A invasão da Ucrânia pela Rússia transportou-nos para uma realidade de que a Europa andou arredada nas últimas décadas, mas que agora nos é restituída com todo o seu cortejo de horrores. Ao longo dos séculos, o estado de guerra entre as nações do Velho Continente foi quase uma constante, com as alianças a fazerem-se, a desfazerem-se, a alterarem-se e a recomporem-se num ritmo frenético, ao sabor dos interesses dinásticos, dos caprichos dos soberanos, das chamadas razões de Estado, das ideias dos ministros e eminências pardas, dos ditames das chancelarias… A guerra é a continuação da política por outros meios, dizia o estratego prussiano Carl von Clausewitz. Só que bastante mais mortíferos, acrescentamos nós.
Depois de anteriores edições sobre a I Guerra Mundial, Entre Guerras, II Guerra Mundial e Guerra Fria, dedicamos este número da VISÃO História aos confrontos armados na Europa desde a Guerra dos Cem Anos para cá, ou seja, desde que no século XIV começou a haver armas de fogo (os ainda rudimentares canhões) e os estados – mais ou menos como os conhecemos – se deixaram arrastar para a macabra pista de dança onde o bailado é o da morte. Esse longo conflito medieval entre a França e a Inglaterra, que por acaso até durou mais do que um século, continua a ser associado à destemida Joana d’Arc, a «Donzela» guerreira mais tarde acusada de bruxaria e queimada na fogueira.
Mesmo sem figuras como a da camponesa-mártir, as guerras em que a Rússia participou estão, naturalmente, em destaque nesta edição. Em meados do século XVIII, entrou pela primeira vez num conflito no ocidente europeu, aliando-se à Áustria e à França na Guerra dos Trinta Anos. Acabou por se retirar da contenda, sem glória, mas afirmou-se como uma potência bélica a ter em linha de conta. Pouco depois, no início do século XIX, os exércitos russos, com a preciosa ajuda do «General Inverno», tiveram um papel crucial na derrota das ambições imperialistas de Napoleão Bonaparte.
Hoje, a Crimeia está na ordem do dia, por causa da disputa entre a Rússia e a Ucrânia, mas esteve-o também entre 1854 e 1856, quando foi cenário de uma guerra entre as grandes potências europeias. O confronto militar, movido contra o Império Russo por uma coligação formada pelo Reino Unido, França e reino da Sardenha e apoiada pelo Império Austro-Húngaro, durou dois anos. Em termos práticos, o embate resumiu-se a um gigantesco e sangrento cerco montado durante onze meses ao porto militar de Sebastopol, que terminou com a derrota dos russos. A guerra da Crimeia foi também a primeira a ser fotografada, graças à iniciativa do inglês Robert Fenton, que se deslocou ao teatro de operações com o seu laboratório ambulante, improvisado num carro puxado por cavalos.
Na história da humanidade, nunca tinha havido uma guerra tão destruidora e que envolvesse tantos países como a I Guerra Mundial, no início do século XX. O seu balanço trágico não foi suficiente para evitar novas guerras, também de enormes dimensões e com um grau de mortandade elevado. Exemplo disso foram a Guerra Civil na Rússia, a Guerra Civil de Espanha e a Guerra Russo-Finlandesa. Nesta última, o invasor foi surpreendido por uma inesperada e bem organizada resistência durante três meses, que obrigou a Rússia a retirar-se do pequeno país vizinho sem honra nem glória.
Mas não podemos analisar o século XX sem recordar a II Guerra Mundial e a descida aos infernos que o expansionismo alemão provocou. O volte-face e a vitória dos Aliados permitiram à Europa respirar de alívio, mas não por muito tempo. A seguir, começou a Guerra Fria, que teve no Muro de Berlim o seu símbolo por excelência, até ser derrubado em 1989.
Ao contrário do que alguns disseram, a História não acabou nesse momento. Depois de décadas de paz e de prosperidade económica, a sangrenta guerra na ex-Jugoslávia veio acordar os velhos demónios na Europa, agora de novo despertados pela recente invasão da Ucrânia.
Nesta edição da revista, contamos, como sempre, com a colaboração de especialistas, como os historiadores Paulo Drumond Braga, António Ventura, Pedro Aires Oliveira e do major-general João Vieira Borges, além de 10 páginas com esclarecedores mapas que mostram bem como as fronteiras da Europa foram sendo desenhadas, e redesenhadas, ao longo dos últimos 700 anos.
