Imagine acordar, todos os dias, até ao fim da sua vida, com as articulações tão rígidas que precisaria de, pelo menos, uma hora para se conseguir levantar da cama. É o que acontece com os doentes que sofrem de artrite reumatóide, a doença inflamatória crónica articular mais frequente em todo o mundo. “Até ao aparecimento, na década de 80, do metotrexato (MTX) e dos biotecnológicos, estes já no princípio do século XXI, 50% dos doentes ficavam incapacitados definitivamente para o trabalho após 10 anos de artrite reumatoide”, explica à VISÃO António Vilar, Reumatologista e presidente da Sociedade Portuguesa de Reumatologia.
Esta doença, que afeta jovens a partir dos 18 anos, manifestando-se, principalmente, entre os 30 e os 50 anos, tem um impacto devastador na qualidade de vida dos doentes, tanto a nível do sofrimento físico, como também profissional, com diminuição da produtividade, mas também redução da expectativa de vida, “que fica também diminuída entre 3 a 10 anos”, refere o médico.
Marina Correia, de 45 anos, sofre de atrite reumatoide há mais de 20 e conta à VISÃO que o impacto desta doença na sua vida é “brutal”. “Muitos dos sintomas nunca desaparecem e podem ser verdadeiramente incapacitantes, como a fadiga constante, a rigidez matinal, que é o meu sintoma mais notório, e complicações alérgicas e oftalmológicas, por exemplo”, acrescenta. Marina, que tinha pouco mais de 20 anos na altura em que descobriu que sofria da condição, acordou, um dia, com uma dor intensa na cervical, que foi atenuada com analgésicos mas que reapareceu dias depois, nos joelhos e mãos. Essa dor foi-se tornando difusa e não desaparecia com analgésicos ou inflamatórios. O diagnóstico, que, de acordo com Marina, devia ter sido mais precoce, chegou meses depois, após muitas análises e medicação.
De facto, segundo António Vilar, o rápido diagnóstico desta doença, assim como a ação dos doentes no momento em que começam a sentir alguma dor, são essencias. “Não se deve esperar que uma dor ou inchaço de uma articulação passe, é importante consultar o médico se ela durar mais de três ou quatro dias e recorrer a um especialista se persistir por mais de 3 ou 4 semanas”, explica o médico. Fazer um diagnóstico atempadamente torna-se ainda mais importante porque os marcadores mais específicos da doença são habitualmente negativos nos seus primeiros seis meses e podem mesmo ser sempre negativos, em quase 30 % dos casos, afirma o especialista.
Marina iniciou um tratamento com corticoides, que “teve obviamente efeitos secundários e foi sem dúvida uma época muito complicada”. Com o passar do tempo e com a doença a não responder à medicação, conta, acabou por ficar com uma lesão permanente na mão direita. Como a sua doença era muito resistente à medicação “tradicional”, começou, seguida por António Vilar, um tratamento com medicamentos biológicos, hoje já muito comuns.
“A gravidez é, de facto, uma época muito favorável para quem tem atrite reumatoide”
“A fase dos medicamentos biológicos foi muito positiva, porque reagi bem, a doença “acalmou” e não tive efeitos secundários, o que me levou a ter mais esperança”, conta Marina Correia. Depois disso, decidiu ter filhos. “A gravidez é, de facto, uma época muito favorável para quem tem artrite reumatoide, porque apesar de não poder fazer os medicmantos biológicos, estive assintomática”, explica, referindo ter suspeitado da sua segunda gravidez porque os sintomas da doença desapareceram. “Como amamentei o meu segundo filho até aos três anos, apenas cinco anos depois desta gravidez reiniciei os biológicos”, explica.
Neste momento, não está a fazer o tratasmento com medicamentos biológicos desde o início de 2019, devido a uma síndrome nefrótica. “Apesar de não estar provada a ligação, esta medicação foi interrompida por segurança e, até agora, tenho estado controlada e mais focada na resolução deste problema renal”, conta.
“Costumo citar Winston Chuchill, que dizia que “nenhuma outra doença faz sofrer tanto, durante tanto tempo, tanta gente””, acrescenta, ainda, o médico. “E, por isso, ouvir o doente e os seus sintomas, as características e duração das mesmas, a localização das queixas, o horário e calendário delas, a resposta ao repouso e a medidas simples como o frio ou calor, são muitos importantes para orientar o diagnóstico atempadamente”, conclui António Vilar.