Dizem que a alma pesa 21 gramas, coisa pouca na balança. Mas ouvem-se estes homens e estas mulheres que do mundo esperam ajuda, e não se acredita. As almas dos sobreviventes da manhã de 26 de Dezembro devem pesar toneladas – tem de ser –, tamanha é a dor e a angústia a rebentar-lhes o peito. A de Hanifa, um pescador de 58 anos tão maltratados que parece um velho de 80, encontrou terreno fértil no seu corpo alto e magro. De um dia para o outro – vai contando em voz baixa – deixou de ver de um olho e sente grandes dores de estômago. Estende as mãos cobertas de eczemas e garante, abanando a cabeça: «É alergia à água do mar.»
Nos últimos dias, Hanifa ajudou a enterrar uma irmã, um cunhado e a maioria dos vizinhos que como ele habitavam pequenas casas de madeira em Kinniya, na baía de Koddiyar, na costa este do Sri Lanka, em território controlado pelos rebeldes separatistas Tigres de Libertação do Eelam Tamil (LTTE). Não consegue explicar como escapou à inesperada fúria do mar que ele pensava conhecer bem; só se lembra de ter corrido muito, entre gritos de aflição. Ainda não sabe do paradeiro de um dos netos, de 10 anos. Mas insiste que o menino está apenas «desaparecido», desde o momento em que as ondas ali mataram mais de mil pessoas (10% da população), espalhando o terror e destruindo grande parte desta quase ilha do distrito de Trincomalee, a 250 quilómetros de Colombo, a capital.