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SUMÁRIO DESTA EDIÇÃO:
Mapas da Europa
Como mudaram as fronteiras desde as invasões napoleónicas até aos dias de hoje, sem esquecer os períodos antes da I Guerra, entre Guerras e após a II Guerra Mundial
Guerra dos Cem Anos (1337-1453) A primeira grande guerra europeia, que normalmente associamos à figura de Joana d’Arc, foi travada entre a França e a Inglaterra Por Luís Almeida Martins
Guerra dos Trinta Anos (1618-1648) Aquele que foi um dos conflitos mais destrutivos marcou o fim da preponderância dos Habsburgos de Viena e de Madrid e consagrou a França como nova potência Por Paulo Drumond Braga
Guerra da Sucessão de Espanha (1701-14) A Inglaterra confirmou o seu predomínio europeu e marítimo num combate em que tropas portuguesas entraram na dança das alianças e até ‘tomaram’ Madrid Por Paulo Drumond Braga
Guerra dos Sete Anos (1756-1763) A primeira contenda bélica com caráter mundial confirmou a hegemonia da Inglaterra e da Prússia e o refluxo da França, da Espanha e da Áustria Por Paulo Drumond Braga
Guerras Napoleónicas (1792-1815) Durante 23 anos, quase ininterruptamente, a sombra de Napoleão pairou por toda a Europa, e Portugal não foi exceção Por António Ventura
Guerra da Crimeia (1854-1856) A luta pela península da Crimeia está na ordem do dia, por causa da sua disputa entre a Rússia e a Ucrânia. Esteve-o também entre 1854 e 1856, quando foi palco de um embate entre as grandes potências europeias Por Luís Almeida Martins
Guerra da Unificação da Itália (1859) O novo Estado italiano foi dolorosamente arrancado a ferros nos campos de batalha da Lombardia Por Luís Almeida Martins
Guerra Franco-Alemã (1870-1871) Numa espécie de antecâmara dos grandes confrontos do século XX, uma França decadente vergou-se a uma Alemanha nova Por Luís Almeida Martins
Guerra Russo-Turca (1877-1878) Foi o culminar de um conflito que refletiu o declínio turco na Europa e a expansão russa para o mar Negro, Balcãs e sul do Cáucaso Por Pedro Caldeira Rodrigues
Guerras Balcânicas (1912-1913) Estendendo-se por cerca de 170 mil quilómetros quadrados, o campo de batalha opôs os jovens estados balcânicos ao Império Otomano, antes de dar lugar a uma disputa entre antigos aliados Por Pedro Caldeira Rodrigues
I Guerra Mundial (1914-1918) Começou com o assassinato do arquiduque Francisco Fernando, herdeiro do trono de Viena, mas a causa mais profunda foi a desintegração do Império Austro-Húngaro devido aos nacionalismos Por João Vieira Borges
Participação portuguesa O desejo de manter as colónias, afastar o «perigo» espanhol e consolidar a jovem República explicam a entrada de Portugal na guerra Por João Vieira Borges
Guerra Civil Russa (1917-1923) Duas Rússias confrontaram-se sob o radar das potências estrangeiras: a «vermelha», dos camponeses, e a «branca», dos oficiais Por Clara Teixeira
Guerra Civil de Espanha (1936-1939) Com a ascensão do fascismo a apelar ao espírito de resistência, o país vizinho de Portugal tornou-se um destino para milhares de voluntários internacionais Por Ricardo Silva
Guerra Russo-Finlandesa (1939-1940) A URSS invadiu a Finlândia, mas esta ofereceu uma resistência inesperada e apenas teve de ceder pequenas parcelas do território Por Ricardo Silva
II Guerra Mundial (1939-1942) Quando o furacão de fogo da Alemanha nazi varreu a Europa, uma «nova ordem» foi instaurada pelo III Reich. Mas essa foi apenas a primeira parte da descida aos infernos Por Ricardo Silva
O fim do III Reich (1942-1945) Quando mudou a maré da guerra, os Aliados avançaram impetuosamente até à vitória final, marcada pela rendição da Alemanha naziPor Ricardo Silva
Guerra Fria (1945-1991) Durante quatro décadas e meia, entre o fim da II Guerra Mundial e a falência da URSS, a Europa viveu na corda bamba do «equilíbrio do terror» Por Pedro Aires Oliveira
Guerras Jugoslavas (1991-2001) O complicado e violento mosaico jugoslavo alimentou a última guerra europeia, antes do confronto russo-ucraniano Por Pedro Caldeira Rodrigues
Guerra do Kosovo e da Macedónia (1998-2001) O conflito pôs fim ao processo de desintegração da Jugoslávia, que se prolongou por dez anos. Ao bombardear a Sérvia, a NATO fez pela primeira vez fogos reais por Pedro Caldeira Rodrigues
Convenções de Genebra Como os acordos internacionais foram sendo revistos para reduzir o sofrimento de combatentes e de populações civis
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