A variante Delta evoluiu e ganhou uma nova mutação. À E484Q, causadora de uma evasão aos anticorpos, e à L452R, responsável por uma maior transmissibilidade, juntou-se agora a K417N, que aumenta a capacidade de evasão do vírus aos anticorpos neutralizantes.
Esta espécie de versão “evoluída” da variante Delta foi apelidada de Delta plus e considerada, esta terça feira, pelo Ministério da Saúde Indiano, variante de preocupação, com mais de 20 casos já detetados no país. Segundo a imprensa local, a variante já se encontra em nove países, entre eles Portugal.
À VISÃO, Miguel Prudêncio e Luís Graça, respetivamente investigador principal e imunologista do Instituto de Medicina Molecular (iMM) confirmaram que a Delta Plus é a variante que ficou conhecida em Portugal como “mutação nepalesa”, quando o nosso país foi afatsado da “lista verde” do Reino Unido.
Ao jornal Público, o investigador João Paulo Gomes do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA) afirmou que “não está a ter disseminação relevante nem no Reino Unido nem em Portugal” e que, das últimas amostras sequenciadas pelo INSA, “apenas 3% tinham essa mutação adicional”.
Diminui a eficácia dos anticorpos neutralizantes…
Acredita-se que a Delta Plus, pela presença da mutação K417N, tenha uma maior capacidade de evadir os anticorpos neutralizantes. É que esta mutação não é nova nem desconhecida. Já tinha aparecido na variante Beta (África do Sul) e sabe-se que “está numa região importante da proteína spike do vírus, que se liga ao recetor das células humanas”, explica o epidemiologista Manuel Carmo Gomes .
A preocupação, segundo Miguel Prudêncio, prende-se com a combinação que a Delta Plus faz da transmissibilidade da variante Delta, “que é maior do que a da Alpha”, com a mutação K417N, “responsável pelos anticorpos neutralizantes espoletados pelas vacinas serem um pouco menos eficazes”.
Ainda assim, o investigador explica que “num sistema vacinal completo há um excesso de anticorpos tão grande que, mesmo havendo um decréscimo nessa quantidade, ela continua a estar acima do mínimo necessário para proteger”.
É claro que há algum receio que exista uma perda de eficácia das vacinas contra esta variante, mas os dados existentes indicam que “a perda de eficácia registada nos anticorpos neutralizantes não provoca uma perda importante na eficácia propriamente dita da vacina”, defende Miguel Prudêncio.
…mas não aumenta risco de doença grave
Apesar de a K417N ajudar o vírus a evadir-se dos anticorpos gerados pelas vacinas ou por outras variantes anteriores “e, nesse sentido, causar alguma preocupação”, Manuel Carmo Gomes não acredita que esta seja capaz de aumentar transmissibilidade do vírus ou a probabilidade de os infetados desenvolverem doença grave.
A razão pela qual, apesar de proporcionar uma maior evasão do vírus aos anticorpos, a mutação não aumenta o risco de doença grave é que “a proteção contra doença grave é feita através de imunidade celular”, conferida pelas células de memória T e os linfócitos B, “que olham para o vírus como um todo e não apenas para uma região específica onde há uma mutação”, explica o epidemiologista.
Carmo Gomes afirma ainda que o processo das variantes adquirirem novas mutações é algo natural. “A variante da Índia surgiu por causa de outras mutações, que não são esta, e agora está a multiplicar-se e adquiriu essa nova mutação também. Já tínhamos assistido a isto com a variante britânica que, quando apareceu, não tinha uma das mutações da África do Sul (E484K) e depois surgiu com essa mutação”.
Da Índia para o Mundo
Segundo o Secretário de Estado da Saúde indiano, Rajesh Bhushan, citado pelo Hindustan Times, a variante Delta Plus já foi encontrada nos Estados Unidos, Reino Unido, Suíça, Japão, Polónia, Nepal, China, Rússia e Portugal.
No nosso país, de acordo com a base de dados pública GISAID, existirão neste momento 20 casos identificados com esta mutação.
Quanto à variante Delta original (B.1.617.2), 60% mais transmissível que a Alpha (B.1.1.7), os últimos resultados preliminares das sequências já analisadas pelo INSA no mês de junho, no âmbito do estudo sobre a diversidade genética do SARS-CoV-2 em Portugal, davam conta de uma prevalência da variante superior a 60% na zona de Lisboa e Vale do Tejo e de 15% no Norte. Os valores foram atualizados para 70% e 20%, esta terça-feira, pelo investigador João Paulo Gomes, em entrevista à RTP.
Os dados recolhidos por uma aplicação britânica de rastreio de sintomas da Covid-19 parecem ainda indicar que os sintomas associados à variante Delta, mais do que a perda de olfato e paladar, são agora as dores de cabeça, o pingo no nariz e as dores de garganta.