A poluição por microplásticos já contaminou todo o planeta, desde a neve no Ártico a montanhas, rios e oceanos, e os microplásticos estão a ser consumidos e inalados pelos seres humanos, desconhecendo-se ainda a verdadeira dimensão do impacto na saúde.
Os microplásticos são partículas de tamanho inferior a cinco milímetros que resultam não só da degradação do plástico como são produzidos já naquele tamanho para fins comerciais (como os cosméticos). São tidas como especialmente preocupantes as partículas do mesmo tamanho dos alimentos consumidos pelo zooplâncton (plâncton animal, que inclui organismos microscópicos e larvas de peixes e crustáceos), que sustenta a cadeia alimentar marinha e tem um papel importante na regulação do clima global.
Para o estudo agora publicado, na Environment International, equipas de dois hospitais italianos debruçaram-se sobre seis placentas humanas, analisadas com recurso à espectroscopia Raman, uma técnica de alta resolução que pode proporcionar, em poucos segundos, informação química e estrutural de praticamente qualquer material orgânico ou inorgânico. Ao todo, foram encontrados 12 fragmentos de microplásticos em quatro das placentas analisadas (5 no lado fetal, 4 do lado materno e 3 nas membranas corioamnióticas):
– Todos as partículas encontradas tinham pigmentação;
– 3 foram identificadas como sendo polipropileno;
– Nas outras 9 só foram identificáveis os pigmentos, todos usados em revestimentos, tintas, adesivos, polímeros, cosméticos e produtos de higiene pessoal.
Sendo a placenta o órgão que garante e regula a chegada de nutrientes e oxigénio ao feto, atuando como um “interface complexo através de diferentes mecanismos”, como destacam os investigadores, a presença de microplásticos – que contêm substâncias que podem agir como disruptores endrócrinos – pode traduzir-se numa série de consequências para o desenvolvimento fetal.
“Com a presença do plástico no corpo, o sistema imunitário fica perturbado e reconhece como ‘seu’ até o que não é orgânico. É como ter um bebé ciborgue: já não é só constituído por células humanas, mas por uma mistura de entidades biológicas e inorgânicas”, explica Antonio Ragusa, autor do estudo e diretor da Unidade de Obstetrícia e Ginecologia do hospital de Fatebenefratelli. “As mães ficaram chocadas”, acrescenta.
Como é que os microplásticos chegaram à corrente sanguínea? Via sistema respiratório ou gastrointestinal? A estas perguntas, a investigação não deu, “infelizmente”, sublinha Ragusa, respostas.
As mães que aceitaram doar as placentas para este estudo eram saudáveis, sem qualquer doença prévia nem uso de álcool ou tabaco, e tinham tido um parto normal depois de uma gravidez de termo. Para assegurar a impossibilidade de qualquer contaminação externa, foi adotado um protocolo sem plástico ao longo de toda a experiência: os obstetras e parteiras usaram luvas de algodão durante o parto e para cobrir as marquesas também só foram usadas toalhas de algodão.