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AO RITMO DAS ONDAS
Há um espírito de missão de cada vez que Humberto Machado, 37 anos, pega na bicicleta. De há um mês para cá, o militar é movido, não pela defesa dos interesses da pátria ou por fins humanitários, mas pela luta contra os quilos extra que a balança continua a revelar. A paisagem da ciclovia de Gaia, na sua maioria paralela ao mar, revelou-se um precioso aliado nesta batalha solitária.
“Neste período fiz cerca de 750 quilómetros”, conta.
Apesar de Humberto preferir praticar sozinho, a verdade é que, ao longo do percurso, não faltam ciclistas a seguir o mesmo propósito.
Chega ao final da tarde e é ver homens (sobretudo) e mulheres de todas as idades a pedalar. A maior crítica apontada pelos utilizadores é a invasão dos peões do piso sinalizado a vermelho ou amarelo, obrigando a uma atenção acrescida. O gestor Rui Vaz, 28 anos, admite ser um privilegiado. Com a casa fronteira à ciclovia, “é fantástico poder pendurar o fato e a gravata, fazer exercício e apanhar um pouco de ar no fim do dia”.
No seu caso, limita-se a fazer o troço entre Valadares e a praia da Sãozinha. Isto porque a pista, de cerca de 14 km, sofre vários cortes. O objectivo do município é ligar toda a marginal por ciclovia, como se constata pelas obras que decorrem em alguns locais. De qualquer maneira, para quem não queira sujeitar-se a subidas e descidas de passeios e passagens pelas estradas municipais, desde a Afurada, junto à foz do rio Douro, até à praia da Madalena (cerca de 6 km), o traçado é contínuo.
E convidativo. Ludovina Seixas, enfermeira, exibe uns 50 anos invejáveis. Duas vezes por semana, agarra-se à bicicleta e experimenta “uma enorme sensação de liberdade”. Há dois anos, a saúde pregou-lhe uma partida. Mas Ludovina não parou. “É preciso olhar sempre em frente”.
A ESTRADA ATLÂNTICA
‘Em Agosto vimos sempre para aqui de férias e andamos muito de bicicleta”, conta Gonçalo, sentado no selim e com um pé no chão. Ele e o amigo Francisco são habitués da Estrada Atlântica, a ciclovia costeira que se “reparte” pelos concelhos da Marinha Grande, Alcobaça, Nazaré e, proximamente, também Leiria e Pombal. É uma extensa ciclovia, com o característico piso vermelho no interior das localidades, desnivelada em relação à estrada, que está mesmo ao lado. Composta por dois percursos, um que liga S. Pedro de Moel à Praia da Vieira (15 km) e outro que começa à saída de S. Pedro e vai até ao Sítio da Nazaré (19 km), é uma ciclovia de grande beleza paisagística marcada pelo Pinhal de Leiria, as matas, as arribas e as praias da zona. A primeira, que começa junto ao Farol do Penedo da Saudade, leva-nos durante alguns minutos junto à costa, passando pelas praias das Conchas e Velha até se “enfiar” pelas matas, zonas onde a pista ciclável passa a ser de betuminoso, mas devidamente demarcada da estrada contígua por pequenos pilaretes de madeira. Ao longo deste percurso existem zonas de descanso para pausas retemperadoras e com cheiro a pinheiro e eucalipto.
Joana e Vanessa, 20 anos, também costumam passar férias em S. Pedro de Moel. No dia em que encontrámos estas irmãs gémeas, na passada quarta-feira, a chuva miudinha e o céu carregado talvez não convidassem muito ao passeio, mas ambas estavam determinadas.
“Estamos de férias e viemos passear”, conta Joana, junto ao farol.
Na outra ponta, onde começa a via que se estende até à Nazaré, os amigos Gonçalo e Francisco pedalam calmamente, “mas só até à praia de Paredes”, nota Francisco. Aliás, esta é uma das zonas mais interessantes da ciclovia, já que deixa ver um pouco de mar e até tem um miradouro, uma espécie de promontório em madeira que se debruça sobre o oceano. “Nós até gostamos mais da zona do farol, mas hoje viemos para aqui”, diz, um pouco ofegante das pedaladas, Francisco.
E se estes frequentadores habituais de S. Pedro de Moel trouxeram a bicicleta de casa, para quem não a tem o assunto pode ser resolvido por Filipe Luís. O mais recente empresário da localidade formou uma pequena empresa de aluguer de bicicletas, a Numacycle, e está à porta do Posto de Turismo.
