O título é apenas medianamente sugestivo e a capa da edição portuguesa lembra a de um livro de autoajuda, mas o nome do autor promete uma qualidade que a leitura confirma. O mais recente ensaio de Amin Maalouf é, com efeito, uma reflexão fascinante sobre a deriva do mundo em que vivemos, sobretudo nos seus aspetos políticos e sociais. Naufrágio? A palavra usada poderia ser outra, mas afinal como havemos de chamar ao termo da viagem de uma nave desgovernada?
Radicado há quatro décadas em França, Amin Maalouf desfruta, enquanto observador, da vantagem de ser libanês. No ano do seu nascimento (1949), estava a chegar ao fim uma época de convívio intercultural feito de integração e tolerância, num espaço alargado do Mediterrâneo Oriental, da Europa do Sul e do Norte de África então vulgarmente chamado Levante. Bruscamente, um jogo de equívocos, cujos peões foram o nacionalismo, o anticolonialismo, o estatismo sob o seu pior aspeto e o radicalismo religioso, aliados à substância pouco flexível do moderno estado de Israel, levou a que tudo se alterasse. O Próximo Oriente (nós dizemos, erradamente, à anglo-saxónica, “Médio Oriente”) transformou-se num espaço de intolerância permanentemente em chamas, sem que se divise a forma de apagá-las.
O próprio mundo, durante muito tempo acomodado aos lados direito e esquerdo (“conservador” e “progressista”) da barricada, mudou, como o autor observa, por volta de 1979, ano da irrupção do regime dos mulás no Irão e da subida ao poder de Margaret Thatcher na Grã-Bretanha. O “desestabilizador” João Paulo II era Papa desde o ano anterior, e em breve seria eleito Ronald Reagan para a Casa Branca. Em resultado de todos estes acontecimentos, inverteram-se mediaticamente os conceitos de direita e de esquerda e a cabeça das novas gerações nasceu com um disco rígido diferente. Mas como resumir em poucas palavras este livro seminal, cujas conclusões são necessariamente pessimistas? Só mesmo lendo…