Chongqing, edificada na confluência do rio Yangtzé e do rio Jialing, em íngremes colinas que se debruçam sobre os dois rios é uma cidade enorme cujo distrito (o mais populoso da China) tem “só”(!) 32 milhões de habitantes, a área metropolitana 14 milhões e destes, cerca de 3 milhões vivem no centro da cidade que é formado pela península entre os dois rios. À chegada, chovia imenso e tínhamos à nossa espera o novo guia de nome ocidental (para os turistas) Jean, um jovem encantador de 23 anos, muito atencioso, a quem fiquei a dever a visita à Base de Pesquisa e Criação de Pandas Gigantes de Chengdu, que não fazia parte do itinerário. Apenas de passagem, com paragem obrigatória (!) por um dos grandes armazéns e visita à imensa praça principal onde fica o Palácio dos Congressos, (cujas fotos estão incluídas na crónica anterior) que também visitámos. Construído em 1954, em estilo Ming e Qing, é o mais famoso edifício de Chongqing. Até encontrámos uma foto do Dr. Mário Soares, que também por cá passou! E seguimos logo de carro para Dazu, parando para almoçar pelo caminho e para a visita a um dos mais espantosos locais de peregrinação de influência Budista, Taoista e Confuciana. A Colina do Tesouro, ou Baoding Shan, a que a natureza acrescentou à beleza do local arqueológico, os seus cambiantes de verdes, os arrozais em terraços e os bosques de bambus. Fica a 15km de Dazu e é um lugar tão remoto que não vimos um ocidental! A descoberta das gravações e estátuas nos penhascos deve-se a Zhao Zhifeng, um monge de uma obscura seita de Yoga de Budismo Tântrico. Aqui, ao contrário de outras grutas que obedeceram a um plano preconcebido, foram aproveitadas as características naturais do local, até mesmo uma nascente subterrânea, para se integrar no sítio onde foi esculpido o Buda Reclinado. Numa secção da colina, por baixo de um mosteiro, fica um penhasco em forma de ferradura, esculpido com figuras coloridas, algumas com 8 metros de altura! Surpreende-nos pela diversidade das suas esculturas e gravações, algumas com um metro de altura, outras com apenas alguns centímetros, algumas em pedra natural, outras com pinturas ainda muito bem conservadas. Mas todas de uma extraordinária delicadeza! Pensa-se que as esculturas levaram 70 anos a fazer, entre AD 1179 e 1249. No largo central, numa reentrância da colina está o Buda Reclinado, representando o estado em que atinge o Nirvana, rodeado de discípulos e monges. A extremidade do corpo prol onga-se por uma gruta dentro da colina. É um lugar de grande fé, visitado por crentes que vêm de todas as partes da China. Este extraordinário local é Património da Humanidade. Nunca tinha visto nada igual! Daqui seguimos para Anyue, para visitarmos Wotoyuan, também património da Humanidade, em Bamiao.. O caminho para Anyue faz-se através de bosques verdes, arrozais alagados e enormes centros de criação de patos e gansos (como é que havemos de lhes chamar? Gansários?) que se passeiam por regiões alagadas e com enormes lagos. Foi bom ver que pelo menos vivem numa quase liberdade, com imenso espaço para nadarem, aos milhares! E todo o caminho foi feito no meio de uma bruma chuvosa, que não roubou nada à beleza da paisagem. E se Bàoding Shán não é certamente um lugar muito visitado por turistas ocidentais, apesar de Património da Humanidade (pelo menos na altura), então o Baixo-Relevo de Wotoyuan, em Bamiao, a 39Km de Anyue, não o é de todo! Aliás, no hotel onde ficámos em Anyue, que era enorme e confortável, sem grandes luxos, quando fomos tomar o pequeno-almoço, deparámos com enormes mesas onde era servido um buffet que incluía de tudo: desde sopa, passando por peixe fumado, saladas , caril, vários tipos de arroz e legumes, carnes, etc.! Só que para chineses e orientais! Porque um simples pãozinho,(já nem falo de croissants!), manteiga, ou leite e café, eram absolutamente inexistentes! Era impensável banquetearmo-nos com uma “pratada” de comida chinesa às sete da manhã! Então o Jean lá conseguiu desencantar leite em pó e café instantâneo e tivemos que nos contentar com umas bolachas como acompanhamento! O percurso, longe dos grandes centros, faz-se através de uma China rural e simples, lindíssima, por entre campos cultivados, arrozais alagados e búfalos. E de populações que não sofreram ainda influências externas. E chegamos a um lugar perdido no tempo chamado Bamiao, à beira de um rio Aqui encontrámos uma escola, com crianças muito pobres, mas com enormes sorrisos, que nos olhavam deslumbradas como se tivéssemos vindo de outro planeta! A minha amiga distribuiu “smarts” e gomas, enquanto eu tirava fotos em que todos queriam ficar, incluindo a professora, que tudo fazia para que lhe tirasse também o retrato! Eu só queria as crianças e vi-me “grega” para conseguir não a apanhar a dizer adeus e a rir-se imenso! E foi numa barcaça que seguimos rio acima, único caminho que nos leva a Wotoyuan e ao Buda Adormecido “Nirvana de Sakyamuni”. Que se salvou da destruição maciça efectuada pelo exercito vermelho, por se encontrar num local tão remoto e inacessível! Avistando aldeias de casas de madeira com telhados pretos, com os seus terrenos cultivados e casas flutuantes no meio do rio, rodeadas de redes de piscicultura. Tudo muito bucólico e tranquilo! E depois do rio e de uma caminhada entre arrozais e por detrás de bosques de bambus, que formam arcos ogivais como numa catedral gótica, avistamos ao longe o Buda Adormecido! Esculpido numa espécie de gruta nos melhores dias da Dinastia Tang, e apesar de mais pequeno que o Buda reclinada de Bàoding Shán, é imenso! E impressiona mais por se encontrar completo. Tem 23 metros de comprimento e está deitado sobre o lado esquerdo, tendo por cima várias figuras de discípulos. É considerado o melhor entre as esculturas da mesma dinastia. Sentado em frente encontra-se um monge guardião e por baixo tem também esculpidas diversas figuras mais pequenas de monges. É uma maravilha!!!
E voltámos com o nosso barqueiro, num passeio pelo rio, de volta a Bamiao e a Anyue para mais um jantar chinês, esse sim delicioso, e uma noite, antes de prosseguir com a nossa viagem até Chengdu. De que vos falarei na minha próxima crónica.