“Por agora tenho oito bicicletas, seis para adultos e duas para crianças, mas vou ter mais. Há bastante procura”, assevera. Não admira que haja, com tantos quilómetros de ciclovias (ainda há mais uma que liga a Marinha Grande a esta localidade e tem sete quilómetros) e uma outra, em construção, que vai “juntar” a Praia da Vieira à Praia de Pedrógão.
O FIM DO MITO ALFACINHA
‘Mas não dá para andar de bicicleta em Lisboa.” A frase tem sido repetida até à exaustão. As colinas, as vielas, a inclinação das ruas, o trânsito caótico.
Argumentos não têm faltado para contradizer quem acha que sim. A Câmara Municipal de Lisboa está do lado do “sim” e meteu mãos à obra.
A capital vai ter cerca de 30 km de vias cicláveis já no final de Setembro, segundo a autarquia.
Na semana passada ficaram concluídos os 7,4 km da ciclovia ribeirinha (Belém-Cais do Sodré) embora ainda tenha pequenos troços em melhoramentos, como comprovámos in loco. A edilidade está apostada em fazer desta uma cidade ciclável. O objectivo é que as pessoas utilizem a bicicleta como meio de transporte e não apenas como forma de lazer e que estas vias funcionem em articulação com os transportes públicos. No entanto, ainda há lacunas a preencher, já que o metropolitano apenas permite o transporte de bicicletas depois das 20 horas nos dias úteis e a Carris tem seis Bike Bus (21, 24, 25, 31, 723, 728) disponíveis a qualquer hora. Serão 14 ciclovias: Pq. Florestal de Monsanto -Pq. Quinta da Granja; Pq. Quinta da Granja -Pq. Quinta Mata Mouros; Jardim do Campo Grande -Pq. Vale de Chelas; Pq. Vale de Chelas -Pq. das Nações; Telheiras -Campo Grande; Av. Frei Miguel Contreiras -Alvalade; R. de Entrecampos norte; Pç. de Espanha -Arco do Cego; Pq. Florestal de Monsanto -Av. Calouste Gulbenkian; Av. Calouste Gulbenkian -Jardim Amália Rodrigues; Av. Calouste Gulbenkian -Pç. de Espanha; Pq. Quinta da Granja -Telheiras; Cais do Sodré -Torre de Belém; Pq. Quinta da Granja. Mas há quem continue com dúvidas. Bruno Martins, 21 anos, aponta os argumentos que lhe dificultam a vida. “Não tenho onde a ‘estacionar’ e o facto de ficar suado e não ter local para tomar banho impedem-me de usá-la como meio de transporte “, diz, junto ao ciclo-viaduto da Radial de Benfica, sentado no selim e equipado para 1h15m de pedaladas que faz quase todos os dias.
Pode ser que mude de ideias.
ETAPA MINHOTA
A perspectiva de Ponte de Lima, logo no início do troço das Lagoas, é encantadora.
O percurso desta ecovia, de quase 5 km, começa na margem direita do rio Lima, junto à ponte romana e, durante alguns metros, pode observar-se o núcleo da vila mais antiga de Portugal. Ali encontramos a professora Ana Aguiar, 45 anos, vinda de Braga. “O percurso é muito agradável e também se pode fazer observação de aves.” Durante algum tempo, acompanha-se o curso do rio, pontuado por amieiros, choupos, salgueiros e carvalhos, além de campos de cultivo delimitados por videiras altas. De seguida, ao entrar na paisagem protegida das lagoas de Bertiandos e S. Pedro de Arcos, exigem-se alguns cuidados. Há zonas sensíveis, por passadiços de madeira, onde a tranquilidade é a palavra de ordem e é proibido andar de bicicleta. Os utilizadores podem optar por aceder ao centro de interpretação ambiental ou seguir até à Quinta de Pentieiros, onde fica o parque de campismo. Em qualquer dos casos, a vegetação densa assegura uma sombra recompensadora. Para aqueles que não vieram devidamente equipados, a autarquia disponibiliza um sistema de bicicletas de uso partilhado, baptizadas de Lagoas. O aluguer pode ser feito no centro histórico, junto ao mercado municipal, ou na Quinta de Pentieiros, diferindo o preço conforme o tempo do empréstimo (mínimo de €2). Existem bicicletas de diferentes formatos cerca de 40 normais, três triciclos, quatro duplas e oito de crianças.