Ter uma boa saúde mental é um ingrediente imprescindível para que possamos apreciar e usufruir plenamente a nossa vida. Deste fator depende a nossa capacidade de pensar e sentir livremente, de nos relacionarmos com os outros, de amar sem restrições, de tirar prazer da nossa profissão ou de tomar decisões de forma autónoma.
No entanto, estima-se que uma em cada quatro pessoas desenvolva uma perturbação mental ao longo da sua vida. Uma grande percentagem destas são quadros ansiosos ou depressivos, cuja incidência tem vindo a aumentar, de modo substancial, nestes últimos dois anos de pandemia.
A nível global, cinco das dez principais causas de incapacidade e morte prematura são doenças psiquiátricas. Em 2030, a depressão irá ser a principal causa de incapacidade e morte prematura. O suicídio, que é a segunda principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos está, na maioria das vezes, associado a perturbações depressivas não tratadas.
Apesar de muitas vezes consideradas como casos de doença mental “não severa”- pois, na sua generalidade, são tratáveis e a recuperação é perfeitamente viável -, as perturbações ansiosas e depressivas podem ter repercussões marcadas em aspetos fundamentais do o nosso bem-estar, tais como: a capacidade de se sentir bem consigo próprio; a capacidade de trabalhar ou de estudar; a maneira como se relaciona com amigos, companheiros, familiares ou colegas.
Não há saúde sem saúde mental. O nosso cérebro não está magicamente separado do resto do corpo. Quando a mente sofre, o corpo sofre, e o contrário também é verdade. Se por um lado, ter sintomas depressivos ou ansiosos pode ser uma manifestação de um outro problema de saúde “físico” (e daí a importância de um diagnóstico cuidado), por outro, está comprovado que quando sofremos de uma doença mental, vários sistemas do nosso corpo entram em desequilíbrio. Estão descritas na literatura científica várias associações entre doença mental e, por exemplo, doenças cardiovasculares, doenças autoimunes, cancro ou diabetes. Reconhecer e tratar eficazmente a ansiedade e a depressão é algo tão vital para a nossa saúde que pode até ter um impacto positivo na nossa esperança de vida.
Então porque é que se fala tão pouco sobre saúde mental? Porque é que vemos tantas campanhas sobre outras doenças (lembre-se do último outdoor que viu sobre doença cardiovascular ou o último panfleto que recebeu na farmácia sobre a diabetes) e tão poucas sobre ansiedade ou depressão? A resposta, a meu ver, é simples: medo e desconhecimento.
Existe uma falta de literacia, generalizada, acerca dos temas da saúde e da doença mental. Esta ignorância promove o crescimento de vários preconceitos e ideias erradas, o que tem consequências muito graves. Leva a que as pessoas não peçam ajuda quando necessário, com o consequente agravar da situação. Leva a que quem esteja a passar por uma depressão, tenha vergonha de falar sobre o assunto e se sinta inferior aos demais. Leva a que um jovem com uma perturbação de ansiedade tenha dificuldades escolares, e veja o seu futuro limitado, porque os pais e os professores não reconhecem a situação. Leva a que um profissional de sucesso entre numa baixa prolongada por ter sintomas físicos de uma doença mental que passa despercebida. Leva a que seja muito difícil ir a um psiquiatra, a um psicólogo ou psicoterapeuta, porque “são os médicos dos malucos”. Leva a que a pessoa com ansiedade ou depressão se isole, se sinta impotente perante a sua situação, que perca a esperança e, em casos extremos, contemple o suicídio.
São estas as situações, infelizmente demasiado frequentes, que queremos evitar a todo o custo. Para isso, é preciso mudar a maneira de ver a saúde e doença mental. Falar de forma aberta e sincera das alturas em que “não está tudo bem”. Acabar com os mitos, preconceitos e estigma que rodeiam este assunto. E todos podemos ter um papel nisto!
Acredito que informar, alertar e desmistificar, pode mudar a atitude das pessoas face à doença mental. E isso pode ser uma grande ajuda para todos: doentes, profissionais, famílias e amigos. Aprender a cuidar da mente, tal como cuidamos do físico, é imprescindível para uma vida com melhor qualidade, mais feliz, mais criativa e mais serena.