O fenómeno Evgeny Kissin revelou-se ao mundo em 1984, quando ele, com 12 anos, tocou os dois concertos de Chopin no Conservatório de Moscovo. O vídeo ainda se encontra facilmente no YouTube, permitindo apreciar a dimensão do milagre. Anos depois, algumas gravações com um reportório habitual em virtuosos russos – Liszt, Schumann, Rachmaninoff… – reforçaram o estatuto de Kissin como o pianista de referência da sua geração.
Nunca esqueceremos aquele disco com uma seleção do seu recital de estreia no Carnegie Hall, em Nova Iorque. Aí é possível reconhecer imediatamente um génio mesmo sem saber nada sobre ele. Seguiu-se a busca dos restantes discos, tanto os gravados na RCA como os do período anterior, na Rússia. Não raro as obras eram as mesmas, e a comparação tornava-se interessante. Além dos grandes compositores românticos e dos russos, também havia algum Mozart (concertos 12 e 20), Haydn, Beethoven e Schubert. A primeira desilusão, já em 2004, seria justamente uma gravação da última sonata de Schubert, onde havia escolhas (e oscilações) de tempo um pouco estranhas. Estaria Kissin, por monotonia ou por excesso de talento, a procurar vias novas que arriscavam tornar-se maneirismos? Se sim, os clássicos vienenses não eram o terreno de experimentação ideal.
Este CD de Beethoven, contendo gravações ao vivo entre 2006 e 2016, acalma em larga medida as dúvidas. Em interpretações de virtuosismo tipicamente kissiniano e com certa profundidade de pensamento, surgem algumas das sonatas mais conhecidas – a nº 14 (Sonata ao Luar), a 23 (Assassionata) e a 26 (Adeus) – mas também a nº 3, da juventude, e a nº 32, com a sua oposição binária entre o vigoroso Allegro com Brio e a longa Arietta de serenidade quase zen. A estas obras, acrescentam-se as célebres 32 Variações sobre um Tema em Dó Menor, onde Kissin desenha outras tantas minipaisagens.