No final de dezembro, os cientistas da Califórnia, na costa oeste dos EUA, começaram a analisar amostras de coronavírus, em busca de uma nova variante de rápida propagação, que tinha acabado de ser identificada no Reino Unido. Encontraram-na, embora em relativamente poucas amostras. E durante o processo fizeram outra descoberta indesejável: a Califórnia tinha produzido uma variante própria.
“Foi onde encontrou oportunidade de se multiplicar”, explica Jasmine Plummer, investigadora do Centro Médico Cedars-Sinai, de Los Angeles, que trabalhou no novo estudo, citada pelo The New York Times. Eric Vail, diretor de patologia molecular do Cedars-Sinai, sublinha que é possível que esta nova variante esteja a desempenhar um papel importante no dramático aumento de casos na região, depois de uma série de eventos considerados super disseminadores. “Podemos estar perante uma estirpe mais infecciosa do que a dominante aqui até agora”, considera.
O caso está não só a merecer a atenção dos colegas – Charles Chiu, virologista da Universidade da Califórnia, em São Francisco, também já assumiu ao The Washington Post que “há razões para preocupações”, já que estão a encontrar a variante em cerca de um terço das amostras a serem sequenciadas” – como também do Centro de Controlo de Doenças dos EUA, que já está a colaborar com a investigação em curso.
“Mais que tudo, comprova a importância de haver um programa de vigilância genómica, porque se trata de uma variante que cá não prevaleceu, e foi por isso desvalorizada, mas agora encontrou a oportunidade para se impor”, sinaliza Pedro Simas, virologista do Instituto de Medicina Molecular, insistindo ainda que, neste caso, “dificilmente fará o percurso inverso” de forma a provocar mossa na Europa.
O 3º estado americano com mais de 25 mil mortos
A variante em causa, conhecida como CAL.20, diferencia-se das outras em circulação por causa da mutação L452R, que tinha sido inicialmente identificada no verão, na Dinamarca, e permanecera de baixo perfil até novembro, altura em que começou a espalhar-se muito rapidamente. “Tinha uma prevalência da ordem dos 3 por cento e passou para valores na casa dos 20 por cento”, precisa Henrique Lopes, professor de Saúde Pública da Universidade Católica e membro do conselho superior da Associação de Escolas de Saúde Pública da Região Europeia.
Os mais recentes números da Covid-19 na região também não permitem baixar a guarda: ao mesmo tempo que se sucediam surtos de grandes dimensões em lares de idosos, prisões e até num hospital, faltavam camas para cuidados intensivos e oxigénio – e as funerárias assumiam que não estavam a conseguir responder aos pedidos. Isto depois de, no final de 2020, a Califórnia se ter tornado o terceiro estado americano a passar a barreira dos 25 mil mortos, desde o início da pandemia.