Nada diz “a energia solar está na moda” como a IKEA ter painéis fotovoltaicos no seu catálogo, com um nome (Solstråle) que podia perfeitamente ser de uma cómoda. A gigante sueca entrou em abril (em parceria com uma empresa espanhola da energia) num mercado que se começa a massificar. A evolução tecnológica fez reduzir o preço dos equipamentos nos últimos anos, tornando-os uma opção eco a dobrar: ecológica e económica.
“Bem dimensionado, um sistema fotovoltaico é uma boa opção financeira, tanto para o setor residencial como para o industrial”, diz Francisco Ramos Pinto, gestor de projetos de energia solar e eficiência energética da empresa Resul. O retorno do investimento é mais rápido no caso da indústria, não só porque o preço da instalação é comparativamente mais baixo, mas também porque as fábricas consomem eletricidade precisamente durante o dia, nas horas de maior produção. “Um sistema industrial que não tenha mais de 20% ou 25% de excedente tem um retorno ao fim de cerca de quatro anos. No residencial, são cinco ou seis anos.”
A questão do excedente é fundamental: o preço da energia não consumida e, portanto, vendida à rede é muitíssimo mais baixo do que aquele que o consumidor paga enquanto comprador. E é esse facto que determina o tamanho dos painéis, na hora de escolher o melhor sistema. Uma família que passe o dia fora de casa deverá optar por dois painéis, que serão suficientes para os consumos-fantasma (stand-by e eletrodomésticos com painéis eletrónicos) e para o frigorífico. Numa casa que esteja ocupada durante o dia, já pode compensar comprar mais painéis, que até ficam proporcionalmente mais baratos: dois equipamentos com um total de 660 watts custam cerca de mil euros; seis painéis, €1 800 a 2 mil euros. Esta pode ser a alternativa certa para quem se mantiver em teletrabalho, depois da pandemia. No momento da escolha, há ainda que levar em conta fatores como a orientação do telhado (sul é melhor do que nascente/poente) e a região do País (há menos horas de sol no Norte).
Desde outubro de 2019, a instalação de painéis em prédios requer apenas autorização por maioria simples em assembleia de condóminos
O autoconsumo tem por acréscimo a vantagem de mostrar (através de uma app no telemóvel, por exemplo) quanto se está a produzir e a consumir, o que incentiva a reduzir consumos e adaptar hábitos. “Se uma pessoa tiver mais do que dois painéis, talvez já faça sentido uma bomba de calor em vez da caldeira a gás, ou uma placa elétrica em vez da tradicional, e pode programar a máquina da roupa para trabalhar durante o dia”, sugere Francisco Ramos Pinto. “É assim que passa a fazer parte da transição energética, substituindo o gás pela eletricidade de fonte renovável. E se calhar, daqui a uns anos, tem 20 painéis.”
O autoconsumo está também a ser encarado por muitos como um investimento puro: a poupança na fatura da luz é garantidamente superior aos juros que mil euros rendem no banco. Para quem precisa de empréstimo para adquirir estes sistemas, o melhor, segundo a Deco Proteste, é recorrer ao crédito pessoal específico para energias renováveis.
As queixas dos consumidores
O custo da instalação é parte substancial do preço final dos equipamentos, pelo que o mercado de usados não tem grande expressão – fica caro desinstalar os painéis. Mas essa não é uma questão importante, face à sua longevidade. “Os equipamentos têm uma vida útil de 20 a 25 anos, com pouca degradação. Ao fim de 20 anos ainda produzem 80% a 85% da capacidade inicial”, garante Ricardo Leite, da Energia Independente, empresa do grupo GALP que implementou este ano um sistema online baseado no Google Maps, em que as pessoas encontram a sua rua, identificam o telhado da sua casa e dizem quanto pagam de luz, e imediatamente ficam a saber quanto poupariam com um sistema fotovoltaico (para uma moradia média com muita luz e €100 mensais de fatura, a poupança anual é de €330).
A popularidade dos painéis deve muito ao salto que deram em termos de eficiência. “Hoje, um painel médio para a indústria tem uma potência de 530 watts. Há dez anos, um topo de gama tinha 195”, lembra Ricardo Leite. “E houve uma grande redução do preço dos painéis e dos inversores. Antes, havia tarifas bonificadas, mas os preços desceram o suficiente para deixarem de ser necessárias.”
O mercado continua sobretudo virado para as moradias, mas, há um ano e meio, o Governo aprovou um decreto-lei para facilitar e regular a instalação em condomínios que requer apenas autorização por maioria simples em assembleia de condóminos, pelo que também aqui começa a haver mudanças. O setor está também à beira de outra revolução: as baterias, que estão a ficar mais baratas (apesar de o break-even ainda se aproximar dos dez anos) e permitem acumular energia durante o dia para usar à noite. “Há cada vez mais instalações de sistemas com baterias no residencial”, diz Francisco Ramos Pinto. Uma tendência que o especialista atribui ao decréscimo do custo e à vontade de os consumidores serem independentes da rede, mas também à cobiça. “Se o vizinho tem…”
O autoconsumo está em ebulição, mas isso não quer dizer que toda a gente esteja contente. À VISÃO, a Deco Proteste aponta casos em que a produção não satisfaz as expectativas, queixas quanto ao preço pago pela eletricidade excedente injetada na rede e reclamações sobre o processo burocrático para o registo e colocação em funcionamento dos sistemas. Dores de crescimento de uma tecnologia que está a evoluir demasiado depressa.