Luís Osório tem muitas vidas. A de homem de televisão, com os programas Zapping e Portugalmente, a de jornalista, que o consagrou, a certa altura, como um dos melhores entrevistadores da imprensa portuguesa (com as entrevistas que realizava no suplemento DNA, do Diário de Notícias), a de radialista (foi diretor do Rádio Clube Português), a de consultor e a de homem dos livros (sete títulos publicados, o último dos quais um romance). Em todas essas vidas, ele tem o nome de Luís, mas as suas vidas são tantas que, naquelas que revela agora, responde por Miguel.
Miguel, era assim que a mãe e a avó o tratavam, deixou de responder por este nome quando elas morreram. Luís Osório desenterra o Miguel do seu passado e escreve sobre a infância, a relação conflituosa com a mãe e a ligação às suas cinco famílias (a da mãe, a do pai, a do padrasto, a dos seus dois filhos mais velhos e a sua família atual). Numa narrativa (termo que se aplica não só à literatura mas também à psicoterapia) escrita em forma de carta, Osório interpela diretamente a mãe, como se estivesse a falar com ela, fazendo-lhe as perguntas que ficaram por fazer e dizendo-lhe o que não foi capaz de dizer.
Esse mergulho de cabeça no oceano profundo das recordações afetivas e das ligações familiares ultrapassa, no entanto, a geografia pessoal. Pela forma como o autor se expõe totalmente (pelo menos assim o parece), pelo que nos traz de uma Lisboa dos anos 70, com um pé na burguesia de Campo de Ourique e outro nas overdoses do Casal Ventoso, pelo que nos recorda das dificuldades, hoje esquecidas, pelas quais muita gente passou para criar os filhos, pelo que nos interroga, a cada um de nós, sobre as nossas próprias histórias familiares. “Onde estás, mãe?”.