Nos últimos anos, o cinema de Jorge Silva Melo tem servido o justo propósito de registar a vida e a obra de grandes criadores que admira, como Álvaro Lapa ou Glicínia Quartim. Atos de serviço público sob a forma de filme. Agora, chegou a vez de se retratar a si próprio. E falando de si fala de dezenas de outros, mas sobretudo descobrimos um homem erudito, atual e atuante sobre a sociedade. É assim Ainda Não Acabámos, a autobiografia filmada de Jorge Silva Melo, encenador, cineasta, dramaturgo, homem de artes e letras, com o qual só podemos aprender.
O filme é construído como se fosse uma carta a gerações vindouras. Organiza-se cronologicamente e tem como base a voz (ora em off em on) de Jorge Silva Melo. É uma voz cansada, vivida, cheia de passado. O mais fascinante é a sua hábil encadeação de ideias, com um bom ritmo logo desde início, que mostra como tudo está ligado: a geografia das pequenas ruas, os pormenores dos edifícios e monumentos, o cinema, a cidade que se entristece com os padrões cinzentos do regime, a literatura, a política, Paris, todas as artes. E, depois, claro, o teatro. Desvendado como algo profundo, íntimo, pessoal e transmissível. Que não é só de quando se sobe ao palco, mas também, ou principalmente, dos ensaios vividos, da zona de fronteira entre atores e personagens. Ainda Não Acabámos só estará uma vez em exibição, mas merecia entrar no circuito comercial.
Ainda Não Acabámos, Como Se Fosse uma Carta > De Jorge Silva Melo > Teatro Municipal São Luiz > R. António Maria Cardoso, 38, Lisboa > T. 21 325 7640 > 8 fev, seg 19h > grátis