Quando as madeiras velhas, em fim de vida, chegam às mãos de Margarida Monteiro, as ideias começam a fervilhar na cabeça da arquiteta de 36 anos, cocriadora da Musgo, juntamente com o marido Rui Ribeiro, formado em Educação Física. Ainda há dias, o casal foi buscar ao Porto umas vigas do telhado de um quartel de bombeiros, “que poderiam ter terminado no lixo ou numa fogueira”, lembram. Carregaram a madeira com mais de 200 anos para Felgueiras, onde abriram, em 2016, o atelier da marca de candeeiros sustentável, numa antiga vacaria recuperada na quinta da avó de Margarida.
“As minhas criações nascem de formas simples e geométricas. Inspiro-me em tudo o que nos rodeia, essencialmente na Natureza”, conta a criadora que começou a apaixonar-se pela iluminação quando trabalhou no Rio de Janeiro, durante três anos, como arquiteta de interiores. O Junco, um dos últimos candeeiros, feito com ecocimento a partir de desperdícios de celulose (material criado pela Universidade de Aveiro), foi inspirado num antigo bebedouro de animais. “Todos eles têm nomes de árvores e de arbustos do território nacional”, explica. Cipreste, Aroeira, Samouco, Urze, Teixo, Zimbro… e por aí fora.
O primeiro candeeiro de mesa da Musgo nasceu de uma porta antiga, oferecida pelo vizinho Joaquim, o carpinteiro que lhes limpa as madeiras, tira a ferrugem e os pregos e corta os moldes com a ajuda de um torno manual. “Nós fazemos os acabamentos finais: lixamos, colocamos o carimbo da marca a quente e o verniz biológico”, explica Margarida, para quem a manualidade e a sustentabilidade são os pilares do negócio. A maior parte dos candeeiros (sobretudo de mesa mas também de teto) é proveniente da tal madeira reutilizada, mas eles podem combiná-la com o betão feito à mão no atelier. Embora, na sua maioria, os clientes da Musgo sejam portugueses, a marca tem entrado no mercado alemão e holandês. Quando Margarida e Rui enviam as encomendas, com cada candeeiro vai um lembrete: “Eu já fui uma porta” ou “Eu já fui uma janela”… Para memória futura.
Em Leiria, é também à volta da madeira que Francisco Ferreira, 57 anos, ocupa os seus dias, sempre que não está a trabalhar num hotel. Na carpintaria, corta e lixa pequenos pedaços de madeira de faia, num trabalho minucioso, do qual faz nascer os candeeiros da Flighting, inspirados em “figuras e formas geométricas, a partir de poliedros” de diferentes tamanhos, entrelaçados ou ligados por fios de nylon.
Formado em Hotelaria, mas há muito apaixonado “pela parte criativa e pelas coisas manuais”, Francisco despertou para a iluminação quando foi viver para Leiria, após mais uma década a trabalhar no Porto, e aí descobriu velhos armazéns com stocks de vidro da Marinha Grande. “Queria criar algo fora dos produtos industrializados”, que aliasse “a sustentabilidade à menor pegada possível”, sublinha. Ainda a dar os primeiros passos, a marca, criada em 2017, faz parte da rede Portugal Manual. E se, por ora, Francisco Ferreira ainda tem de conciliar a Flighting com o part-time na hotelaria, o sonho deste adepto de caminhadas pela Natureza é vir a trabalhar na carpintaria a tempo inteiro.
Do barro fez-se luz
Patrícia Lobo, 39 anos, sempre gostou de trabalhos manuais desde pequena, quando se entretinha a juntar restos de tecido deixados no chão pela avó modista. Mais tarde, seguiu design, mas a paixão pelo cinema levou-a, durante anos, para a televisão e a publicidade. Ainda experimentou fazer bijuteria e acessórios de moda, mas no fundo sabia que não eram esses os trabalhos criativos que ela procurava. Num Dia dos Namorados, Eduardo (marido, entretanto) ofereceu-lhe um curso de roda de oleiro. “Quando experimentei, percebi que dali podia vir aquilo que andava à procura. Sabia que o que eu queria tinha que ver com decoração”, recorda. Começou por fazer os azulejos para a casa que os dois estavam a construir, mas acabou por encontrar uma lacuna em Portugal no que toca aos candeeiros de cerâmica.
Com linhas minimalistas – “Gosto de coisas que sejam harmoniosas e simples, que tenham uma presença no espaço, mas que não o definam por si só”, justifica Patrícia –, começaram por ser feitos numa mufla a gás na garagem de sua casa. Com o evoluir das encomendas e a morosidade das peças (8 a 10 horas a cozer e mais 12 horas a arrefecer), mandou fazer um forno maior, que teve de instalar num armazém na Charneca da Caparica. Dali, saem os vários modelos de teto e de parede feitos à mão, de vários tamanhos – em junho, há de lançar uns apliques novos –, que podem ser personalizados com as cores criadas pela designer, após três meses a apurar centenas de tons. “Fazer uma cor em cerâmica é uma coisa complexa, não basta misturar uma com a outra. São óxidos que reagem quando queimados dentro do forno, e isso é que lhes dá a cor”, explica, entusiasmada com as novas tonalidades que terá, em breve, a partir da pintura com engobe que anda a experimentar (deixa o barro sem o efeito vidrado). “Um candeeiro tem de brilhar por si próprio”, defende.
