Discute-se neste momento o tecto de 2ºC de aumento de temperatura e um pico nas emissões no máximo em 2020. Mas muitos dizem que mesmo esses limites já são demais…
O problema é que estamos longe de chegar sequer a esses objectivos. Se as negociações parassem neste momento, praticamente não teríamos redução de emissões e tudo se encaminhava para um aumento de 3,5ºC até ao final do século.
Muitos países mais vulneráveis aos efeitos do aquecimento global alegam que mais de 1,5ºC será catastrófico. Ao apontarmos para 2ºC, não estamos já a admitir sacrifícios consideráveis?
As Organizações Não-Governamentais [ONG] também acham que 2ºC têm associada uma grande incerteza. É por isso que, quanto ao intervalo sugerido pelo IPCC [Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas], entre 25% e 40% de redução de emissões globais, nós defendemos os 40 por cento.
Como estão a decorrer os primeiros dias de negociações nesta conferência do clima?
Nota-se, em comparação com conferências anteriores, uma grande hostilidade e atrito entre todos. Países desenvolvidos uns com os outros e com os menos desenvolvidos, pobres com pobres, e até a União Europeia entre si, com alguns países a não quererem assumir a grau de ambição que seria desejável.
Os EUA apresentaram uma proposta de reduzir as suas emissões em 17% em relação a 2005, o que na prática é apenas um pouco abaixo do ano-base de Quioto, 1990. Mas o sistema político americano não deixa grande margem de manobra para negociações, uma vez que qualquer alteração a este valor terá de ir a votação interna [Congresso e Senado]. O que se espera de Obama, afinal?
Obama, ao ter levado a proposta a votação no seu país antes de a trazer a Copenhaga, está a fazer o caminho certo, ao contrário de Al Gore [que negociou Quioto para mais tarde chegar aos EUA e ver a proposta assinada por si chumbada no Senado]. Além disso, através das conversas que mantemos com as ONG americanas, percebemos que Obama tem alguma margem de manobra para melhorar a proposta. É curioso e significativo, aliás, ele ter mudado os planos e decidir aparecer em Copenhaga no dia 18, em vez de no dia 9, como era previsto. Ao vir ao último dia de negociações está a comprometer-se. É um sinal de coragem.
Isso deixa-o optimista, apesar deste início muito duro das negociações?
Dá-me algum optimismo, sim. Um presidente americano não se pode dar ao luxo de alinhar em falhanços. Não o estou a ver a vir cá naquela altura e sair sem um acordo. Também acho que ele agora está a debruçar-se mais sobre isto porque o plano de saúde americano, que era a sua prioridade, está bem encaminhado.
Que avaliação faz das decisões tomadas hoje pela UE, nomeadamente quanto às ajudas financeiras para os países mais pobres [7,2 mil milhões de euros entre 2010 e 2012]?
O que tem de estar em cima da mesa é o financiamento até 2020, não o dos próximos três anos. Não discutimos o dinheiro, mas sim o facto de ser uma ajuda de curto prazo e não um apoio sério e sustentado. Por outro lado, a UE não quis ainda usar o seu trunfo de passar de uma redução de 20% nas emissões em relação a 1990 para 30% [a UE decidira, há dois anos, que desceria unilateralmente as suas emissões para 20% em 2020 e 30% se houvesse um acordo global de descida de emissões]. Mas devia tê-lo feito. Até porque, com a crise económica, os custos de baixar hoje 30% são quase iguais aos custos de baixar 20% há dois anos, quando se fez os cálculos.
Qual a sua opinião sobre a ideia de George Soros, de usar o Fundo Monetário Internacional [FMI] para financiar a adaptação e a mitigação do aquecimento global?
A ideia não vai ser seriamente encarada pelos políticos. E é um instrumento complicado. O que se pretende é criar um mecanismo estável e directo de financiamento. Meter o FMI ao barulho é usar um mecanismo lateral.