Quando o fado, que nasceu entre marinheiros e prostitutas, passou também a ser acompanhado ao piano, nos salões, no final do século XIX, tornou-se socialmente transversal. Já não era apenas uma música do povo, passou a satisfazer o gosto, também, da aristocracia. Quando Camané e Mário Laginha gravam este disco de fados ao piano, alicerçam-se nessa remota tradição de que não sobraram registos fonográficos. Mas também numa prática recente. O fado tem vindo a ser tocado ao piano por músicos como João Paulo Esteves da Silva e Ricardo Dias. E não nos esqueçamos de que Alain Oulman compunha ao piano para Amália e só depois fazia a transcrição para as guitarras
O que se realça neste disco é o espaço natural para ambas as linguagens. Mais do que um álbum de fado ao piano, é um álbum em que se ouvem Camané e Mário Laginha, cada um deles com imensa personalidade. Um encontro feliz, com vários momentos especiais. Destaca-se Amor é Fogo que Arde Sem Se Ver, mais um inédito de Alain Oulman. E também o facto de, pela primeira vez, Camané gravar temas do repertório de Amália – Com que Voz e Abandono –, fadista que tomou como referência. Mário Laginha apresenta um fabuloso tema instrumental, intitulado Fado Barroco, que justamente faz a ponte entre esses dois mundos aparentemente distantes; e contam-se vários inéditos, como Se Amanhã Fosse Domingo (letra de João Monge) e Rua das Sardinheiras (letra de Maria do Rosário Pedreira). Tudo se faz num justo equilíbrio entre o repertório habitual de Camané e novos temas, entre o fado tradicional e o fado canção.
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O novo álbum de Camané e Mário Laginha, “Aqui Está-se Sossegado”, tem uma apresentação ao vivo marcada para o Coliseu de Lisboa no dia 20 de dezembro.