Filipa Mendes e Gustavo Macedo, 36 e 37 anos, respetivamente, acreditam que a iluminação pode tornar um espaço “menos aborrecido”. A dupla, a viver no Porto, criou a Galula, uma marca para non-boring spaces que encontrou na cortiça portuguesa “um material nobre e com capacidades térmicas”, ideal para os seus candeeiros feitos manualmente. O Glint, criado em 2012 para a exposição Remade in Portugal, a fazer lembrar uma lanterna, abriu-lhes o caminho para a iluminação – também fazem objetos de decoração e de mobiliário.
A “versatilidade aliada à sustentabilidade” é, diz Filipa, a base de cada peça da marca que, em 2016, foi citada pelo jornal britânico The Sunday Times, após a participação na Feira do Design de Londres. Exemplo disso é o candeeiro suspenso, Sininho, nascido há cinco anos do reaproveitamento de sobras dos bancos triangulares em cortiça. “Quem nos procura quer saber a história do produto, quem o faz, o material que usamos. E a cortiça é diferenciadora”, sublinha Filipa Mendes.
Folhas iluminadas
Quando, em 2013, as arquitetas Ana Morgado e Carmo Caldeira começaram a fazer candeeiros de papel inspirados na técnica japonesa origâmi, com o objetivo de angariar fundos para a associação Adobe for Women (apoiar mulheres mexicanas na construção de casas com blocos de adobe), não imaginavam passar a dividir o atelier de arquitetura Blaanc, em Lisboa, com a Orikomi. A marca, que se distingue pelos abajures feitos à mão, com folhas de “papel resistente, em cores que não se desvanecem”, acabou por atingir um sucesso inesperado.
O catálogo – com candeeiros de teto, de mesa e de parede – tem crescido e conquistado diferentes cores e padrões, embora o branco continue a ser o mais vendido. Recentemente, a Orikomi lançou dois modelos de animais desenhados à mão, que podem ser montados em casa. “Os nossos modelos têm uma visão de arquiteto, com linhas minimalistas, retas e formas simples”, descreve Ana Morgado, 39 anos. “Para quem fez maquetas a vida toda, a dobragem de papel não foi difícil”, conta. Entre vincar, dobrar e colar folhas, Ana e Carmo gostariam de encontrar uma marca de papel reciclado portuguesa para os seus candeeiros amigos do ambiente e com baixo consumo energético (só podem levar lâmpadas LED ou económicas).
Foi também devido ao encantamento pelo papel, e à experiência em fazer maquetas, que os arquitetos Hugo Formiga, 40 anos, e Teresa Almeida, 32 anos, ligados à reabilitação urbana em Lisboa, andam desde 2016 a criar pontos de luz com figuras de animais. O primeiro a nascer foi a coruja – em inglês Owl, que deu o nome à marca –, ao qual juntaram, entretanto, um pinguim, um papagaio, uma tartaruga, um urso-polar, além de três modelos de candeeiros suspensos: avião, submarino e foguetão.
O que distingue a Owl é o facto de a peça ser enviada por montar numa caixa, propondo-se que seja o cliente a dobrar e a colar as dezenas de folhas de cartolina, seguindo as instruções. Mas desengane-se quem achar que, por se tratar de animais, estes candeeiros se destinam a crianças. O mercado da marca é quase exclusivamente internacional (Inglaterra, Alemanha, Estados Unidos da América), e o público-alvo são os adultos (arquitetos, designers…). Afinal, é preciso alguma destreza de mãos para fazer nascer estas ideias luminosas.
ONDE COMPRAR
Musgo > musgodesign.pt
Flighting > flighting.pt
Patrícia Lobo Ceramics > patricialoboceramics.com
Galula > galulastudio.com
Orikomi > orikomi.pt
OWL > owlpaperlamps.com
Do dia para a noite: O modo como dispomos os candeeiros pode fazer toda a diferença. Eis 5 dicas
- Forma e função
Na hora de escolher um candeeiro, é importante pensar tanto no design como na funcionalidade. Uma iluminação apropriada é importante não só para vermos melhor mas também para nos sentirmos melhor - Realçar e iludir
Criar luz e sombras com o auxílio de candeeiros permite realçar certos elementos de que gostamos, como um quadro, um pormenor bonito numa estante, um móvel ou até o papel de parede - A regra dos 5-7
Todas as divisões da casa devem ter, pelo menos, cinco a sete pontos de iluminação. Conte quantos candeeiros tem em cada divisão, veja como estão distribuídos e se cumprem a sua função onde se encontram - Luz direta ou difusa
Os candeeiros podem ser retificadores (emitem luz direta) ou difusores (emitem luz difusa ou indireta). Um candeeiro de pé com luz direcionada é indicado para ler um livro ou fazer trabalhos manuais, enquanto um que filtra a luz através de um abajur funciona melhor como iluminação decorativa ou para criar ambiente - Níveis de iluminação
Os candeeiros (à exceção dos de teto) não devem estar todos à mesma altura. Em alternativa, podem também usar-se focos de luz para cima ou para baixo – num canto escuro, faz uma divisão parecer maior
Fonte: Livro Sinta-se em Casa – O Manual de Decoração de Interiores, de Frida Ramstedt (Lua de Papel)