Quando em 2008 a Estrutura de Missão para os assuntos do Mar lançou o repto às escolas do 2º e 3º ciclo para o desenvolvimento do tema “Mar” na área de projeto tinha já uma visão estratégica de futuro bem definida na sensibilização para as atividades escolares sobre esta temática. É caso para afirmar que de pequenino se deve torcer o pepino…do mar!
O Kit do Mar, agora gerido por Diogo Geraldes e Bernardo Mata da EMEPC (Estrutura de Missão para a Extensão da Plataforma Continental), tem como principais objetivos sensibilizar crianças e jovens para o conhecimento do mar e a promoção de uma maior literacia dos oceanos nas camadas mais jovens da sociedade portuguesa. Este projeto fundamental na educação contribui de forma inquestionável para a promoção de cidadãos mais informados, mais responsáveis e mais participativos, conscientes da importância dos oceanos num contexto global e nacional.
Estabelecendo uma ponte perfeita entre a escola e a ciência azul, este aliciante projeto abranje todo o território nacional, envolve 7500 alunos em cerca de 135 municípios, tem no entanto a meta de chegar a todas as escolas, sobretudo as do interior do País. Cruza todas as áreas escolares e leva-nos a pensar que o Mar invade as salas de aula em cada uma das disciplinas. Contos e poemas são citados num autêntico mar de palavras em Português, enquanto que em História se recriam os conhecimentos sobre os descobrimentos marítimos portugueses. Nas demais disciplinas o conhecimento sobre o mar está presente, os alunos do secundário podem participar criando e defendendo um projeto que pontua e premeia os que adquiram uma maior “aquacidade”.
A bordo do Navio de Treino de Mar Creoula, convertido em navio oceanográfico no âmbito do projeto MarBis, encontram-se os vencedores do projeto Kit do Mar 2013. Três alunos da escola secundária da Baixa da Banheira estão acompanhados pela professora Dina Dias, que dinamizou e coordenou o projeto vencedor.
“Esta escola é infelizmente conhecida pelos piores motivos, encontramo-nos numa área de risco, junto a bairros problemáticos da margem sul, sempre foi meu desejo incutir aos meus alunos o espírito competitivo no plano do conhecimento. Lancei o desafio e conseguimos montar um aquário dentro do bloco de ciências. Criámos uma “task force” e uma estratégia de educação não formal, usámos uma metodologia de ensino que foge à esfera tradicional e assim cativámos os alunos que de forma espontânea se voluntariaram para cuidar e fazer crescer o aquário que reproduz a biodiversidade das poças de maré e da zona intertidal. Hoje já ninguém fica indiferente à sua presença, e são os próprios alunos que recolhem as amostras para compor esta montra de vida marinha. Ao todo na nossa escola este projeto envolve 600 pessoas sendo que 30 alunos são quem demonstra e explica aos demais as espécies presentes.” Explica a professora, orgulhosa por estar a bordo.
Ao aproximar-me das duas alunas da escola da Baixa da Banheira ocorreu-me a imagem de uma anémona. Elemento frágil e melancólico, que vagueia ao sabor das vagas e correntes. Não resisti e batizei as duas jovens como sendo as anémonas do habitat Creoula.
Segundo Sara Grenho de 19 anos “estar a bordo é um autêntico sonho. Poder participar nesta campanha, observar e aprender com os biólogos sobre as características e comportamentos das espécies marinhas é o máximo. Tenho uma sede enorme de conhecimento sobre o mar e este é um justo prémio também para a escola que está cotada como uma das dez piores do país.”
Susana Rocha tem apenas 19 anos mas encara este desafio com enorme entusiasmo. “No aquário da escola, ensinámos o polvo a abrir frascos para procurar comida. Adorei participar nas saídas de campo para recolher as espécies que aqui habitam. Pensava eu que gostava muito de biologia marinha, agora que aqui estou, comprovo que há pessoas que gostam ainda mais que eu, incrível!” Apesar dos enjôos frequentes Susana junta-se à equipa que chega de mais um mergulho e absorve toda a informação que os biólogos partilham sobre uma anémona morango.
Já Rudi Lopes apesar dos seus frescos 18 anos mostra uma grande maturidade e interesse pelos assuntos do mar. ” Comecei a mergulhar aos 13 anos com o meu pai. Quando a campanha terminar quero voltar ao Algarve e mergulhar nos vários locais de amostragem, agora irei fazê-lo com outros olhos. Estou surpreendido pela quantidade e diversidade enorme de espécies que povoam o habitat marinho da costa algarvia. Adoro este ambiente a bordo do Creoula, o espírito de equipa, a partilha de conhecimento, vejo que todos gostam bastante do que fazem. Somos apenas representantes de todos quantos estão envolvidos com o projeto do aquário da escola, mal chegue iremos partilhar com todos esta enriquecedora experiência.”
O mar nunca se torna pequeno para tanta sede de conhecimento. Alunos determinados em aprender mais, professores empenhados em ensinar e sensibilizar as turmas para toda a infinitude que a biologia marinha oferece leva-me regressar à escola que frequentei na adolescência. A escola Nuno Gonçalves tem na sua entrada uma réplica do painel pintado em 1445 por este artista plástico, considerada como uma obra de referência da pintura portuguesa do século XV e que retrata a corte portuguesa, onde se destaca a figura do Infante santo. No meu tempo não existiam projetos nem Kits sobre o mar mas enquanto escrevo esta crónica a bordo do Creoula, sonho com a imagem romântica de que sempre que entrava na escola já o infante e o mar me acolhiam e velavam por mim.