Para prever como os movimentos das pessoas podem afetar a transmissão viral, o que os investigadores fizeram foi introduzir dados de localização a partir de uma aplicação móvel (de forma anónima) num modelo epidemiológico que estima a rapidez com que a doença se propaga.
Recolhida pela SafeGraph, empresa americana sediada em Denver, essa informação dizia respeito a 10 das maiores cidades americanas – como Chicago, Nova Iorque ou e Filadélfia. A app permitiu mapear o trajeto feito por pessoas em mais de 55 mil bairros para vários pontos de interesse – como restaurantes, igrejas, hotéis, ginásios… – durante dois meses. Quando se comparou o número de infeções encontrado pelo modelo com os dados oficialmente registados nos mesmo locais, descobriu-se que o modelo tinha previsto com precisão os números de casos confirmados. “Percebemos que nos permite estimar fielmente a rede de contactos entre cerca de 100 milhões de pessoas a cada hora do dia”, assume Jure Leskovec, investigador da área da computação, professor associado da Universidade de Standford, e um dos responsáveis pelo modelo.
Mas a equipa fez mais – e utilizou então o modelo para simular os acontecimentos em diferentes cenários, em que por exemplo se permita a reabertura de alguns locais, sem que outros tenham as portas abertas. E descobriram que foi a permissão de os restaurantes manterem a lotação plena, nos EUA, que levou ao maior aumento de infeções – seguidos de outros espaços fechados com a mesma prática, como ginásios, cafés ou hotéis.
O modelo, publicado agora na Nature, “tem indicações concretas sobre o que podem ser medidas rentáveis para conter a propagação da doença, ao mesmo tempo que limita os danos para a economia”, considera Thiemo Fetzer, economista da Universidade de Warwick em Coventry, antes de sublinhar: “seria a política ideal”.
O que aquele modelo diz, por exemplo em relação à cidade de Chicago, é que se os restaurantes tivessem aberto todos as portas ao mesmo tempo, em maio, isso teria provocado quase 600 mil infeções adicionais. Se todo o comércio e serviços em espaços fechados lhes tivessem seguido os passos, seriam outros 3,3 milhões de casos a mais. Já a redução da lotação desses mesmos locais a 30% permitiria reduzir o número de infeções para 1,1 milhões – e se fosse limitada aos 20%, os contágios teriam baixado ainda mais, até aos 650 mil.
Em termos gerais, considerou ainda Fetzer, o modelo corrobora muito do que foi aprendido com os estudos de rastreio de contactos em todo o mundo, que identificaram recintos fechados de grande lotação como locais promotores de megaeventos de contágios, ou seja, onde muitas pessoas são infetadas ao mesmo tempo. Tal e qual revelou o relatório de avaliação do programa do governo britânico chamado Eat Out to Help Out, criado para subsidiar refeições fora de casa durante o mês de agosto para ajudar os restaurantes, mas que acabou ser responsável por cerca de 17% das novas infeções durante o tempo em que esteve a funcionar.
Em outros locais, até pode não ter sido assim – a fazer fé no que relatam, por exemplo, os dados de rastreio de contactos na Alemanha. Mas isso, acreditam os investigadores, pode ser apenas devido a uma margem de erro que não esteja a permitir identificar corretamente a localização real das infeções. Como assinala ainda Neil Fergunson, um epidemiologista do Imperial College, no Reino Unido, citado pela Natue, “se conseguíssemos prever com precisão o risco de visitar locais específicos, isso permitiria indicar onde e a que momento a distância social é mais necessária”.