Por enquanto, o que se tem passado no Centro Materno-Infantil do Norte não se estende à generalidade do País, mas é um exemplo que alerta para situações futuras. “Desde há 15 dias que temos tido uma afluência acrescida de doença aguda nos serviços de urgência, com destaque para os casos de Influenza”, disse Alberto Caldas Afonso, diretor do Centro Materno-Infantil do Norte, à CNN Portugal. No entanto, “não tenho crianças internadas com necessidade de cuidados intensivos. É muito pontual, tal como já acontecia antes”, explica o médico. “Só estamos a testar aqueles que têm critérios de internamento e, de facto, temos um número muito significativo de casos de gripe A comparativamente ao que tínhamos até aqui. E temos suspeita de que seja gripe A em muitas outras crianças, mas como não têm critério de internamento, não é feita a pesquisa virológica”, acrescenta o professor catedrático da Universidade do Porto.
Com a gripe em tendência crescente, a previsão de Alberto Caldas Afonso é que um eventual pico de gripe possa chegar só nas próximas semanas, sobretudo entre a população mais jovem.
O que se compreende, se pensarmos que é entre os jovens que aumentou a socialização, e nas crianças também diminuiu o distanciamento físico nas escolas e a partilha de objetos. “Pela socialização, pela diminuição das medidas de intervenção não farmacológica e por estarem menos vacinados”, justifica Filipe Froes, pneumologista do Hospital Pulido Valente. “As pessoas de maior risco que habitualmente têm mais gripe e têm uma maior taxa de cobertura vacinal [estando já vacinadas mais de 2,5 milhões de pessoas], mantêm as medidas que as protegem, como é o caso da máscara, etiqueta respiratória, higienização das mãos e distanciamento social. Vamos encontrar mais gripe nas pessoas que utilizam menos as proteções, como seria de esperar.”
O último boletim de vigilância da gripe do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), referente à semana de 14 a 20 de março (semana 11), indica que a taxa de incidência de infeção respiratória aguda caiu, fixando-se em 28,4 por 100 mil habitantes. A Rede Portuguesa de Laboratórios para o Diagnóstico da Gripe (Hospitais) detetou 534 casos positivos para o vírus da gripe, dos quais 532 do tipo A e dois do tipo B. Em 50 dos casos foi identificado o subtipo A(H3) e num dos casos o subtipo A(H1).
Antes, na semana de 7 a 13 de março foram detetados menos 87 casos positivos para o vírus da gripe, 447 no total, dos quais 398 do tipo A, oito do tipo B e 41 não tipados. A taxa de incidência de síndrome gripal nessa semana chegou a 43,5 por 100 mil habitantes, igual à taxa de incidência de infeção respiratória aguda.
Até ao momento foram identificados 48 casos de co-infeção pelo vírus da gripe e SARS-CoV-2, segundo o documento divulgado pelo INSA.
Se não contarmos com 2021, ano em que houve uma quase ausência de gripe devido ao confinamento geral, o número total de casos de gripe na semana homóloga de 2020 foi bastante superior. O boletim do INSA, da semana 9 de 2020, dava conta de 4 081 casos de gripe, sendo 2 507 do tipo A. Nessa semana de há dois anos, foram registados 161 casos de gripe (158 do tipo A). A incidência era de 33,08 por cada 100 mil habitantes.
É o subtipo H3N2 (bastante mais agressivo nos idosos) do tipo A que está a circular de forma predominante. “A gripe A é um tipo de gripe – há o A, o B e o C. Dentro do A, temos o subtipo que é mais predominante que é o H3N2, mas também há o H1N1, responsável pela pandemia decretada em 2009 e mais agressivo nos jovens. Mas, tudo isto são modelos conceptuais. Temos de tratar todos da mesma maneira e esperar que possa haver doença grave em qualquer grupo etário”, sublinha Filipe Froes.
Este inverno, os casos de gripe não são mais graves. Segundo o pneumologista, “não temos tido tradução de gravidade porque a quem aparece a gripe são pessoas mais jovens, sem comorbilidades e habitualmente a gripe dessas pessoas não costuma ter grande expressão de gravidade, no entanto, pode acontecer mas de forma mais esporádica. As pessoas mais vulneráveis à gripe, tal como as pessoas mais vulneráveis à Covid-19, estão mais protegidas, mantêm mais medidas de proteção e por isso são menos afetadas, não se encontrando correspondente de gravidade a nível hospitalar.”
Ainda sem existirem testes específicos para detetar a gripe, que possam ser feitos nas farmácias, de modo mais prático, os sintomas podem gerar confusão com os da Covid-19.
“Não existe especificidade sintomática entre a gripe e a Covid-19 e, na dúvida, as pessoas têm de ser testadas”, esclarece Filipe Froes. “Não há dados do ponto de vista clínico que permitam distinguir o quadro clínico da Covid-19 do da gripe. Uma realidade que acontece com muitas outras doenças, porque vai afetar as vias aéreas e as queixas são iguais, independentemente, do microrganismo responsável pela doença. As nossas células reagem da mesma maneira seja o vírus Influenza, sejam os coronavírus. Reagimos com febre, obstrução nasal, tosse e dores musculares.”