A queda de cabelo é uma condição médica bastante comum que pode ter origem em vários fatores, afetando tanto homens como mulheres. Algumas estatísticas indicam que cerca de 80% dos homens e 50% das mulheres experienciam perda de cabelo em algum momento das suas vidas, pelo que é também natural que esta condição seja um alvo frequente das farmacêuticas, que procuram atrasar ou impedir os seus efeitos.
A perda e enfraquecimento de cabelo pode ser o resultado de diferentes fatores. Atualmente, a condição conhecida pelo nome de alopecia areata é a causa mais comum para a perda de cabelo, podendo ser tanto uma consequência da idade, como também o resultado de outros agentes, nomeadamente o stress ou por efeito secundário de dado medicamento.
Assim, desde champôs e pomadas a tratamentos especiais, a indústria farmacêutica tem vindo a explorar várias possíveis soluções para aquele que é um problema que afeta milhões em todo o mundo. A premissa é sempre a mesma: este produto fará o seu cabelo crescer. Os resultados, no entanto, ficam frequentemente aquém desta promessa, com vários dermatologistas especializados a garantirem, inclusive, que a maioria dos produtos que se encontram atualmente no mercado não funcionam. “Existe uma variedade infinita de remédios inúteis para o crescimento do cabelo”, muitas vezes com “custo significativo”, realçou ao The New York Times Brett King, dermatologista da Escola de Medicina de Yale. Embora inúteis, estes produtos continuam a aparecer, nomeadamente “porque as pessoas estão desesperadas”, reforça.
Como se pode, então, combater a perda de cabelo? De acordo com vários dermatologistas, existe um tratamento que, além de barato, tem tido resultados muito promissores. Trata-se de um antigo medicamento para a pressão arterial elevada, minoxidil, que, embora já tenha sido utilizado contra a queda de cabelo, é agora administrado de forma diferente, oferecendo melhores resultados. Em vez de ser aplicado diretamente no couro cabeludo, como era no passado, este medicamente está agora a ser prescrito como comprimido oral de dose baixa. De acordo com o testemunho de Rodney Sinclair, professor de dermatologia da Universidade de Melbourne e o primeiro dermatologista a registar os resultados de minoxidil no crescimento de cabelo quando administrado via oral em vez de diretamente no couro cabeludo, ao The New York Times, já mais de 10 mil dos seus pacientes terão sido tratados com sucesso recorrendo a este novo método.
Acasos felizes
Minoxidil, o ingrediente ativo de Rogaine, uma loção ou espuma espalhada no couro cabeludo com o objetivo de estimular o crescimento de cabelo, foi aprovado pela primeira vez para homens em 1988 e para mulheres em 1992, sendo agora o tratamento genérico para esta condição nos EUA. A descoberta do uso desta substância como forma de prevenir a queda de cabelo foi um acaso: na década de 70, comprimidos com altas doses de minoxidil eram administrados com o intuito de tratar a pressão arterial elevada. Os pacientes, no entanto, eram frequentemente afetados por alguns efeitos secundários, entre eles o crescimento rápido e abundante de pelo em todo o corpo. O fabricante do medicamento viu aí uma oportunidade para o desenvolvimento de um novo medicamento: uma loção de minoxidil, eventualmente nomeada Rogaine, para o crescimento de cabelo.
Embora a dita loção tenha sido aprovada pela Food and Drug Administration (FDA), agência federal do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos Estados Unidos, vários dermatologistas defendem que não é eficaz em alguns pacientes. Podem existir duas razões para tal acontecer: ou o paciente parou de aplicar a loção por não ser prática ou as raízes capilares do paciente têm um constituição que não ajuda à absorção do minoxidil. No que toca à primeira, a aplicação deste medicamento no seu formato de loção implica esfregá-lo no couro cabeludo onde existe cabelo. As mulheres, por exemplo, costumam interromper o tratamento por não gostarem de deixar a substância pegajosa no cabelo. Por outro lado, existe também quem acredite que a loção não funciona de todo, o que pode ser verdade dependendo da presença ou não das referidas enzimas sulfotransferases, responsáveis por converterem o minoxidil num formato apropriado ao organismo. Isto porque, se não existirem em quantidades suficientes nas raízes do paciente, estas enzimas podem não converter de forma apropriada o minoxidil, levando a que esta substância não atue apropriadamente no couro cabeludo. Assim sendo, e uma vez que quando tomado via oral o minoxidil é automaticamente convertido para o seu formato ativo, este método pode ser mais eficaz.
