Afinal, ao contrário do que os últimos estudos concluíram, pessoas do grupo sanguíneo O têm mesmo menor risco de contraírem Covid-19 e desenvolverem sintomas graves. No início da pandemia, foram realizadas investigações que alertavam para a possibilidade de o tipo de sangue, neste caso o A, poder aumentar a vulnerabilidade à infeção pelo SARS-CoV-2.
Em março, um grupo de investigadores do Hospital Zhongnan, da Universidade de Wuhan, na China, comparou grupos sanguíneos de mais de dois mil infetados internados em hospitais da China, com grupos sanguíneos de mais de 27 mil habitantes de Wuhan e Shenzhen. A investigação concluiu que o tipo sanguíneo A era o mais comum e o tipo O o menos comum em doentes infetados, relativamente à população em geral. Contudo, os cientistas alertaram para a necessidade de se realizarem mais estudos que corroborassem esta possível relação, devido à escassez de evidências até então.
Já em junho, uma outra investigação publicada no The New England Journal of Medicine concluiu, também, que não só o grupo sanguíneo como outros fatores genéticos podem influenciar a gravidade da infeção pelo SARS-CoV-2. Os investigadores deram conta de que as pessoas do grupo sanguíneo A teriam 45% mais probabilidade de serem infetadas e desenvolverem sintomas graves do que a população com outros grupos sanguíneos. Pelo contrário, quem pertence ao grupo O teria um risco menor, assim concluiu a equipa.
Em julho, estas informações foram contrapostas com estudos que indicavam não haver evidência de que o tipo sanguíneo dos doentes influenciava a gravidade da infeção. Investigadores do Massachusetts General Hospital e do Columbia Presbyterian Hospital, nos EUA, analisaram milhares de doentes com Covid-19 e deram conta de que o sangue tipo A não aumenta a suscetibilidade ao vírus, admitindo, apenas, uma pequena menor probabilidade de se ser infetado quando se pertence ao tipo sanguíneo O.
A roda volta a girar
Agora, dois novos estudos, publicados esta quarta-feira, voltam a evidenciar o menor risco de infeção pelo coronavírus em pessoas que pertencem ao grupo sanguíneo O, assim como uma menor severidade dos sintomas associados à doença em pessoas deste tipo de sangue.
A primeira investigação, desenvolvida por uma equipa dinamarquesa, analisou mais de 7 mil pessoas que testaram positivo para a Covid-19 e, desse número, apenas 38,4% pertencia ao tipo O. Pelo contrário, 44,4% das pessoas analisadas eram do grupo sanguíneo A, sendo que a percentagem desse tipo de sangue no total da população dinamarquesa é de 42,4%.
Investigadores do Canadá também estudaram esta relação e descobriram que, de 95 doentes com sintomas graves da doença, 84% dos que pertenciam aos grupos sanguíneos A ou AB tiveram de receber ventilação mecânica. Relativamente aos infetados dos tipos O ou B, essa percentagem foi de 61%.
Além disso, as pessoas dos tipos A ou AB ficaram, em média, mais dias nos cuidados intensivos relativamente aos doentes dos grupos O ou B.
Apesar destes novos resultados, os especialistas alertam para a necessidade de se realizarem muitos mais estudos que comprovem esta ligação. À CNN, Torben Barington, um dos autores do estudo realizado na Dinamarca e professor no Odense University Hospital e na University of Southern Denmark, explica que não vale a pena haver preocupações relativamente à possível ligação entre o tipo de sangue e a Covid-19. “Acho que esta descoberta tem interesse científico e, quando descobrirmos porque é que isto acontece, talvez sejamos capazes de agir proativamente de alguma forma em relação ao tratamento”, esclarece.
Existem várias teorias apontadas pelos autores dos estudos que tentam explicar esta ligação, sendo que uma delas pode ser o facto de as pessoas que pertencem grupo sanguíneo O terem menos fator de coagulação, tornando-as, assim, menos vulneráveis a problemas de coagulação no sangue, um dos mais graves associados à Covid-19. Outra ideia apontada pelos cientistas tem a ver com os antígenos de cada grupo sanguíneo, substâncias estranhas ao organismo que desencadeiam a produção de anticorpos, e com a forma como eles afetam essa mesma produção, com o objetivo de se combater a infeção.
Os genes relacionados com os diferentes tipos sanguíneos e os seus efeitos nos recetores do sistema imunológico também tem sido uma das justificações apontadas pelos investigadores.
É importante referir que os tipos de sangue em causa nos estudos são dos mais comuns, no geral. Em Portugal, por exemplo, o grupo sanguíneo mais vulgar é o A+, seguindo-se o O+. Na Dinamarca, acontece o mesmo e no Canadá o tipo O+ é o mais comum, sendo o A+ o segundo mais frequente.