As empresas podem reduzir quase um terço das suas emissões sem custos. Mas uma em cada cinco continua a falhar os seus objetivos de sustentabilidade. Estas são as conclusões de dois estudos diferentes da Boston Consulting Group (BCG), que formam um prato agridoce.
“Há vários benefícios potenciais da descarbonização das operações”, explica Carlos Elavai, Managing Director e Partner da consultora em Portugal, na Conversa Verde desta semana. Por um lado, “as empresas têm de adquirir licenças de emissão de CO2, o que é um custo”; por outro, “existe um benefício de mercado e de financiamento, que hoje já é bastante material. O que nós concluímos é que 30% dessas emissões têm um impacto positivo ou neutro para as empresas.”
Isto não significa que o grau de dificuldade seja idêntico em todas as áreas. “Um dos setores mais difíceis de desarbonizar é o do aço. O aço verde pode custar até 50% mais. Mas se forem adotadas tecnologias de recuperação de calor, produção renovável in loco, junto à operação, então estamos a falar de um custo que pode ser entendido como um resultado líquido positivo.” O cimento é outro problema, continua, porque o processo em si emite muito carbono para a atmosfera. “Mas algumas técnicas têm sido adotadas na Europa, que gradualmente vêm a baixar a pegada ecológica do setor.”
Seja maior ou menor a dificuldade, reduzir emissões terá sempre vantagens, diz Carlos Elavai. “Há três grandes fontes de valor para quem se foca numa estratégia de sustentabilidade: a operação em si – uma operação descarbonizada é mais resiliente e moderna; o financiamento – há claras vantagens para quem consegue comunciar ao mercado que a sua atividade é mais sustentável para o ambiente. E o reconhecimento do mercado. As empresas que agora se prepararem serão as vencedoras do futuro.”
Uma pausa para fazer a guerra?
A União Europeia definiu como objetivo reduzir em 45% as suas emissões de gases com efeito de estufa nos próximos oito anos. Mas essas emissões continuam a aumentar. “A cada ano que passa, o objetivo está mais difícil”, lamenta Carlos Elavai. Daí a importância de criar regras para incentivar o mercado e evitar desequilíbrios de concorrência entre empresas menos e mais sustentáveis. “A primeira resposta é a regulação. As empresas não podem tomar decisões que lhes aumentam o custo se não tiverem entre elas um elemento agregador que defina o caminho, o standard de emissões, de tecnologia base. E os clientes têm de estar preparados para compensar parte dos custo mais elevado dos produtos. Até aqui, poluir foi a maneira mais barata de produzir. Agora temos de minimizar esses impactos, mesmo que isso se traduza num preço um pouco mais elevado.”
A dificuldade passa por convencer outras regiões do globo a percorrer o mesmo caminho. “A Europa tentou colocar a pressão do outro lado, para que outros criem os mesmos incentivos. Se não o fizerem, faremos nós, com a taxa de carbono. É claramente uma pressão na direção correta.”
Outro sinal positivo, acrescenta o consultor da BCG, é que muitas marcas já criaram o seu modelo de negócio com essa diferenciação positiva, o que pode servir para estimular outras a fazerem o mesmo. “A Tesla é um exemplo disso. Antes, a Toyota conseguiu construir em cima do Prius todo um legado de descarbonização do transporte rodoviário.”
Mais complicado é fazer o mesmo com bens de pequeno consumo. “Quando vamos para o nosso dia a dia, ainda falta informação para uma decisão consciente. Temos de fazer esse caminho, mas acho que em breve haverá novidades na etiquetagem. Parte da resposta estará aqui, parte está no reconhecimento por parte dos consumidores que a nossa maneira de fazer as coisas não nos levará a um planeta sustentável, que é o resultado que todos queremos. Ter os hábitos certos, reduzir o consumo e o desperdício, reutilizar…”
A boa notícia é que os jovens estão prontos para impulsionar essa mudança. “Há uma nova geração que traz essa consciência. É um processo lento, mas iremos ver gradualmente os benefícios. A regulação dará aqui um empurrão.” Outro ponto positivo é a atitude do setor financeiro. “É um dos que está mais na dianteira. A COP26 [Cimeira do Clima] veio ilustrar esse compromisso. Mais de 450 instituições financeiras compromteram-se com um algum grau de exigência para financiar certos setores. Por exemplo, foram dados sinais de que não seria financiada a produção de energia assente em carvão. Isto é algo que está de facto em curso. Mas o setor precisa da mesma taxonomia, que respondas às perguntas ‘O que é um projeto verde’ e ‘Por que critérios nos devemos reger?”
A guerra, no entanto, veio desviar as atenções do clima e da sustentabilidade, tal como a pandemia já havia feito, o que pode atrasar as mudanças necessárias. Mas não por muito tempo, acredita Carlos Elavai. “Vemos que o nosso mundo continua a atirar-nos para desafios constantes, e estes objetivos tendem a ficar esquecidos no meio das emergências do momento. No curto prazo temos uma pausa no combate às emissões, mas a médio e longo prazo a transição energética vai acelerar.”
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