumas homenagens próprias de quem tem a consciência de que está a realizar o último filme. A principal será mesmo Alexandre O’Neill cujos versos são declamados ao som das guitarras de José Manuel Neto e Carlos Manuel Proença.
O filme assenta na personagem de Lázaro de Jesus, magnificamente interpretado por Pedro Lacerda. Uma figura de um burlesco lisboeta com traços de Mário Viegas, João César Monteiro e Buster Keaton, numa história de uma bizarria trágica que leva inevitavelmente ao riso.
Axilas > De José Fonseca e Costa, com Pedro Lacerda, Elisa Lisboa, Maria da Rocha, André Gomes, José Raposo, Margarida Marinho e Fernando Ferrão > 90 min