Numa entrevista datada de 2008, Roberto Saviano contou: “Eu tinha 13 anos quando vi o primeiro cadáver.” Isto é: um corpo executado pela máfia napolitana em Casal di Principe, onde o autor italiano nasceu em 1979 e aonde não pode regressar, condenado ao exílio e à proteção policial ad aeternum depois de ter publicado Gomorra. Os Meninos da Camorra ainda não têm 16 anos mas já conhecem e imitam o código implacável das famiglias (“Quando é preciso vattere em alguém, as regras de honra não contam (…). Vatte-se em quem se conhece, bate-se em quem é desconhecido.”). Os sonhos deste cardume de miúdos empoleirados em motas, e seduzidos para serem soldados das paranzas, dos gangues, são alimentados pelo glamour das marcas e pelo Facebook dos tubarões de Forcella: “Não queriam saber como é que se juntava dinheiro, o importante era juntá-lo e ostentar. O importante era ter carros, roupa, relógios, ser desejado pelas mulheres e invejado pelos homens.” E integrarem as fileiras dessa realeza gângster do Nuovo Maharaja, bar “enroscado nas rochas como uma fortaleza inexpugnável”, em Posillipo, um monumento de brancura “com a majestade de um templo grego” – toda uma ironia arquitetónica.
Marajá, Briato, Tucano, Dentinho, Dragão, Lollipop, Peixe Mole, Estava-a-Dizer, Drone, Bolachinha e Fósforo – nomes de guerra – são recrutados para, depois das aulas, “passarem fumo”, venderem drogas. É uma questão de tempo até estarem armados com berettas, dispostos a matarem e a sulcarem um “mar vermelho”, enredados numa perversa malha social que, é sublinhado, reforça este destino. Saviano disse ao El País, em 2017, que, face às acusações de plágio e à realidade que aborda, optou pela ficção para evitar ter de se justificar. Este romance mantém a crueza, a agilidade, a imagética poderosa e a denúncia da sua escrita jornalística… Como se ele tivesse necessitado apenas de olhar pela janela.