Esta substância foi pela primeira vez utilizada como comprimido de consumo oral contra a queda de cabelo também resultado de um acaso: uma das pacientes de Sinclair que sofria de calvície, uma das poucas que terá utilizado a loção Rogain e terá visto resultados, sofreu, depois da aplicação do medicamento, uma reação alérgica no seu couro cabeludo, pelo que o médico foi forçado a interromper o tratamento. “A paciente estava muito motivada e a única coisa que sabíamos era que, se um paciente tem alergia a um medicamento aplicado topicamente, uma maneira de dessensibilizar é administrar doses muito baixas por via oral”., conta o dermatologista.
Foi assim que Sinclair experimentou pela primeira vez cortar cápsulas de minoxidil em quartos, descobrindo, com isso, que uma dose mais baixa da substância não só fez o cabelo da paciente crescer, como não afetou a sua pressão arterial, um dos principais receios do dermatologista em receitar um comprimido oral já que o propósito inicial da droga de dose mais alta era exatamente esse. Assim, Sinclair foi gradualmente reduzindo a quantidade até chegar a doses efetivas de um quadragésimo de um comprimido, começando a partir daí a prescrever rotineiramente a droga. A primeira paciente ainda toma o medicamento.
Numa reunião em Miami, no ano de 2015, Sinclair partilhou pela primeira vez a descoberta de que baixas doses de minoxidil tomadas via oral eram suficientes para estimular o crescimento do cabelo em 100 mulheres. Mais tarde, em 2017, o dermatologista publicou os resultados que ia registando, observando que eram necessários estudos rigorosos para ampliar o conhecimento deste medicamento e dos seus efeitos quando o mesmo era consumido via oral.
Uso “off-label”
Apesar das recomendações de Sinclair, nenhum estudo adicional foi realizado sobre o consumo oral de minoxidil no tratamento da queda de cabelo. Isto porque, sendo o minoxidil um medicamento tão barato, não existe incentivo para investir num estudo mais extenso. “O minoxidil oral custa centavos por dia”, explica King ao The New York Times. “Não há incentivo para gastar dezenas de milhões de dólares para testá-lo num ensaio clínico. Esse estudo nunca será realmente feito”, garante. Não sendo realizado um estudo mais extenso, o medicamento provavelmente nunca será aprovado pela FDA, permanecendo um droga de uso “off-label”, como é conhecida na língua inglesa, ou seja, que não segue as indicações homologadas deste fármaco concreto. Neste caso, em vez de aplicar a substância enquanto loção, como recomenda a FDA, o seu uso “off-label” é ingeri-la oralmente.
Esta prática de recomendação de medicamentos “off-label” tem-se tornado cada vez mais popular entre dermatologistas. “Eu chamo-nos de bandidos off-label, um título que tenho orgulho de ter”, conta ao The New York Times Adam Friedman, professor e presidente de dermatologia da Universidade George Washington. De acordo com Friedman, os dermatologistas são treinados para compreender como os medicamentos funcionam, o que lhes permite experimentar estes medicamentos “off-label”.
Segundo o testemunho de Robert Swerlick, professor e presidente do departamento de dermatologia da Emory University School of Medicine, ao mesmo órgão de comunicação, muitas condições dermatológicas são, inclusive, várias vezes tratadas recorrendo a tratamentos “off-label”.
Desde que o minoxidil foi utilizado pela primeira vez enquanto comprimido de consumo oral, a sua popularidade tem crescido significativamente e vários dermatologistas têm partilhado as suas histórias de sucesso. “Estamos apenas a começar a ver um aumento na popularidade”, relata também ao The New York Times Crystal Aguh, dermatologista da Johns Hopkins School of Medicine. “Cada vez mais em conferências, estamos a partilhar as nossas histórias de sucesso”.
Há exceções
Apesar dos muitos casos de sucesso e das múltiplas recomendações de vários dermatologistas, a substância minoxidil também tem as suas limitações no que toca ao tratamento da queda de cabelo. De acordo com Aguh, se a perda de cabelo for muito grave, inclusive calvície completa, o minoxidil não será a solução. “Não vai funcionar, por exemplo, se um homem for quase careca, com o couro cabeludo brilhante. Não há nada para restaurar”, explicou. O paciente ideal não é completamente careca, mas perdeu cabelo suficiente para até um observador casual notar, salienta.
Outro aspeto importante a ter em conta é o possível crescimento de pelo em outras regiões do corpo. Alguns pacientes que tomam minoxidil em baixas doses notam um crescimento de pelo nos seus rostos e queixos. Por isso mesmo, alguns dermatologistas, incluindo Sinclair, administram outros medicamentos ao tratamento, como doses reduzidas de espironolactona, um fármaco desenvolvido também para a pressão arterial e que ajuda a bloquear certas hormonas sexuais conhecidas por andrógenos, numa tentativa de impedir o crescimento indesejado de pelos em outras regiões do corpo.