Quando a nossa Diretora Geral de Saúde nos sugeriu a todos que recorrêssemos à horta de um amigo para nos fornecer viveres, a nossa total incapacidade para lidar com o surto, agora pandemia, COVID-19, ficou exposta para toda a gente ver. Enfim, como diz a minha mulher que é psicóloga e que tem uma espécie de sexto sentido para estas coisas (aquilo que agora chamamos de inteligência emocional), “cada um faz o melhor que pode com os recursos que tem”. E que recursos temos, ou não, para fazer face a esta pandemia? Comecemos pelo que não temos, sem ser exaustivo:
1- Não temos vacina, nem iremos ter a tempo de enfrentar esta pandemia;
2- Não temos material de proteção individual suficiente;
3- Não temos camas de cuidados intensivos, nem ventiladores suficientes;
4- Não temos um plano, limitamo-nos a reagir aos acontecimentos;
5- Não sabemos como a situação irá evoluir;
Face à incerteza, a (boa) informação torna-se critica e tomar decisões informadas e rápidas é vital. Concretamente, o que fizemos que podiamos ter feito? Fechamos escolas e universidades (só aconteceu há dois dias!…e contra as recomendações da nossa DGS que mais uma vez nos mandou à horta…), porventura uma das medidas não farmacológicas de maior impacto, não só por reter as crianças e jovens (importantes vetores na transmissão da COVID-19) em casa, mas também por forçar os pais ao isolamento social. Deixar as crianças com os avós não é solução para este problema, pelo contrário, só o agravará, porque juntamos os fatores de risco com o risco em si.
É tempo de chamar a ciência e o conhecimento para decidir. Até os mais céticos e responsáveis por cortes sucessivos no orçamento da ciência (os Trump deste planeta) procuram agora respostas na ciência.
Todos percebem agora a importância da vacinação no controlo de doenças que podemos controlar. Ainda assim, sem qualquer explicação possível, a não ser o gostinho especial de ser do contra, o governo britânico, o mesmo do Brexit, decidiu seguir um rumo diferente do resto do mundo. Business as usual, como se diz por lá, ignorando os factos e acontecimentos que vamos podendo testemunhar vindos da China, em Itália, na França, Alemanha e agora em Espanha, mesmo aqui ao lado, de saturação da capacidade de resposta dos nossos sistemas de saúde. Ainda na passada segunda-feira, foi tornado público um estudo de um grupo de trabalho do Imperial College em Londres que aponta claramente que a política que estava a ser seguida resultaria numa procura oito vezes superior à oferta do número de camas disponíveis em cuidados intensivos e custaria 250 mil mortes (a sua maioria pessoas acima dos 70-80 anos – os nossos pais ou os nossos avós, para quem ainda os tenha) à custa da COVID-19, só no Reino Unido, e mais de 1 milhão se uma estratégia semelhante fosse seguida pelos EUA, como parecia estar a acontecer (veja com atenção Sr. Prof. Pedro Simas e deixe de dizer disparates publicamente).
O mesmo estudo é inequívoco: somente a supressão efetiva da propagação da COVID-19 poderá salvar vidas. E como se consegue isso? O fecho de escolas e universidades só nos dá tempo, mas não evitará um pico quase tão grande como o que seria se não tivéssemos feito nada, uma ou duas semanas mais tarde.
O que podemos então fazer com os recursos que temos, AGORA?
1- Isolamento de casos confirmados pelo menos sete dias;
2- Distanciamento social de toda a população e não só nos grupos de risco como defendia o modelo britânico;
3- Quarentena (efetiva!) em casa durante 14 dias para as pessoas sem COVID-19 ou sem sintomas, mantendo-se sempre que possível a trabalhar a partir de casa (há que pensar na Economia!).
4- Manter escolas e universidades fechadas.
Curiosamente, o fecho de fronteiras aéreas e terrestres (também declarado ontem e anteontem pelo Governo) e a proibição de viajar, parecem ter somente um impacto modesto na supressão da propagação da COVID-19.
Qual o maior problema disto tudo?
Estas medidas só terão o efeito de supressão se aplicadas continuadamente ao longo de vários meses (pelo menos cinco meses, segundo o estudo do Imperial College e poderá ter que ser prolongada até que uma vacina fique disponível), assumindo que a epidemiologia da propagação da COVID-19 não se irá alterar nos próximos tempos, o que pode e todos esperamos não vir a acontecer.
Sr. António Costa, estamos preparados para a guerra? Qual é o seu plano? Qual é o plano que tem para o País nestas circunstâncias? Quem viu na segunda-feira como eu vi, em direto, o presidente Macron a anunciar medidas extraordinárias de apoio à Economia e declarar aos franceses, repetidamente, que estamos em estado de guerra, franceses que estão hoje como nós estaremos daqui por duas/três semanas?
A crise do subprime em 2008, que tantas marcas deixou no nosso País e no mundo, é um bebé comparada com os desafios socioeconómicos que iremos ter pela nossa frente. A grande diferença é que a recuperação será muito rápida, para quem se aguentar.
Este é porventura o grande desafio das nossas vidas e a nossa obrigação para com as gerações que nos trouxeram a este mundo. Daqui por duas semanas teremos dezenas de milhares de infetados com COVID-19 em Portugal. As medidas agora tomadas demorarão semanas a ter efeito. O estado de emergência é a única forma de respondermos todos coordenadamente e com a disciplina que se impõe em estado de guerra. Todos, venceremos!