A hipótese já tinha sido colocada antes da pandemia de Covid-19, mas agora está a ganhar nova importância. Um pouco por todo o mundo, investigadores de mais de dez institutos de investigação – na Europa, Austrália e nos EUA, com o apoio dos Institutos Nacionais da Saúde (National Institutes of Health) – estão a colocar a hipótese de se criarem vacinas transmissíveis injetadas ou até inaladas, que permitam a propagação de pessoa para pessoa e que possam preparar o sistema imunológico para produzir anticorpos que combatam a infeção para a eliminação total de um vírus, depois de terminada a pandemia de Covid-19.
O objetivo é administrar essas vacinas a pequenos grupos de pessoas de diferentes regiões, que possam transmiti-las dentro da sua comunidade, em vez de serem administradas vacinas em cada pessoa. O resto da população seria “infetado com a vacina” a partir do contacto próximo com outras pessoas. Esta solução pode fazer com deixe de ser necessário produzir uma quantidade tão grande de vacinas para combater vírus e bactérias.
Para isso, os cientistas têm de arranjar uma forma de acondicionar precisamente os vírus ou bactérias, que possam ser facilmente transmitidos de uma pessoa para a outra, mas sem provocar doenças graves. Até agora, as investigações realizadas para a criação de vacinas “autopropagáveis” têm tido em conta a disseminação de animal para animal ou de animal para humano.
Os cientistas estão a testar duas opções: a primeira consiste em projetar em laboratório uma forma muito leve de um vírus, contagioso o suficiente para infetar de forma rápida muitas pessoas, mas não ao ponto de criar formas graves da doença. A segunda opção é incorporar parte do ADN de um novo agente patogénico perigoso dentro de um vírus relativamente inofensivo, contudo, muito transmissível. Expor a população a esse ADN pode fazer com que o sistema imunológico se prepare para lidar com o agente patogénico, sem provocar uma doença grave.
Investigações em curso
De acordo com o The Guardian, uma das pesquisas mais avançadas neste sentido foi financiada pela Agência de Projetos de Pesquisa Avançada de Defesa dos EUA, nome em português, e pretende encontrar uma solução de proteção dos militares norte-americanos que estão em serviço na África Ocidental contra a febre de Lassa, provocada pelo vírus de Lassa, sendo que a infeção nos humanos ocorre pela exposição a excrementos de animais através das vias respiratórias ou área gastrointestinal.
Também uma equipa internacional de investigadores está a trabalhar numa vacina deste tipo que pretende impedir que um vírus seja transmitido de ratos para humanos.
Um documento publicado em 2019 pelo Department of Health and Social Care do Reino Unido dá conta de que a taxa de mortalidade quando se liberta para população um vírus de gripe vivo, mas enfraquecido, é de cerca de 0,4%, quatro mortes por cada mil pessoas infetadas com a vacina. Já o número de mortes ocorridas devido a uma pandemia de gripe seria seis vezes maior, de acordo com o mesmo documento.
Contudo, seguindo um projeto deste tipo, sabe-se que as mortes vão acontecer, embora sejam, à partida, menos frequentes, alerta o mesmo documento. Existe, também, o problema do consentimento, já que uma vacina deste tipo não seria autorizada pela maioria das pessoas, só por aquelas que a quem fosse administrada a vacina. As investigações terão de continuar de forma intensiva para se perceber, de facto, o potencial deste tipo de vacinas, e se funcionariam de forma segura.