As quatro cores (três dominantes e uma – a cinzenta – esporádica) que ilustram este vídeo, que merece ser visto em alta definição, representam a história das viagens navais ao longo de um século, no período áureo da navegação marítima pós-Descobrimentos. Nele, é possível ver para quando iam e para onde iam os europeus.
O responsável por este estudo das viagens marítimas durante cem anos, entre 1750 e 1850, é Ben Schmidt, historiador da universidade de Princeton, através da reunião de dados recolhidos dos registos históricos e de diários de viagens das embarcações, cujas viagens tornam o Oceano Atlântico uma mescla colorida dado ser este o principal ponto de passagem destas nações.
É possível ver na legenda que o vídeo reproduz maioritariamente os trajetos intercontinentais da história naval de Espanha, Holanda e Reino Unido, as potências marítimas de então. Quanto à ausência de Portugal do mapa (provavelmente incluído a cinzento, nos “Outros”), e apesar de Schimdt não fazer referência aos lusos, esta pode ser explicada com a menor atividade marítima neste período já que os nossos antepassados tiveram de lidar com o terramoto em 1755 e consequente reconstrução da capital, assim como travaram batalhas, no início do século XIX, contra os generais de Napoleão que provocou a ida da família real para o Brasil e resultante instabilidade política.
Pelo sim pelo não, podemos sempre atribuir uma quota parte do declínio da frota naval portuguesa durante estes anos aos espanhóis e à influência que a dinastia filipina teve sobre nós até finais do sec. XVII.
A História mundial através do mar
É curioso ver neste trabalho os fluxos repentinos de cada nação para determinada região e quais as zonas mais visitadas por cada estado europeu: os britânicos em constante movimento para a Índia e América do Norte e os espanhóis para a América do Sul, apesar do movimento espanhol (a verde no vídeo) só começar a partir de 1765. Em relação à Holanda, sem ter um destino que concentre a maioria das suas viagens ao longo do tempo, nota-se um maior número de rotas em direção à África até 1800 e para a Ásia após um “ressurgimento” em 1815, a par dos ingleses.
Podemos também jogar com as datas de maior relevo desta altura, como a Guerra da Independência dos EUA, entre 1775 e 1783, onde começa por haver uma maior migração da América para a Europa e os espanhóis a reforçarem a sua presença na América do Sul para evitar casos semelhantes nas suas colónias.
Em 1796 vemos uma explosão de “laranja” (navios holandeses) em direção à África do Sul, após um período em que era um destino apenas frequentado pelos ingleses. A mancha laranja foi um contingente naval holandês para a Cidade do Cabo e que resultou na batalha da Baía de Saldanha (que recebe o nome de um navegador português, o primeiro europeu a chegar a esse local).
O início do século XIX começa com o domínio naval britânico, muito graças a Napoleão Bonaparte, que tentava conquistar a Europa, conseguindo em 1806 anexar a Holanda ao seu império após um período de dez anos de guerra que arrasou a frota militar holandesa, incluíndo o batalhão naval. A Inglaterra, como nação pioneira da Revolução Industrial, beneficiou dos conflitos existentes na Europa continental e reforçou a sua posição marítima, principalmente na Ásia.
Em relação aos nossos vizinhos espanhóis, estes tiveram de enfrentar, na primeira metade do século XIX, as batalhas na Península Ibérica: primeiro contra os portugueses e os ingleses, ao lado de Bonaparte durante as invasões francesas, e depois, mudando de lado nas trincheiras, contra o exército francês acabando por sair vencedor. No entanto, logo a seguir teve de lidar com a revolta da “Nova Espanha” as colónias sul-americanas, daí novo aumento do fluxo para a América do Sul.
Informação em falta
Como este trabalho se limita a reproduzir as movimentações entre continentes e está limitado aos documentos e registos deste período, alguns bastante deficientes e em outros casos mesmo inexistentes, há algumas informações que faltam e outras algo “estranhas”.
Uma das principais é a ausência de movimento no mediterrâneo – um ponto importante desde sempre para a troca de produtos entre a Europa e o norte de África -, mas a principal é a ausência das rotas de escravos de África para a América, algo que talvez seja explicado pela falta de registos.
O facto de vários navios se ficarem pelas ilhas de Timor e Indonésia em vez de prosseguirem até à China e mesmo Japão também é capaz de pôr algumas questões aos especialistas da matéria, já que eram estes os principais destinos após saíram da Índia. Outro dado “estranho” neste vídeo é a pouca atividade no Oceano Pacífico apesar de na altura este servir maioritariamente para as trocas comerciais entre os Estados Unidos e a Ásia.
As linhas coloridas que desaparecem a meio do oceano, onde não se vislumbra nenhuma ilha, não é explicado mas supõe-se que sejam naufrágios das embarcações.
Apesar destes detalhes, o vídeo é um trabalho muito bom que mostra as movimentações europeias pelo mundo durante a Revolução Industrial e que merece ser visto e analisado com atenção. Par aquem não tiver paciência para os 12 minutos, fica uma versão resumida onde as viagens estão concentradas por mês e não por ano.