Associamos habitualmente a palavra “ratazana” a ambientes urbanos com caixotes do lixo, esgotos e outras zonas mal-cheirosas. Porquê? Porque este roedor infame, cujo nome comum é ratazana-castanha e o nome científico é Rattus norvegicus, tem de fato uma predileção por este tipo de locais onde seria pouco sensato fazermos um piquenique.
Pelo menos, é isso que advogam vários investigadores que as estudaram em áreas urbanas, que conseguem prever a expansão da ratazana consoante a presença de lixo exposto, a degradação de condições ambientais e a existência de boas áreas de abrigo. No entanto, em cidades limpas como Salzeburgo (Áustria) com um bom sistema de recolha de lixo e esgotos, as ratazanas são mais comuns em áreas com água, vegetação, solo natural e restos de comida, que raramente se encontram no centro desta cidade. Assim, em zonas urbanas com grandes preocupações de higiene, as ratazanas exprimem o seu descontentamento deixando de as frequentar, e os moradores que gostem de vida selvagem não têm outro remédio senão ver documentários na televisão.
As ratazanas-castanhas são, também, responsáveis por danos em culturas agrícolas, alimentos armazenados e edifícios. Por exemplo, esta espécie pode roer fios elétricos, causando assim curto-circuitos e outros eventos inesperados que certamente ajudam a quebrar a monotonia do dia-a-dia. Existem, ainda, uma panóplia de doenças que podem ser proporcionadas pelas ratazanas-castanhas. Por exemplo, as suas pulgas podem transportar uma bactéria designada por Yersinia pestis, que é responsável pela peste bubónica (também conhecida como peste negra). No entanto, e antes de começar a apontar-lhes o dedo, saiba que foram outros roedores e não elas que causaram a pandemia de peste negra que matou milhões de pessoas na Europa durante o século XIV. O seu alibi: a ratazana-castanha é originária da China, e só chegou à Europa no início do século XVIII. Atualmente, e graças à nossa ajuda, esta espécie tem uma distribuição mundial, excepto em desertos e regiões polares. Quer isto dizer que temos companhia garantida destas nossas amigas em quase todos os sítios para onde possamos viajar…
Mas então e quando não estão em zonas urbanas, como é a vida destas ratazanas-castanhas? Em primeiro lugar, é bom dizer que preferem ocupar áreas próximas da água, ao longo de ribeiros ou rios em zonas florestais, em áreas costeiras ou junto a canais de irrigação. São, aliás, muito boas nadadoras, razão pela qual também são conhecidas como ratazanas-de-água. Habitualmente, vivem em túneis debaixo da terra com várias saídas para o exterior, nos quais se podem reproduzir e armazenar alimentos. Têm uma alimentação generalista, que inclui grãos, sementes, fruta e outra matéria vegetal, mas também caracóis, lesmas, insetos e outros invertebrados, ovos de aves, aves, peixes e pequenos mamíferos como ratos e pequenos coelhos.
Para além de poderem dispersar sementes, os túneis que fazem debaixo da terra promovem a passagem de ar e água no solo, representando ainda uma presa importante para muitas espécies de predadores. Existem, também, ratazanas-castanhas domesticadas que são usadas em laboratório na realização de experiências em áreas como a medicina ou a psicologia. Estes animais são, ainda, usados como animais domésticos. Mesmo em Portugal, há quem tenha estas ratazanas em casa, descrevendo-as como limpas, inteligentes e sociáveis. E fica já a saber que se celebra a 4 de Abril o Dia Internacional da Ratazana Doméstica, caso esteja a pensar em adquirir uma destas ratazanas lá para casa. De certeza que os gatos da sua vizinhança iriam achar piada a essa ideia…
Referências bibliográficas:
- Himsworth, C.G. et al., 2014. The Characteristics of Wild Rat (Rattus spp.) Populations from an Inner-City Neighborhood with a Focus on Factors Critical to the Understanding of Rat-Associated Zoonoses. PLoS ONE 9 (3): e91654.
- Kitaoka, A., 1994. Defensive aspects of burrowing behavior in rats (Rattus norvegicus): A descriptive and correlational study. Behavioural Processes 31: 13-28.
- Ruedas, L. 2008. Rattus norvegicus. The IUCN Red List of Threatened Species. Version 2014.2. www.iucnredlist.org. Download a 04/08/2014.
- Traweger D et al., 2006. Habitat preferences and distribution of the brown rat (Rattus norvegicus berk.) in the city of Salzburg (Austria): Implications for an urban rat management. Journal of Pest Science 79: 113-125.
- Villafane, I.E. et al., 2013. Differences in population parameters of Rattus norvegicus in urban and rural habitats of central Argentina. Mammalia 77: 187-193.